* Professora do Colégio Marista Paranaense.
Reta final. O ano de preparação para a entrada numa universidade é estressante. Aulas, exercícios infindáveis, horas de estudo diárias, simulados e, ainda, uma lista de livros para ler.
Uma boa parte dos candidatos a uma vaga, não importa de que curso, opta por ler um ou outro livro sugerido pelas universidades e se propõe a assistir às aulas sobre os livros, ler as análises e resumos e fazer os exercícios, mas quem está decidido e não quer correr riscos, lê todos.
Bem, o ritmo é louco, o esgotamento é visível, o tempo parece insuficiente, ora se quer mais tempo para fazer tudo o que é necessário, ora não se vê a hora das "famigeradas" provas chegarem. Vamos ao que interessa. Aqui vou deter-me a essa prática bastante evitada por muitos candidatos: a leitura das obras indicadas pelas universidades. A UFPR, por exemplo, sugere para leitura, dez obras literárias de autores brasileiros cujos estilos, gêneros e épocas são bastante singulares e merecem uma atenção especial.
Temos representantes do Romantismo, Realismo, Pré-Modernismo, Modernismo e Pós-Modernismo. Desde o romance romântico, de Taunay 1872, passando pela peça Anjo Negro, de Nelson Rodrigues, que escandalizou os brasileiros quando estreou em 1948, até o livro mais recente da lista, Muitas Vozes, de Ferreira Gullar- 1999. A escolha não é aleatória. O leitor entra em contato com poesia, prosa ( romances e contos) e teatro exercitando sua capacidade de ler, interpretar, refletir sobre o conteúdo e os temas abordados.
Vamos tomar como exemplo algumas obras e depois confirmar a abordagem com questões do último vestibular da UFPR.
O livro realista Dom Casmurro, de Machado de Assis, e o moderno São Bernardo, de Graciliano Ramos, trazem uma análise do comportamento do homem na sociedade a difícil relação do homem consigo mesmo e com os outros.
Nas aulas, certamente, já se tratou das afinidades entre esses autores, uma vez que a prosa moderna da 2ª geração ou prosa neo-realista, adota procedimentos similares aos de Machado.
Quem estabelece paralelos entre os autores e as obras, percebendo o que os aproxima ou os afasta, demonstra habilidade de um leitor que não se limita ao enredo.
Com relação aos contistas, Clarice Lispector (Felicidade Clandestina) e João Antonio (Leão de Chácara) é essencial não "colocar todos os ingredientes numa mesma panela".
Não há como encarar o estilo ébrio de Clarice e entrar em seus contos buscando o raciocínio lógico para entender o que pretendia essa "bruxa" que sondou a alma humana. Aqui, é importante conhecer a autora e seu estilo, para mergulhar no íntimo das personagens e perceber o ser humano com seus devaneios, seus medos e anseios, suas sensações divinas e odiosas.João Antonio com seus contos reflete sobre as mazelas de um grupo social marginalizado nos grandes centros urbanos. Aqui também, mais do que saber o resumo, é preciso ficar atento ao estilo inovador do autor, à inventividade da linguagem e à abordagem do lado humano desses que saíram dos trilhos e se perderam na vida.
A linha de cobrança que vem seguindo a UFPR, outras universidades e o Enem não se distancia muito, quando o assunto é literatura. Ler buscando a compreensão e análise ainda é o melhor caminho para quem busca o sucesso nesses processos seletivos.
Se o tempo que resta não é tão longo, lembre-se dos benefícios que a leitura traz: a ampliação do campo de visão, a confrontação de pontos de vista, a correção gramatical, o enriquecimento do vocabulário, a formação intelectual, entre tantos outros.
Ainda não se convenceu? Então é bom ter em mente que esses benefícios serão desfrutados em todas as áreas do conhecimento e, em especial, para quem quer sair na frente na produção de textos. Pense nisso: quem lê, tem mais a dizer. Depois, é fazer as provas e correr pro abraço...
