Logo após apuração da votação, na noite do último domingo (15), os candidatos a prefeito Bruno Covas (PSDB) e Guilherme Boulos (Psol) já deram pistas do tom que vai dominar a campanha do 2º turno em São Paulo. O primeiro turno terminou com 32,85% dos votos para Covas e 20,24% para Boulos.
Em pronunciamentos, ambos falaram da intenção de criar uma frente ampla para derrotar o adversário e apelaram várias vezes ao sentimento de esperança dos eleitores. São eles que no dia 29 vão decidir se preferem a continuidade do projeto tucano ou uma guinada à esquerda.
“A mudança é a nossa chapa”, anunciou Boulos, apontando para o fato que quase 70% dos eleitores paulistanos não escolheram Covas no primeiro turno. “São Paulo disse que quer experiência”, rebateu o atual prefeito, insinuando que o rival nunca teve um cargo político.
O primeiro turno foi uma espécie de luta de Davi contra Golias. Com apenas 17 segundos à disposição no horário eleitoral, Boulos apostou suas fichas na campanha na internet. Já Covas, que montou uma ampla aliança, gozou de 40% do tempo de rádio e TV. No segundo turno, a disputa será de igual para igual.
“A pergunta a se fazer é: Boulos realmente pretende ganhar a eleição? Perder de pouco é interessante para o Psol, mas ganhar não sei se é algo que vale a pena”, avalia Kleber Carrilho, professor da marketing político da Universidade de São Paulo (USP).
Segundo o especialista, o partido pode repetir a postura de 2016, quando houve um esforço para que Marcelo Freixo não ganhasse a eleição municipal no Rio de Janeiro porque não havia como governar a cidade naquele momento. "Teria sido um risco para a estratégia de longo prazo do partido. É possível que isso se repita em São Paulo", diz Carrilho.
Caso eleito, Boulos encontrará uma Câmara Municipal dominada por conservadores, o que dificultaria, ou até inviabilizaria, sua gestão. Dos 55 vereadores que se elegeram em São Paulo, apenas cinco são do Psol. O PT elegeu oito, assim como o PSDB, com a diferença que os tucanos montaram uma coligação de 11 partidos, que engloba também DEM e MDB, legendas que elegeram seis representantes, cada um.
Centro X periferia
A julgar pelas palavras dos candidatos pronunciadas na noite de domingo, a campanha do 2º turno em São Paulo será marcada pelo mesmo tom do primeiro: debate sobre os planos de governo e poucos, ou nenhum, ataque abaixo da cintura.
Boulos aposta as fichas em criticar a política “elitista” de Covas. “A periferia está abandonada pelo PSDB. Eu não sou daqueles que aparecem na periferia de quatro em quatro anos para fazer falsa promessa, para abraçar criancinha e tirar foto. Para mim as pessoas que vivem aqui [na periferia] não são estatísticas, não são números”, afirmou o candidato do Psol, logo após o resultado.
Mas apesar da narrativa da campanha e de Boulos morar no bairro periférico do Campo Limpo, na zona sul da cidade, ele obteve as melhores votações no centro de São Paulo: em Pinheiros fez 32%, na Bela Vista, 30%, e em Perdizes, 29%. Já Covas foi o mais votado em todas as zonas eleitorais.
No segundo turno, Boulos deve explorar mais a relação com as periferias. Jilmar Tatto (PT), que fez pouco mais de 8% dos votos, já anunciou apoio ao candidato do Psol. Com isso, Boulos deve herdar boa parte dos votos da Tattolândia, reduto do petista na zona sul.
Isso não quer dizer que o petismo colocará o partido a serviço de Boulos. "Duvido que a máquina do PT vai fazer esforço para Boulos ganhar porque seria um suicídio para o PT em São Paulo. Já tentaram se suicidar com Tatto", opina Carrilho. A candidatura do petista não conseguiu unificar o partido.
Outra estratégia de Boulos para conquistar os eleitores das regiões mais pobres da cidade será explorar a imagem de Luiza Erundina, que é vice na chapa, no horário eleitoral. Erundina foi prefeita de São Paulo entre 1989 e 1993 pelo PT.
“Ela fala com as pessoas mais velhas e ainda há um recall [memória no eleitor] de quando foi prefeita. Não foi à toa que Boulos a escolheu para ser vice. Há muito voto da Erundina nesse resultado do Psol”, avalia o especialista.
