O presidente Jair Bolsonaro (PL) citou trechos de um inquérito da Polícia Federal (PF) que investiga um ataque hacker ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2018, para questionar a segurança do sistema eleitoral brasileiro em reunião com um grupo de embaixadores, nesta segunda-feira (18), no Palácio da Alvorada. O evento foi transmitido ao vivo pela TV Brasil e pelas redes sociais do presidente da República. Esta e outras alegações feitas por Bolsonaro contra as urnas eletrônicas já foram respondidas pela Corte em ocasiões anteriores (leia aqui).
Bolsonaro relatou que, segundo a investigação, um hacker teria invadido o sistema do TSE e, por oito meses, teve acesso a "toda a documentação do TSE" e "toda a base de dados". O presidente alegou, ainda, que o invasor teve acesso à senha de um ministro da Corte eleitoral, "bem como de outras autoridades".
"Os hackers ficaram por oito meses dentro dos computadores do TSE, com códigos-fonte, com senhas, e muito à vontade dentro do Tribunal Superior Eleitoral. E diz, ao longo do inquérito, que eles poderiam alterar nome de candidatos, tirar votos de um, transferir para outros", comentou. Para Bolsonaro, "é um processo aberto a muitas maneiras de se alterar o processo de votação", em uma referências aos questionamentos ao sistema eleitoral.
O presidente comentou que "o próprio TSE, em conclusões da própria Polícia Federal", admite que "o invasor conseguiu copiar toda a base de dados". Bolsonaro também disse que os logs, registros de atividade de sistemas eletrônicos, foram apagados pela Justiça Eleitoral.
"A PF pediu o tal de logs, que é a impressão digital do que acontece dentro de um sistema informatizado. O que é natural também é o órgão invadido fornecer os logs, independentemente de pedidos. A PF pediu os logs, que poderiam ser entregues no mesmo dia, ou no dia seguinte, mas sete meses depois, segundo documentos, o TSE informou que os logs haviam sido apagados", ponderou.
A investigação mencionada no encontro com os embaixadores é a mesma que rendeu a Bolsonaro uma notícia-crime por ter divulgado informações consideradas sigilosas e sensíveis, apresentada pelo TSE. Devido a isso, o presidente da República passou a ser investigado no inquérito 4.878 do Supremo Tribunal Federal (STF) por vazamento de inquérito sigiloso.
Aos embaixadores, Bolsonaro também disse que, além do Brasil, só mais dois países no mundo usam o sistema eleitoral brasileiro, em referência a Butão e Bangladesh, segundo reportagem da Folha de São Paulo. "Vários outros países ou não usam ou começaram a usá-lo e chegaram à conclusão de que não era um sistema confiável", declarou.
Ao criticar o sistema eleitoral brasileiro, o presidente afirmou que ele é "inauditável". É impossível fazer uma auditoria em eleições aqui no Brasil", disse. Ao comentar isso, Bolsonaro questionou a possibilidade de auditoria por observadores externos nas eleições brasileiras. "No Brasil, não tem como acompanhar a apuração. Eu não sei o que vem fazer observadores de fora aqui. Vão fazer o quê? Observar o que, se o sistema é falho, segundo o próprio TSE", questionou.
O chefe do Executivo citou um pedido de auditoria externa feita pelo PSDB oito anos atrás para reafirmar que as urnas são inauditáveis. "Em 2014, a conclusão foi de que houve uma dúvida naquela época. Quem ganhou as eleições? Daria um capítulo, mas eu não vou entrar nesse capítulo aqui, porque é bastante curioso o que ocorreu em 2014", comentou.
O presidente fez uma defesa do voto impresso auditável e disse que "a própria Polícia Federal recomendou o voto impresso". "Manteria o sistema eleitoral nosso, mas teria uma impressora do lado da urna, onde não haveria contato manual por parte do eleitor e, após a confirmação do voto, esse papel cairia dentro de uma urna e essa urna seria, então, utilizada mais na frente para uma contagem física caso houvesse dúvidas sobre quem ganhou as eleições", afirmou.
O presidente disse que, por quatro vezes e com sua participação "em todas elas", o voto impresso "ao lado da urna eletrônica sem contato manual do eleitor" foi aprovado pelo Parlamento. Porém, ressaltou que o STF declarou a matéria inconstitucional. "Inconstitucional no quê?", desabafou.
Em fala, Bolsonaro também rechaçou a hipótese de uma ruptura institucional, como alegam alguns opositores. "O senhor [Luís Roberto] Barroso, também com o senhor [Edson] Fachin, começaram a andar pelo mundo me criticando, como se eu estivesse preparando um golpe por ocasião das eleições. É exatamente o contrário o que está acontecendo", declarou.
