Em setembro de 2010, durante um comício em Joinville, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) – que vivia o auge de sua popularidade – fez uma declaração forte. "Precisamos extirpar o DEM da política brasileira", afirmou. Dez anos depois, a ideia preconizada por Lula nunca pareceu tão distante.
A começar pelo Parlamento: Rodrigo Maia (DEM-RJ) preside a Câmara dos Deputados, e Davi Alcolumbre (DEM-AP) comanda o Senado. A gestão de ambos é tão aprovada pelos parlamentares que Congresso, Executivo e Supremo Tribunal Federal (STF) discutem uma manobra jurídica para permitir uma inusitada reeleição.
No Executivo, o partido tem dois ministros na estrutura do governo federal: Tereza Cristina (Agricultura) e Onyx Lorenzoni (Cidadania). E, nas prefeituras, pesquisas de intenção de voto para as eleições municipais mostram que o DEM pode crescer no pleito de 2020.
Se vencer em mais de uma capital, DEM já terá desempenho melhor do que em 2016
De acordo com as pesquisas, candidatos do DEM lideram em quatro capitais: Salvador, Curitiba, Rio de Janeiro e Florianópolis. Deles, três representam a continudade do governo de ocasião.
Em Salvador, Bruno Reis é o escolhido para suceder ACM Neto, que dispõe de expressivos índices de aprovação e hoje é o presidente nacional do DEM. Segundo levantamento do Instituto Paraná Pesquisas, ele tem 52% das intenções de voto – e, portanto, pode vencer já no primeiro turno.
Já em Florianópolis e Curitiba são os atuais prefeitos, Gean Loureiro e Rafael Greca, respectivamente, que vão novamente às urnas. Ambos não concorreram em 2016 pelo DEM – Gean era do MDB, e Greca, do PMN. Segundo os últimos levantamentos do Ibope, Gean tem 44% das intenções de voto em Floripa, e Greca tem 46% da preferência dos eleitores da capital paranaense.
O quarto democrata líder é Eduardo Paes, que administrou o Rio de Janeiro entre 2009 e 2016. Na ocasião, ele era filiado ao MDB. Está no DEM desde 2018, ano em que concorreu ao governo do estado e perdeu para Wilson Witzel (PSC). Segundo o último levantamento do Datafolha, Paes tem 28% das intenções de voto, contra 13% de Marcelo Crivella (Republicanos) e da Delegada Martha Rocha (PDT) – ambos estão empatados.
Em outras duas capitais, nomes do partido não lideram, mas se mostram competitivos. No Recife, o ex-ministro Mendonça Filho briga com Marília Arraes (PT) e Delegada Patrícia (Podemos) por uma vaga no segundo turno contra João Campos (PSB). Segundo a pesquisa Datafolha mais recente, o candidato do DEM tem 15%, contra 16% de Patrícia; 18% de Marília; e 31% de Campos.
Em Macapá, o representante da sigla é Josiel Alcolumbre – irmão do presidente do Senado. Segundo o Ibope, Josiel, com 16% das intenções de voto, está em um empate técnico quádruplo na liderança com Capi (PSB), que tem 17%; Dr. Furlan (Cidadania), com 13%; e Patricia Ferraz (Podemos), também com 13%.
Se ocorrer, a vitória em mais de uma capital já representará ao DEM um desempenho melhor do que o de 2016 nas principais cidades do país. Na última eleição municipal, o partido conquistou apenas Salvador entre as capitais.
Partido já mira 2022
O DEM é também o partido do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, que virou um inimigo dos governistas após deixar o Ministério da Saúde com críticas ao modo como o presidente Jair Bolsonaro tem conduzido o combate à pandemia do novo coronavírus. Embora o episódio tenha transformado Mandetta em um alvo constante, também deu a ele a condição de nome cogitado para concorrer à eleição presidencial em 2022.
Seu nome foi incluído, por exemplo, na pesquisa XP/Ipespe sobre o tema, divulgada no último dia 15. No levantamento, o ex-ministro teve desempenho igual ao do governador paulista João Doria (PSDB), obtendo 3% das intenções de voto .
Doria, aliás, é um ponto-chave para a identificação dos próximos passos do DEM. O tucano foi eleito governador endossando o discurso bolsonarista em 2018, mas pouco após o segundo turno daquela eleição rompeu com o Presidente da República. Ele é visto como pré-candidato ao Planalto em 2022.
Historicamente, o PSDB conta com o DEM em suas coligações presidenciais – foi assim, por exemplo, com José Serra em 2010, Aécio Neves em 2014 e Geraldo Alckmin em 2018. O fortalecimento do DEM pode representar tanto a presença de um parceiro maior para o PSDB quanto a existência de um grupo político com força própria, que não queira ser apenas o componente de uma coligação.
Na mão oposta, o DEM é mencionado em uma articulação para fazer da ministra Tereza Cristina a próxima presidente da Câmara. A ministra é deputada federal licenciada pelo Mato Grosso do Sul. O nome dela começou a aparecer em especulações no início do mês, e ela mencionou a hipótese no último dia 9.
