Graças à globalização e à tecnologia, palavras como “resumo”, “ligação” e “reunião” ganharam ares rebuscados e agora são facilmente compreendidos como “briefing”, “call” e “meeting” no meio corporativo. Numa primeira análise, essa aproximação com a língua inglesa até pode parecer um ensaio de avanço do Brasil. Mas segundo dados da empresa de educação internacional EF Education First, que classifica o nível de conhecimento da língua inglesa entre adultos de países que não têm o idioma como língua nativa, esta sensação é apenas para inglês ver. Ou melhor, ouvir.
A pesquisa divulgada recentemente avaliou, por meio de uma prova online, mais de um milhão de adultos de 80 países e territórios e a pontuação média do Brasil não foi nada encorajadora: o país caiu do 40º para o 41º lugar.
A nota dos brasileiros foi de 51,92 em uma escala de 0 a 100. Em comparação com o ano passado, a média do país até apresentou uma melhora (em 2016 a pontuação foi de 50,66), mas o país manteve a classificação de “baixa proficiência” no idioma.
“Esta ‘não-evolução’ é preocupante porque apresenta um déficit no acompanhamento de uma tendência mundial. Dos países menos ou igualmente desenvolvidos, cerca de 20 conseguiram evoluir no ranking enquanto nós não apenas estagnamos, como retrocedemos uma posição”, diz Luciano Timm, responsável pelo EF EPI aqui no Brasil.
O Brasil realmente precisa do inglês?
A fluência no inglês pode até não ter uma necessidade direta para atividades do dia-a-dia, como ir à feira ou pedir um pingado na padaria, mas quando o foco da análise vai do micro para o macro a resposta é outra. Os índices positivos na economia, no reconhecimento científico e no IDH de países como Holanda, Suécia e Dinamarca –as três melhores posições do ranking, respectivamente- são diretamente proporcionais à fluência do idioma.
Para Silvia Colello, professora de psicologia da educação e pós-graduação na área de linguagem da USP, é necessário mudar a nossa percepção do idioma. “Tem gente que aprende o inglês apenas como uma fala. Uma língua não é apenas uma questão de comunicação, mas de história, de modo de viver. A língua estrangeira é uma questão de formação humana”, fala.
A professora explica que o aprendizado de uma língua é uma espécie de ‘musculação do cérebro’. “Quanto mais línguas aprendemos, mais fácil se torna o aprendizado de outras línguas. Seguindo esse raciocínio, mais globalizados internamente e socialmente nos tornamos”, conclui.
Luciano Timm faz coro à professora. Ele alerta sobre o problema de isolamento do Brasil por conta da barreira do idioma. “Há uma relação direta entre registro de propriedade intelectual e fluência no inglês. Nós temos poucas universidades que publicam estudos em inglês. Como um cientista vai se beneficiar de descobertas de outras áreas e como eles vão colaborar com outros estudos se as suas pesquisas não são publicadas?”, indaga.
O problema é mais embaixo
No entanto, antes de analisarmos a educação superior é necessário mudar a educação de base. De acordo com o Movimento Todos pela Educação, dos 2.438.249 alunos de escolas municipais e estaduais do Brasil, apenas 1.225.082 demonstraram o aprendizado adequado na competência de leitura e interpretação de textos em português até o 5º ano. Ou seja, cerca de metade dos alunos não aprendeu de forma correta conceitos básicos ensinados.
“Muitos dos alunos brasileiros com os quais tive contato tiveram mais problemas com o entendimento de estruturas verbais do que com a pronúncia, que eu achava que seria a principal dificuldade”, explica Hale Schneider. Formado em letras pela New York University, o norte-americano que está percorrendo o Brasil ensinando a língua. Ele já percorreu 8 estados e 20 municípios. Em todos eles encontrou o mesmo problema: dificuldades com a gramática do português.
Com a reforma na educação, sancionada pelo presidente Michel Temer neste ano, o ensino do inglês se tornou matéria obrigatória a partir do 6º ano. “Uma coisa é certa: o aluno terá mais dificuldade para aprender um novo idioma se não dominar o seu. Não dá para compreender o verbo ‘to be’ se não consegue conjugar o verbo ser”, explica Silvia Colello. O MEC afirma que “os sistemas de ensino poderão ofertar outras línguas estrangeiras se assim desejarem, preferencialmente o espanhol. A língua inglesa é a mais disseminada e a mais ensinada no mundo inteiro”.
No entanto, essa mudança não deve caminhar sozinha. “O nível de escolaridade do brasileiro é baixo porque há diversas dificuldades para o ensino no Brasil. Há que desenvolver um planejamento e um destino correto para as verbas de educação”, afirma Silvia Colello. A professora explica que a formação de professores é essencial para a mudança, já que “não dá para escrever o vocabulário na lousa e achar que está ensinando um idioma. É necessário explicar tudo que envolve a língua”.
Luciano Timm soma a essa receita dois ingredientes, além da capacitação de professores e repasse de verba destinada à educação: o uso de tecnologia e revisão da avaliação. “Capacitação é o primeiro passo. Depois vêm alguns empecilhos como as dificuldades regionais, que podem ser revertidas com o uso de tecnologia. Os meios tecnológicos podem auxiliar tanto no ensino como também na capacitação. Depois desses dois passos é necessário dar mais ênfase para o inglês em provas como o ENEM, que neste ano teve somente 7 questões de inglês e uma de espanhol”, fala.
Há luz no fim do ranking
Como disseram os especialistas, o repasse de verba é a solução mais fácil e justa para equalização dos problemas do ensino. Em 2007 o Vietnã resolveu seguir o senso comum e catapultar a sua economia através da educação. Foi destinado 20% do orçamento público para o ensino público, começando pela a construção de mais prédios escolares. Com o aumento de lugares físicos, a média de alunos por professor naturalmente caiu. Para o local não ficar ocioso, aumentaram a jornada escolar para período integral, fazendo com que as crianças tivessem mais tempo para matérias que não constavam no currículo básico, como foi o caso do inglês. Atualmente o país ocupa a posição 34 do ranking.
As novas gerações, que foram beneficiadas com a mudança, levaram como lição de casa a importância da língua inglesa para a família. E mesmo em locais distantes de centros urbanos, antigas gerações fizeram uma equação simples: a importância do inglês (que entrou para a grade curricular das escolas) e o aumento do número de estrangeiros em regiões campestres. Mesmo em locais mais distantes dos centros urbano como Sapa e Um Cang Chai é possível encontrar vietnamitas fluentes em inglês.
“O que eu fiz, como muitas mulheres daqui, foi um intercâmbio de conhecimento: os gringos nos ensinaram o idioma enquanto nós ensinávamos as trilhas e segredos dos campos de arroz. Ou seja, onde eles poderiam montar negócios e pousadas. Eles lucraram, eu lucrei”, explica Mao. Após aprender o inglês, se interessou pelo vietnamita (sua língua materna é o dialeto de sua tribo hmong-mien) e também por francês e espanhol. Hoje ela trabalha como guia turística e conseguiu aumentar suas terras na região de Sapa. “Se eu consegui, todo mundo consegue”, conclui num inglês impecável.
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