Veja alguns exemplos de questoes da prova da UFPR - 2009/2010
1. Assinale a alternativa correta a respeito da relação de Paulo Honório, narrador de S. Bernardo, de Graciliano Ramos, com outras personagens:
a) Seu Ribeiro, o guarda-livros da fazenda S. Bernardo, depois do casamento de Paulo Honório sente-se diminuído com a interferência de Madalena em seu trabalho e por isso decide deixar a propriedade.
b) Madalena, mulher de Paulo Honório, que em solteira era professora primária, mata-se por não suportar viver umcasamento sem amor, tão diferente daqueles que conhecia dos romances românticos que costumava ler.
c) Dona Glória, tia de Madalena, contribui para as crises vividas pelo casal, porque de um lado quer o bem da sobrinha, mas por outro admira o espírito objetivo de Paulo Honório, muito parecido com o seu próprio estilo.
d) O Padilha, de quem Paulo Honório tira a fazenda S. Bernardo, é homem profundamente ligado à terra; não conseguindo viver longe da propriedade, pede para trabalhar na fazenda para manter o contato com a vida rural.
e) Casimiro Lopes, fiel capanga de Paulo Honório, é uma personagem que, ao mesmo tempo em que tem a insensibilidade de matar por encomenda, tem sensibilidade para tratar com crianças, compreendendo o filho do patrão melhor do que o próprio pai.
2. Sobre a obra Dom Casmurro, de Machado de Assis, considere as seguintes afirmativas:
1. Logo no início do romance, Bentinho afirma: "Meu fim evidente era atar as duas pontas da vida". Demonstra assim que, chegando ao final da vida, finalmente compreendeu tudo e pode então relatar com segurança que os acontecimentos que a definiram sucederam-se daquela maneira e pelas razões apontadas.
2. Ao dar a conhecer sua vida desde a infância, o narrador Bentinho procura mostrar como na personalidade de Capitu menina já estavam as qualidades de dissimulação que ele viria a criticar mais tarde.
3. Capitu é uma das personagens mais famosas da literatura brasileira. No entanto, pode-se argumentar que esse "sucesso" se dá, ele próprio, de forma "oblíqua e dissimulada", já que ela nos é apresentada apenas através das palavras de um narrador que lhe é, a princípio, hostil.
4. Tratando basicamente da vida de Bento Santiago, Dom Casmurro pode ser visto como uma exceção na obra de Machado, que vinha de largos painéis da sociedade carioca em seus primeiros romances (Ressurreição, por exemplo) e seguiria dali em diante para sagas familiares mais amplas (das famílias Cubas e Aires), dentro dos quadros do Realismo que vigorava na literatura de então.
Assinale a alternativa correta.
a) Somente a afirmativa 3 é verdadeira.
b) Somente a afirmativa 4 é verdadeira.
c) Somente as afirmativas 2 e 3 são verdadeiras.
d) Somente as afirmativas 2 e 4 são verdadeiras.
e) Somente as afirmativas 1, 3 e 4 são verdadeiras.
3. Assinale a alternativa que contém a afirmativa correta sobre os contos "Leão de chácara" e "Paulinho Perna Torta", de João Antônio, ambos pertencentes ao livro Leão de chácara.
a) O aprofundamento psicológico do protagonista do conto "Leão de Chácara" é maior do que o do protagonista de"Paulinho Perna Torta", e isso se deve ao fato de o primeiro conto ser narrado em primeira pessoa, enquanto o segundo é narrado em terceira pessoa.
b) As ações dos dois contos se passam na antiga capital federal, a cidade do Rio de Janeiro, e neles João Antônio consegue recriar ficcionalmente a mudança da malandragem do centro da cidade para os morros e os subúrbios.
c) A trajetória dos dois protagonistas se aproxima, uma vez que ambos têm uma infância difícil, sobem na vida pelamalandragem e, ao final, encontram-se em decadência, com dificuldade de encontrar uma posição numa sociedade em transformação.
d) Em ambos os contos desenha-se uma malandragem idealizada, dominada por valores como a palavra de honra, a proteção dos mais jovens e fracos e a solidariedade, que irmana os malandros.
e) Desde pequenos, os dois protagonistas já eram "mordidos", "embirrados", ou seja, briguentos, e não levavam desaforo para casa, a ponto de um ter o apelido de Pirraça e o outro ser o Perna Torta, por causa de um ferimento recebido durante uma briga.
Observe como nas três questões o que se privilegia, não é o mero enredo, mas as inferências que o leitor fez após as leituras.
Gabarito: 1. e); 2. c); 3. c).
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