"A gente tem que sentar e conversar. Sou deputada federal, sou mulher. Nunca teve uma presidente da Câmara mulher. Mas tem mulheres muito capacitadas lá também", disse.
Sua candidatura representaria tanto um posicionamento do DEM quanto um aceno ao governo federal, já que a ministra é, hoje, uma das integrantes da Esplanada mais alinhadas ao presidente Bolsonaro.
O que explica o crescimento do DEM
O fortalecimento do partido ocorre em um momento em que o país todo vive uma guinada à direita, materializada pela vitória de Jair Bolsonaro (sem partido) em 2018 e pelos índices de aprovação do Presidente da República. Mas também se dá mesmo com figuras do DEM se posicionando, em muitas ocasiões, em posição de confronto com o bolsonarismo.
O ex-prefeito César Maia, que atualmente é vereador na cidade do Rio e presidente estadual do DEM no estado, atribui o crescimento recente da sigla ao "correto posicionamento como um partido de Centro". Já o cientista político David Fleischer, professor da Universidade de Brasília (UnB), avalia que a recuperação do DEM não é fruto do desempenho isolado de alguns líderes, e sim de um trabalho coletivo.
"Isso não é de uma pessoa só, e sim um trabalho conjunto. Até porque o DEM, quando deixou de ser PFL [mudança ocorrida em 2007], viu a renovação de suas lideranças", ressaltou Fleischer.
Hoje, alguns dos principais expoentes do DEM são filhos ou netos de figuras de destaque da política em tempos anteriores, como Rodrigo Maia, que é filho de César Maia; ACM Neto, neto do ex-governador Antonio Carlos Magalhães (BA); e o líder da legenda na Câmara, Efraim Filho (PB), filho do ex-senador Efraim Morais.
César Maia avalia que a declaração de Lula em 2010 sobre "extirpar" o DEM "deu mais unidade ao partido". De lá até os dias atuais, o DEM prosseguiu sem apresentar nome para as disputas presidenciais, embora em 2018 tenha cogitado lançar Rodrigo Maia à sucessão de Michel Temer.
Metodologia das pesquisas citadas na reportagem
Salvador
- Sob encomenda da Bahia Notícias, o Instituto Paraná Pesquisas ouviu 820 eleitores de Salvador entre os dias 16 e 19 de outubro de 2020. O levantamento tem nível de confiança de 95%, com margem de erro de 3,5 pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob a identificação BA-00401/2020.
Florianópolis
- A pesquisa do Ibope, encomendada pela NSC Comunicação, ouviu 602 eleitores em Florianópolis entre os dias 3 e 5 de outubro. O levantamento tem nível de confiança de 95%, com margem de erro de 4 pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob a identificação SC-01561/2020.
Curitiba
- A pesquisa do Ibope, encomendada pela RPC TV, ouviu 805 eleitores de Curitiba entre 20 e 22 de outubro. O nível de confiança do levantamento é de 95% e a margem de erro é de 3 pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) sob o número PR-01535/2020.
Rio de Janeiro
- Sob encomenda do jornal Folha de S. Paulo e da TV Globo, o Datafolha ouviu 1.008 eleitores do Rio de Janeiro entre os dias 20 e 21 de outubro de 2020. O levantamento tem nível de confiança de 95%, com margem de erro de 3 pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob a identificação RJ-08627/2020.
Recife
- Sob encomenda do jornal Folha de S. Paulo e da TV Globo, o Datafolha ouviu 868 eleitores do Recife entre os dias 20 e 21 de outubro de 2020. O levantamento tem nível de confiança de 95%, com margem de erro de 3 pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob a identificação PE-05988/2020.
Macapá
- Sob encomenda da Rede Amazônia, o Ibope ouviu 504 pessoas em Macapá entre os dias 12 e 14 de outubro de 2020. O levantamento tem nível de confiança de 95%, com margem de erro de 4 pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob a identificação AP-06881/2020.
Pesquisa XP/Ipespe para as eleições de 2022
- A pesquisa da XP Investimentos foi feita em parceria com o Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe). Foram ouvidas 1.000 pessoas em todo o país, por telefone, entre 8 e 11 de outubro. A margem de erro é de 3,2 pontos percentuais.
Bolsonaro e mais 36 indiciados por suposto golpe de Estado: quais são os próximos passos do caso
Bolsonaro e aliados criticam indiciamento pela PF; esquerda pede punição por “ataques à democracia”
A gestão pública, um pouco menos engessada
Projeto petista para criminalizar “fake news” é similar à Lei de Imprensa da ditadura
Auxílio Brasil: PT quer pagar benefícios sociais somente para quem se vacinar
Gestão da pandemia e retomada econômica: os desafios de Bruno Covas em São Paulo
DEM e PSDB esboçam 3ª via contra Bolsonaro e a esquerda em 2022
Eduardo Paes vai assumir o Rio com menos dinheiro e mais problemas. Veja os desafios