O PT deixou o primeiro turno das eleições deste ano com um desempenho para esquecer. Com 179 prefeitos eleitos, a legenda voltou a ter um número de prefeituras semelhante ao obtido em 2000, dois anos antes de Luiz Inácio Lula da Silva se tornar presidente. E, na conta de 2020, o partido não tem nenhuma capital para chamar de sua – ao menos por enquanto. As últimas esperanças estão no segundo turno no Recife (PE) e em Vitória (ES).
A disputa na capital pernambucana é praticamente uma briga em família. De um lado, Marília Arraes (PT), neta de Miguel Arraes, um dos nomes históricos da política no estado. De outro, João Campos (PSB), filho de Eduardo Campos e bisneto de Arraes. E, apesar de estarem sob o espectro da esquerda, o racha entre os primos chegou ao maior nível desde que Marília trocou o PSB pelo PT, em 2016, sem economizar nas críticas aos Campos.
Para o PT, ter Marília na prefeitura do Recife não seria apenas um alento em meio a um resultado ruim neste pleito, mas também significaria o retorno da legenda ao comando da cidade. O partido elegeu os prefeitos João Paulo em 2000 e 2004, e João da Costa em 2008. Nas duas últimas eleições, porém, viu o clã Campos sair vitorioso, na figura de Geraldo Júlio (PSB).
Neste ano, Marília conseguiu chegar ao segundo turno, apesar de começar a campanha atrás de Mendonça Filho (DEM) e junto de Delegada Patrícia (Podemos). No último domingo (15), a petista concretizou a ida para o segundo turno com 27,95% dos votos válidos, bastante próxima de João Campos, que fez 29,17%.
Lula é o principal cabo eleitoral de Marília no Recife
Para chegar à vitória, Marília conta, em primeiro lugar, com o principal cabo eleitoral do partido: o ex-presidente Lula. E a expectativa é que ele entre com força na campanha dela.
Na última quarta-feira (18), Marília viajou a São Paulo para gravar ao lado do líder do partido. Além disso, há a possibilidade de ele viajar a Recife para participar de eventos de campanha. Marília é atualmente deputada federal e tem sido uma das principais vozes da legenda de oposição ao governo de Jair Bolsonaro.
"As posições de Marília Arraes vão no sentido de bater no governo federal. Ela nacionaliza a campanha no Recife e isso reforça o engajamento dos petistas. Para quem entende que o impeachment de Dilma [Rousseff] foi um golpe, que a prisão de Lula foi um complô das direitas, fica muito bem abrigado na retórica de Marília Arraes", explica o cientista político e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Arthur Leandro.
A figura do ex-presidente pode ajudar a reacender a militância do PT no Recife, ligeiramente apagada nos últimos anos, mas que vê em Marília uma oportunidade de retomar a prefeitura. “Ela tem a benção da militância do PT. E essa base petista tem grande capacidade de campanha e mobilização”, completa Leandro.
Além de Lula, Marília ganhou um apoio até certo ponto inesperado. Quarta colocada no primeiro turno, com 14,04% dos votos, Delegada Patrícia era a candidata de Bolsonaro no Recife. Ele chegou, inclusive, a pedir votos para ela nas chamadas “lives eleitorais” e em postagem no Facebook na véspera da votação – no dia do pleito, ele apagou a publicação.
Delegada Patrícia anunciou que não vai apoiar Marília, tampouco João Campos. O Podemos, partido dela, porém, embarcou na campanha petista. “Mesmo respeitando a posição da candidata, o Podemos vem a público, e de forma institucional, declarar o seu apoio a Marília Arraes”, informou a legenda em nota oficial, assinada pelo presidente estadual da sigla, Ricardo Teobaldo.
O DEM de Mendonça Filho, que somou 25,07% dos votos válidos no primeiro turno, informou que não vai apoiar nenhum dos candidatos. “Nós não vamos votar nem no PT nem no PSB”, disse o terceiro colocado em entrevista coletiva na segunda-feira (16).
Nesse início de segundo turno, a candidatura de Marília dá sinais de que pode vencer no Recife. Segundo pesquisa do Ibope, divulgada na quarta-feira (18), ela está numericamente à frente do primo: de acordo com o levantamento, Marília tem 53% dos votos válidos, contra 47% de João Campos. Ambos, no entanto, estão empatados no limite da margem de erro, de 3 pontos percentuais.
Em Vitória, PT espera apoio do governador capixaba
Na capital do Espírito Santo, João Coser (PT) tenta retornar à prefeitura depois de dois mandatos de Luciano Rezende (Cidadania) – o candidato petista foi prefeito da cidade entre 2005 e 2012. Coser passou para o segundo turno por uma diferença de 1.201 votos em relação ao terceiro colocado na corrida, Gandini (Cidadania).
E é exatamente em Gandini que o candidato do PT pode tirar musculatura para vencer Delegado Pazolini (Republicanos), que foi para o segundo turno com 30,95% dos votos válidos, contra 21,82% de Coser.
Pazolini e Gandini protagonizaram a campanha no primeiro turno, um mirando no outro. Por enquanto, o Cidadania não confirmou para que lado vai, mas, pelo o que já ocorreu até aqui, ficará neutro ou irá para a campanha de Coser. Em comum, além do adversário Pazolini, ambos têm afinidades com o governador Renato Casagrande (PSB).
Na terça-feira (17), Coser e Casagrande se reuniram, mas ainda não há definição sobre um apoio formal do governador. Para conseguir essa aliança, o candidato do PT se mostrou aberto a negociações. “O segundo turno é um novo momento, uma nova eleição praticamente, com um viés mais agregador de propostas que nós vamos analisar e incorporar em nosso Plano de Governo”, disse Coser.
Ele também deve contar com a participação mais incisiva do ex-presidente Lula, que pediu votos para Coser no primeiro turno e já declarou apoio ao candidato do partido em Vitória. “Vamos juntos com João Coser”, publicou Lula em uma rede social.
Metodologia da pesquisa citada na reportagem
- Sob encomenda da TV Globo e do Jornal do Commercio, o Ibope entrevistou 1.001 eleitores do Recife entre os dias 16 e 18 de novembro de 2020. O levantamento tem nível de confiança de 95%, com margem de erro de 3 pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob a identificação PE-06514/2020.
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