Presidente critica ministros do STF e do TSE
Aos embaixadores, Bolsonaro também criticou ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do TSE, a exemplo de Edson Fachin. O presidente disse que o magistrado é o responsável por tornar elegível o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) "numa reinterpretação de um dispositivo constitucional". "O Lula estava preso e o Supremo entendeu que a prisão só poderia acontecer em última instância, na quarta instância. Ele foi condenado em primeira instância, segunda instância e terceira instância. Todos os placares, por unanimidade", disse.
O chefe do Executivo criticou não apenas o STF por ter alterado o entendimento sobre a prisão após condenação em segunda instância, como também a decisão que tornou Lula elegível. "Como ele, Lula, estava em liberdade, mas as condenações estavam valendo, o próprio ministro Fachin, relator de um processo, decidiu tornar Lula elegível. Por 3 a 2, o Supremo Tribunal Federal não inocentou, simplesmente anulou os julgamentos voltando para a primeira instância o senhor Luiz Inácio Lula da Silva", comentou.
As críticas também foram endereçadas ao ministro Luís Roberto Barroso. Bolsonaro associou a indicação do magistrado pelo PT após sua atuação como advogado do ex-terrorista italiano Cesare Battisti. "No último dia do presidente Lula, em 2010, Battisti ganhou a condição de refugiado do Brasil, graças ao trabalho dele, Barroso, e o terrorista Battisti permaneceu no Brasil. Graças a isso, certamente, ele ganhou confiança do Partido dos Trabalhadores e foi indicado para o Supremo Tribunal Federal", afirmou.
Secom diz que reunião com embaixadores foi "intercâmbio de ideias"
Em nota, a Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom) classificou o encontro de Bolsonaro com embaixadores como um "intercâmbio de ideias" sobre o processo eleitoral em curso no país.
Segundo a Secom, Bolsonaro "sublinhou aos representantes do corpo diplomático que sua própria carreira política é um resultado do sistema democrático" e lembrou "seu período de mais de 30 anos como representante eleito em trajetória iniciada na Câmara Municipal do Rio de Janeiro" à eleição à Presidência "em campanha com mínimo financiamento público".
A Secom ponderou que Bolsonaro "sublinhou aos titulares e representantes diplomáticos presentes seu desejo de aprimorar os padrões de transparência e segurança do processo eleitoral brasileiro" e "enfatizou que a prioridade é assegurar que prevaleça, de modo inquestionável, a vontade do povo brasileiro nas eleições que se realizarão em 2 de outubro próximo."
Por que Bolsonaro promoveu a reunião com embaixadores
A ideia da reunião com os embaixadores foi uma proposta de Bolsonaro para contrapor o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Edson Fachin, que recebeu em 31 de maio diplomatas de outros países para falar sobre o sistema brasileiro de votação eletrônica.
Desde maio, Bolsonaro expôs publicamente o desejo de se reunir com os embaixadores. A expectativa era expor suas divergências em relação a ações do TSE e STF. À época, fontes do Palácio do Planalto disseram à Gazeta do Povo que ministros e conselheiros – inclusive do núcleo político, que inclui sua coordenação eleitoral – tentavam convencê-lo a deixar a coordenação e o diálogo com os embaixadores para os três ministros.
O argumento era de que esse tipo de reunião com diplomatas é de competência do Ministério das Relações Exteriores. Por isso, muitos defendiam que o chanceler Carlos França coordenasse a reunião. Além disso, também afirmavam que participaria da reunião o ministro da a Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira, por coordenar a participação das Forças Armadas na comissão do TSE que avalia a segurança das urnas eletrônicas.
Prevaleceu, porém, a decisão do próprio Bolsonaro em falar aos embaixadores. O debate público sobre o questionamento do sistema eleitoral e o discurso por mais transparência às eleições é considerado uma pauta fundamental para o presidente na campanha à reeleição, sendo até tido como uma estratégia política.
Que embaixadores foram à reunião com Bolsonaro
O Palácio do Planalto e o Itamaraty não divulgaram oficialmente quais e quantos embaixadores ou representantes estiveram presentes na reunião no Palácio da Alvorada. O Ministério das Relações Exteriores não organizou a reunião. Interlocutores afirmam que os convites ficaram a cargo do Planalto.
O que fontes do Planalto dizem à Gazeta do Povo é que foram convidados os mesmos 68 embaixadores que compareceram a um evento organizado pelo TSE em maio. Na ocasião, o tribunal tratou sobre o calendário das eleições, estatísticas e voto no exterior e urnas eletrônicas. Entre os convidados, estiveram representantes da embaixada da União Europeia e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
A expectativa do governo, segundo diferentes veículos de imprensa, era receber em torno de 40 representantes de outros países. O jornal O Estado de S. Paulo informou que os Estados Unidos foram representados pelo encarregado de negócios, Douglas Koneff. A União Europeia, pela encarregada do mesmo setor, Ana Beatriz Martins. A embaixadora da França, Brigitte Collet, também participaria da reunião. Representantes de Portugal e Bélgica também teriam confirmado a presença.
