As escolas brasileiras ficaram fechadas desde o início da pandemia da Covid-19 até o último trimestre de 2020, e a educação remota permaneceu por meses como a única modalidade de ensino a que se tinha acesso. Apesar de ser uma saída emergencial, o modelo acabou se prolongando excessivamente, o que deixou o Brasil entre os países que mais demoraram para retomar as atividades presenciais. Atualmente, 26 das 27 unidades da federação já liberaram a volta às aulas em modelo híbrido nas escolas privadas. Nas escolas públicas, entretanto, a maioria dos estados ainda não autorizou a retomada presencial.
INFOGRÁFICO: saiba como está a situação para a retomada das aulas presenciais em cada estado e no DF
Parte das escolas particulares começaram a retomar as atividades presenciais ainda em 2020, assim como a rede pública de alguns de estados e municípios. A expectativa era iniciar 2021 com uma parcela significativa dos cerca de 50 milhões de estudantes brasileiros matriculados no ensino infantil, fundamental e médio no sistema híbrido – modalidade que alterna o ensino remoto e o presencial, geralmente por meio de rodízio entre os alunos.
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Mas, por causa das novas contaminações da Covid-19 a partir da variante de Manaus, no primeiro trimestre deste ano as redes públicas e particulares que já haviam reaberto suas escolas foram obrigadas a fechar novamente, e aquelas que estavam prestes a retomar as atividades adiaram os planos.
Um novo movimento de reabertura teve início em abril, porém ganhou mais força a partir de maio. Atualmente, 25 dos 26 estados brasileiros e o Distrito Federal liberaram a volta às aulas em escolas particulares – a única exceção é o Amapá.
Já na rede pública, nove das 27 unidades federativas já retomaram as atividades no modelo híbrido com parte dos alunos. Em todas, as famílias puderam optar por enviar os filhos às escolas ou mantê-los no ensino remoto. Goiás, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Sergipe e Piauí, que ainda não retomaram, já determinaram a reabertura das escolas da rede pública a partir de agosto – movimento que deve ser seguido pela maioria dos estados que ainda não decidiram sobre a retomada.
“Os alunos de escolas particulares já estão tendo aulas, apesar de haver exceções de acordo com as diretrizes dos municípios. Agora, na rede pública, que concentra 80% dos nossos alunos, lamentavelmente ainda não conseguimos evoluir tanto”, explica Carolina Campos, especialista em educação e fundadora da ONG Vozes da Educação. “Mas o que posso dizer é que existe um esforço real das secretarias de educação dos estados para a volta às aulas”, destaca.
Baixas contaminações no ambiente escolar na volta às aulas
De acordo com Carolina, entraves como a resistência de sindicatos de educadores e a própria insegurança dos gestores têm sido atenuados com as baixas contaminações no ambiente escolar nos colégios particulares e nas redes públicas que já reabriram. Ela explica que o posicionamento de estados como São Paulo e Rio de Janeiro - que conseguiram sustentar a decisão da reabertura mesmo com fortes críticas dos sindicatos - permitiu que outras redes vissem a experiência de retomada como positiva e fez com que mais estados e municípios flexibilizassem o retorno presencial.
“Foi a mesma coisa que a França fez: sofreu muito com os sindicatos, sustentou a decisão e, conforme o tempo foi passando, as coisas foram melhorando. Cada estado tem um motivo pelo qual voltou, e sentimos que há uma onda de retomada levando outros a reabrirem ou a estipularem datas para a reabertura”, observa a especialista em educação.
Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), explica que o movimento de volta às aulas presenciais nas redes públicas tem se tornado realidade sobretudo nas regiões Sudeste e Sul, mas ela alerta para impasses que podem inviabilizar por ainda mais tempo a retomada em alguns municípios.
Segundo ela, quase um ano e meio após o início da pandemia ainda há municípios que não deram uma resposta adequada para mitigar os prejuízos educacionais decorrentes do fechamento das escolas. “São municípios que planejam voltar apenas no segundo semestre e ainda nem planejaram uma data. Isso é bastante preocupante”, destaca.
Com a troca de gestão nas administrações municipais, prefeitos que não viam grandes chances de reeleição, de acordo com Claudia, não se empenharam para fazer as obras necessárias para adequar as escolas aos protocolos de segurança, o que gerou impasses para os eleitos (mandatos de 2021 a 2024). Os investimentos seriam para viabilizar os protocolos sanitários e pedagógicos, ampliar a ventilação dos ambientes fechados e incluir lavatórios.
Vacinação dos profissionais de educação
Ainda que parcialmente, em junho de 2021 todos os estados começaram a vacinar os profissionais de educação contra a Covid-19. Algumas unidades federativas, como Amapá e Distrito Federal, têm destinado aos educadores a vacina da Janssen, produzida pela farmacêutica Johnson & Johnson, que é de dose única, a fim de acelerar a imunização da categoria e a volta às aulas presenciais.