2º turno em São Paulo: Continuidade X mudança
A comunicação política dos candidatos no 2º turno em São Paulo será orientada também pela polarização entre continuidade de governo e mudança. Covas comemorou o resultado do primeiro turno afirmando que a “esperança venceu os radicais”, na tentativa de colar em Boulos a imagem de extremista de esquerda.
Já o candidato do Psol — que não esconde seus vínculos com o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto — tenta suavizar sua imagem para não assustar a classe média. Na campanha, por exemplo, ele foi à Faria Lima, centro financeiro de São Paulo, rebater a ideia de ser um invasor de casas.
“Radicalismo para mim é na cidade mais rica do país ver gente revirando o lixo em busca de comida, radicalismo para mim é no meio de uma pandemia manter hospitais fechados ou parcialmente abertos. Radicalismo é o abandono do povo”, contra-atacou o candidato do Psol, no domingo.
O prefeito deve continuar com a mesma estratégia comunicativa que o apresenta como o candidato da "realidade", da cidade “que não quer ilusões”. “São Paulo quer um prefeito, não quer eleger alguém que seja anti, totalitarista, ninguém que seja radical”, disse Covas.
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Candidatos vão travar batalha contra rejeição no 2º turno em São Paulo
Boulos, que tem 23% de rejeição contra 19% de Covas, segundo pesquisa Ibope, ainda tentará colar a imagem do prefeito na do governador João Doria (PSDB), que sofre com alta rejeição em São Paulo. Pesquisa Datafolha do início de outubro mostrava que 60% dos eleitores de São Paulo não votariam de jeito nenhum em um candidato apoiado por Doria.
Em entrevista coletiva nesta segunda-feira (16), o governador paulista foi questionado sobre a estratégia do candidato do Psol. "Recomendo que o Boulos se concentre na prefeitura de São Paulo. Ele não está disputando o governo de São Paulo. Se ele entra na disputa para a prefeitura pensando no governo, tem mais chances de perder do que ganhar", afirmou o governador.
Dependendo do engajamento da máquina do PT, Boulos pode enfrentar, além da rejeição pessoal, a desaprovação dos figurões do Partido dos Trabalhadores.
"Doria sai do primeiro turno menos traumatizado que Lula e Bolsonaro. Mas o voto no Bruno Covas foi um voto desconfiado por causa do Doria. Bruno tem tentado mostrar que não é Doria", explica o professor da USP.
Quem vai herdar os votos da direita?
A abstenção, que foi de 29% no primeiro turno, pode aumentar diante de um confronto entre a esquerda e os tucanos, e que deixou a direita órfã de candidato.
A expectativa é que Covas intercepte os votos do PSB de Márcio França, que teve quase 14% das preferências, e de parte dos eleitores de direita que votaram em Celso Russomanno (Republicanos) e Arthur do Val (Patriota), que fizeram respectivamente 10,50% e 9,78% dos votos.
“Os conservadores ganharam muitas cadeiras nas Câmara. A figura de Bolsonaro talvez tenha perdido em São Paulo, mas tem muito conservador se dando bem. Não existe uma guinada à esquerda”, afirma o especialista.
Para Boulos, a eleição municipal representa também uma oportunidade para pavimentar o caminho para 2022. "Ele talvez não ganhe e nem queira ganhar a prefeitura, mas pode usar o segundo turno para se apresentar como um cara que junta a esquerda em torno de um projeto alternativo ao PT para a presidência, em 2022", afirma Carrilho.
Metodologia das pesquisas citadas
- A pesquisa Ibope ouviu 1.204 eleitores em São Paulo entre os dias 12 e 14 de novembro e foi encomendada pela TV Globo e pelo jornal O Estado de S. Paulo. A pesquisa foi registrada na Justiça Eleitoral sob o protocolo SP-09660/2020.
- O Datafolha ouviu 1.092 pessoas em São Paulo, sob encomenda da TV Globo e da Folha de S. Paulo, entre os dias 5 e 7 de outubro de 2020. O levantamento tem nível de confiança de 95%, com margem de erro de 3 pontos percentuais, para mais ou para menos. A pesquisa está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob a identificação SP-08428/2020.
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