A pré-campanha à reeleição do presidente Jair Bolsonaro (PL) pretende atrair para sua aliança eleitoral três partidos que hoje têm projetos próprios para a sucessão ao Planalto: o PSD, o MDB e o União Brasil. Esta última legenda acaba de filiar o ex-juiz Sergio Moro, que até então era presidenciável pelo Podemos. Já o MDB tem a senadora Simone Tebet (MS) como candidata a presidente. E o PSD, embora ainda não tenha um nome para a disputa, continua afirmando que terá concorrente à sucessão presidencial.
Os três partidos são os mais cobiçados pela coordenação eleitoral do presidente Jair Bolsonaro (PL), que atua para incluí-los na aliança pela reeleição ou, ao menos, para assegurar a neutralidade dessas legendas. Atualmente, Bolsonaro tem o apoio de PL (seu partido), PP e Republicanos, três das principais legendas do Centrão.
Atrair União Brasil, MDB e PSD para a coligação eleitoral de Bolsonaro é, hoje, tratado como "muito improvável", segundo análises feitas à Gazeta do Povo por lideranças e interlocutores dessas legendas. Já fontes do governo tratam como "difícil", mas possível de ser alcançada. E uma das estratégias do Planalto é acenar nos bastidores com a possibilidade de ceder aos partidos ministérios, secretarias e até o comando de estatais.
Mesmo sem um apoio formal, a neutralidade é um cenário bem-vindo pelo governo – embora a meta seja uma composição partidária formal a fim de obter o maior tempo possível de inserções nos horários eleitorais no rádio e na TV.
O Planalto sabe que pode esperar até o último momento para conseguir a adesão de União Brasil, PSD e MDB. E deve trabalhar nesse prazo para atrai-los. O prazo-limite é o período entre 20 de julho e 5 de agosto, quando o quando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) permite a realização de convenções partidárias para formalizar alianças eleitorais e as candidaturas.
Até as convenções, os partidos devem negociar e definir suas pré-candidaturas majoritárias para o Senado e aos governos estaduais, bem como definir quem serão seus candidatos a deputados federias e estaduais. É comum ainda que partidos lancem pré-candidatos à Presidência, mas não registram a candidatura no TSE. Algumas acabam sendo "balões de ensaio" para elevar o "capital político" de um partido no cenário federal. O grande foco das legendas, especialmente as de centro, costuma ser as definições dos arranjos estaduais.
Bolsonaro sabe disso e pretende engrossar sua aliança eleitoral até agosto, quando a campanha efetivamente começa.
Quais as chances de o União Brasil se coligar com a chapa de Bolsonaro
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), um dos coordenadores eleitorais da candidatura à reeleição de seu pai, vinha mantendo conversas para uma aliança eleitoral com o advogado Antonio Rueda, vice-presidente do União Brasil. Os dois são próximos e mantêm uma boa relação mesmo após a saída do filho de Bolsonaro do PSL – um dos partidos que formou o União Brasil (o outro foi o DEM).
As conversas aconteceram antes da filiação de Sergio Moro ao União Brasil. E ainda não está claro como ficarão após a entrada de um adversário de Bolsonaro no partido.
Mas, além de Rueda, o governo também estava tentando uma reaproximação com o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, candidato à reeleição no estado; e com ACM Neto, ex-prefeito de Salvador e pré-candidato ao governo da Bahia. Ambos são do União Brasil e até antes da pandemia de Covid-19 não haviam se distanciado de Bolsonaro. Caiado era, inclusive, um aliado. E ACM Neto, por ocasião da filiação de Moro, emitiu nota em que rechaça a possibilidade de o ex-juiz disputar a Presidência pelo União Brasil.
A expectativa do governo é que Rueda, Caiado e ACM Neto possam atuar como os elos capazes de levar o União Brasil à aliança eleitoral de Bolsonaro. Interlocutores da coordenação presidencial apontam que, se o partido aderir à coligação ou, pelo menos, liberar as bancadas nos estados e adotar a neutralidade, o governo poderia atuar para dissolver as candidaturas dos deputados federais Vitor Hugo (PL-GO) ao governo de Goiás, e de João Roma (PL-BA) ao governo da Bahia.
Como sinal de "boa fé", o governo oferece até um ministério ao partido nos bastidores. O senador Márcio Bittar (União Brasil-AC) teve seu nome cotado para assumir o Ministério do Trabalho e Emprego. Onyx Lorenzoni (PL), que vai lançar sua candidatura ao governo do Rio Grande do Sul, deixou a pasta do Trabalho na quinta-feira (31), na reforma ministerial. Mas a pasta não passou a ser ocupada por um político, e sim por um nome considerado da atual estrutura vinculada ao ministério: o agora ex-presidente do INSS, José Carlos Oliveira. Portanto, a cadeira ainda poderia vir a ser ocupada por um político.
Mas a articulação do governo para atrair o União Brasil enfrenta entraves. A começar pelo próprio Sergio Moro, que pode tentar viabilizar sua candidatura presidencial dentro de seu novo partido.
Além disso, na Bahia, ACM Neto diz aos mais próximos ser impossível ele ceder palanque a Bolsonaro – o político baiano teme sofrer os efeitos da rejeição do presidente no estado. Mesmo a possibilidade de o Planalto atuar para dissolver a candidatura de Roma seria insuficiente para que ACM faça algum movimento para apoiar uma coligação entre União Brasil e Bolsonaro. "Ele tem batido muito nessa tecla de que vai fazer a campanha local com independência e sem apoio a um [candidato a] presidente", afirma um interlocutor de ACM Neto.