Embora a vacinação dos professores e demais profissionais de educação ainda deva se estender durante todo o mês de julho em algumas regiões, de acordo com as fontes ouvidas pela Gazeta do Povo, é possível voltar às aulas com segurança desde já. “Há vários epidemiologistas que apontam que é seguro retornar com os professores tendo recebido apenas a primeira dose. Existem diversos estudos citando que escolas que implementam os protocolos de biossegurança com sucesso e rigidez se tornam ambientes mais seguros do que a própria casa dos alunos, porque em casa normalmente não tem nenhum tipo de protocolo”, salienta Carolina.
Ela cita ainda estudos que concluíram que crianças contaminam menos e transmitem menos a Covid-19. “Vários estados estão com a vacinação de professores bem adiantada, e a partir da primeira dose já há uma imunização, o que permite a retomada – desde que observando os protocolos de segurança. Diante desse cenário, não faz sentido continuar insistindo em mais um semestre sem aula”.
Claudia afirma que os impactos da atual crise de saúde na educação – sobretudo em alunos em maior vulnerabilidade, que desde o início da pandemia passaram por dificuldades de acesso às aulas por falta de tecnologia – são a maior crise educacional da história moderna, o que demonstra a urgência de um retorno imediato às atividades presenciais.
“Não houve nenhuma outra crise educacional tão séria, nem na Segunda Guerra Mundial. Além das enormes perdas educacionais, há outras consequências, como evasão escolar, trabalho infantil, exploração sexual e suicídio de adolescentes. Isso nos coloca em sentido de urgência para organizar uma volta o máximo de segurança possível. Estamos com tudo aberto – bares, restaurantes, comércio. Só não pode abrir escola?”, questiona.
Claudia reforça a importância de as escolas reabrirem mesmo sem a segunda dose de imunização dos profissionais de educação. “Como em outros países, não só na Europa, mas também na África, a volta às aulas ocorreu sem todos os professores estarem vacinados com as duas doses e sem uma parcela muito grande da população estar imunizada”, afirma. “Não ter tomado as duas doses não significa que não se possa voltar, mas sim que vamos ter que tomar alguns cuidados adicionais por mais algum tempo”.
Novos fechamentos pontuais farão parte da retomada, dizem especialistas
A experiência de fechar e reabrir escolas conforme os números da pandemia oscilam é algo com que os países deverão aprender a lidar, como aponta a 2ª edição do Levantamento Internacional de Retomada das Aulas Presenciais, que analisou os resultados da reabertura de escolas em 21 países de diferentes continentes durante a pandemia de Covid-19.
As escolas particulares e as redes de ensino público, entretanto, devem ter protocolos claros para lidar com casos de contaminações. Essas medidas evitam o fechamento completo das escolas a partir da identificação de contaminados. Para Claudia, a experiência europeia mostra protocolos efetivos a partir do monitoramento de casos. “Se identificou apenas um caso, fecha aquela sala por 14 dias; se são mais de três turmas, fecha a escola por 14 dias. Não precisa fechar todas as escolas após o surgimento de casos pontuais”, explica a educadora.
Claudia reforça que a experiência das escolas brasileiras que já reabriram, além da experiência internacional, mostra que o contágio entre alunos é muito baixo e que as infecções entre os professores não ocorrem necessariamente nas escolas.
Além disso, Carolina ressalta a importância de desmistificar que abrir e fechar as escolas durante o processo de retomada é algo negativo. “Isso faz parte. Até hoje isso está acontecendo em Israel, que é o país que mais vacinou proporcionalmente no mundo”, destaca.
Saiba como está a situação da volta às aulas em cada estado brasileiro
- Retorno integral: ainda que as autoridades estaduais tenham liberado a retomada no modelo híbrido, não significa que a totalidade das escolas já tenha retomado as atividades presenciais.
- Retorno autorizado: O governo estadual já publicou ato normativo autorizando a volta às aulas presenciais, mas não em caráter obrigatório – não houve adesão massiva, e a maioria das escolas ainda permanece fechada.
- Ensino híbrido: todas as escolas da rede estadual foram obrigadas a retornar presencialmente a partir de uma determinação do estado. Apesar de o modelo ser majoritariamente híbrido, algumas escolas, principalmente na rede privada, já oferecem retorno 100% presencial para alunos que assim desejarem.
* As permissões para a volta às aulas presenciais estão sujeitas a diferentes protocolos, como limitação do número de alunos, alternância com atividades remotas, restrição a determinados níveis de ensino ou anos escolares, entre outros. Além disso, em estados que autorizaram o retorno, decretos municipais podem impedir a retomada presencial.
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