O que diz o TSE sobre as alegações de Bolsonaro contra urnas e ministros
Várias das alegações feitas pelo presidente Bolsonaro contra as urnas eletrônicas e os ministros do TSE já foram rebatidas pela Corte em outras ocasiões e também pelos próprios magistrados. A comunicação do TSE selecionou várias declarações e divulgou uma resposta a elas, com base em conteúdo já publicado em seu site oficial.
Em relação à afirmação de que apenas outros dois países do mundo, Butão e Bangladesh, usam o modelo das urnas brasileiras, sem impressão do voto, o TSE diz que partes dos Estados Unidos e da França também não imprimem o comprovante da votação. Sustenta ainda, que mesmo, assim, as urnas podem ser auditadas “antes, durante e depois das eleições”.
O TSE rebateu a alegação de Bolsonaro de que, em 2018, um hacker teve acesso a “tudo” dentro dos sistemas do tribunal. A Corte diz que a tentativa de ataque não violou a segurança das urnas. Cita várias agências de checagem que, com base na opinião de especialistas, afirmam que a invasão de 2018 não implicou em fraude no registro ou contagem dos votos.
Da mesma forma, o TSE contesta a afirmação de que um hacker poderia excluir nomes de candidatos das urnas. “Em nenhum momento as urnas eletrônicas são conectadas à internet, nem possuem placa que dê acesso a outro tipo de conexão em rede”, diz o tribunal.
Sobre a declaração de que os logs foram apagados – arquivos que registram todo percurso do hacker dentro dos sistemas, na invasão de 2018, foram perdidos pela empresa terceirizada –, o TSE diz que isso não representou risco à integridade das eleições, porque os códigos dos programas passaram por “sucessivas verificações e testes, aptos a identificar qualquer alteração ou manipulação”. “Nada de anormal ocorreu”, disse o tribunal em nota divulgada no ano passado. “É possível afirmar, com margem de certeza, que a invasão investigada não teve qualquer impacto sobre o resultado das eleições”, diz outro trecho da nota.
Durante o encontro, Bolsonaro também disse aos embaixadores que a auditoria feita pelo PSDB após as eleições de 2014 concluiu que o sistema é inauditável. O TSE diz que a mesma auditoria não encontrou fraudes na votação daquele ano.
O TSE também rebateu a declaração de que os observadores internacionais, convidados para verificar a regularidade das eleições deste ano, não conseguiriam analisar a integridade do sistema, em razão da ausência da impressão do voto.
“Organismos internacionais especializados em observação, como OEA e IFES, já iniciaram análise técnica sobre a urna eletrônica. Contarão com peritos em informática, com acesso ao código-fonte e todos os elementos necessários para avaliarem a transparência e integridade do sistema eletrônico de votação”, diz o TSE.
O TSE também comentou a afirmação de que o atual presidente da Corte, Edson Fachin, resolveu tornar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) novamente elegível. O ministro Fachin diz que ficou vencido nos julgamentos que acabaram com a prisão em segunda instância – e que levaram à soltura do ex-presidente, em 2019.
“Sobre o tema do habeas corpus do ex-presidente, na semana anterior à que proferi a decisão, apliquei o mesmo entendimento para deslocar a competência de uma investigação relacionada à Transpetro”, disse o ministro, segundo a assessoria do TSE. Neste habeas corpus, Fachin anulou as condenações de Lula e o tornou novamente elegível por considerar que a 13ª Vara Federal de Curitiba não tinha competência para julgar os casos do triplex de Guarujá e do sítio de Atibaia, pelos quais o petista havia sido condenado, e também o caso do Instituto Lula.
O TSE também rebateu a alegação de Bolsonaro de que o ex-presidente da Corte Luís Roberto Barroso o acusou indevidamente de vazar o inquérito sobre o ataque hacker em 2018. Bolsonaro disse que a investigação não estava em segredo de Justiça. O TSE diz, porém, que a Corregedoria da Polícia Federal considerava o inquérito sigiloso, por ainda estar aberto.
Por fim, o tribunal também rebateu a declaração de Bolsonaro de que uma empresa terceirizada contaria os votos. “O sistema de totalização é feito no TSE e é apresentado às entidades fiscalizadoras com um ano de antecedência, bem como é lacrado em cerimônia pública”, diz o TSE.
De político estudantil a prefeito: Sebastião Melo é pré-candidato à reeleição em Porto Alegre
De passagem por SC, Bolsonaro dá “bênção” a pré-candidatos e se encontra com evangélicos
Pesquisa aponta que 47% dos eleitores preferem candidato que não seja apoiado por Lula ou Bolsonaro
Confira as principais datas das eleições 2024