O discurso é semelhante na coordenação eleitoral de Caiado. Aliados do governador de Goiás dizem que, hoje, é improvável que ele dê palanque a Bolsonaro no estado. E a justificativa é a mesma de ACM Neto: a rejeição do presidente da República.
Mas uma reaproximação de Caiado com Bolsonaro não é descartada, principalmente se o presidente aumentar sua popularidade. "Ele [Caiado] nunca virou inimigo do Bolsonaro, é amigo pessoal do Onyx [Lorenzoni, ex-ministro do atual governo], os dois são muito amigos. A ruptura [entre o presidente e o governador] foi muito mais para inglês ver do que propriamente algo que tenha ocorrido a revelia", aponta um interlocutor.
A pré-candidatura de Vitor Hugo, ex-líder de Bolsonaro na Câmara, não preocupa Caiado. O governador não se sente ameaçado e entende que os votos conquistados pelo parlamentar estão limitados ao eleitor conservador mais "raiz" de Bolsonaro.
Já os mais próximos de Vitor Hugo estão convencidos de que os espólios eleitorais de Bolsonaro não irão a Caiado e que qualquer tentativa de aproximação com o União Brasil não inviabilizaria sua candidatura. "O presidente declarou apoio ao major [Vitor Hugo]. Caiado perdeu o timing de se reaproximar, se queimou muito com os empresários do agronegócio, com os evangélicos ao fechar as igrejas [durante a pandemia de Covid], com os policiais e até com profissionais da saúde", diz um interlocutor.
Qual é a viabilidade de o PSD se aliar a Bolsonaro na eleição
O PSD é outro partido que não dá sinais de querer uma composição com Bolsonaro, ao menos por ora. O presidente nacional da legenda, Gilberto Kassab, mantém sua proposta de lançar uma candidatura própria de "terceira via". Como o partido tem quadros que apoiam Bolsonaro e outros mais afeitos a apoiar a campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o lançamento de um nome próprio é uma alternativa para manter a sigla unida.
No entanto, o cenário atual é visto pelo Planalto como propício para que o PSD passe a negociar uma possível aliança com o presidente da República. A legenda sofreu um baque eleitoral com a decisão do agora ex-governador gaúcho Eduardo Leite (PSDB) permanecer entre os quadros tucanos. O PSD esperava que ele se filiasse à sigla para concorrer à Presidência Antes de Leite, a legenda já havia tido outro revés com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que também desistiu de disputar a sucessão presidencial. Agora, o partido está sem um nome para essa disputa.
Lideranças do PSD na Câmara e no Senado entendem que as duas tentativas frustradas de lançamento de presidenciável podem influenciar o partido a se aliar a Bolsonaro ou Lula – com menos chances, neste momento, de a aliança ser com o petista. "Dentro do partido, tem uma ala representativa que apoia a reeleição do presidente, assim como tem também uma outra ala que apoia a eleição do Lula. Então, é algo que pode ser trabalhado internamente, sim", diz um senador do partido que pediu para não ter o nome revelado.
Para colocar o PSD na "mesa de negociações", Bolsonaro nomeou o agora ex-secretário-executivo do Ministério da Agricultura, Marcos Montes, como sucessor da ex-ministra Tereza Cristina no comando da pasta. Ex-deputado federal pelo PSD, Montes é alguém da confiança da ministra e é visto como o elo que pode reaproximar Kassab do governo.
"O PSD tem a segunda maior bancada do Senado e uma das maiores da Câmara. Ou seja, é algo que deve ser encarado como uma prioridade pela base política do presidente", diz o senador. "E, como estamos sem uma definição clara de qual caminho seguir [sobre candidatura presidencial], a viabilidade dessa composição [com Bolsonaro] existe", diz o senador do partido.
Um interlocutor de Kassab diz que, de fato, Marcos Montes é um quadro que pode facilitar a reintegração do PSD à base do governo, mas que isso não é automático só pelo fato de ele ter sido nomeado ministro da Agricultura. "É um processo que tem que ser deflagrado e iniciado. É possível e é legítimo. Se vai acontecer ou não, é outra história", diz a fonte. "O governo está no seu papel e exerce o seu poder administrativo da força da máquina para poder atrair esse ou aquele partido. Quem está articulando a base política tem isso muito claro na sua cabeça."
Um deputado do PSD calcula que, na Câmara, 70% da bancada é a favor do partido apoiar Bolsonaro. Contudo, ele evita bancar que a legenda embarcará na coligação do presidente. "Vai depender muito da performance dos candidatos nos estados [às chapas majoritárias]. A composição fica melhor ou pior dependendo da força de cada um", diz.
Ou seja, segundo a liderança do partido na Câmara, uma coligação do PSD na chapa com Bolsonaro dependeria de arranjos políticos nos estados e se o presidente apoiaria ou não determinados candidatos. No pior dos cenários, contudo, o deputado entende que Kassab liberaria a legenda nos estados para cada um apoiar o candidato presidencial desejado. "E a maioria absoluta iria com Bolsonaro", afirma.
Já um interlocutor do governo demonstra otimismo de o PSD estar na chapa presidencial e afirma que o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, é quem tem liderado as articulações. "Ele e o Kassab se entendem bem", afirma. Entretanto, afirma que as negociações vão depender de Bolsonaro atender ou não às demandas da sigla, que podem incluir a acomodação de aliados em mais estruturas do governo e a liberação de emendas parlamentares. "O Jair [Bolsonaro] não gosta de ceder a esse tipo de chantagem, mas o Kassab não é ideológico", resume.
Como estão as conversas com o MDB e quais as chances de apoio ao presidente
Dos três partidos alvo do interesse do Planalto, o MDB é possivelmente o mais improvável de ingressar em uma coligação formal com o PL pela reeleição de Bolsonaro. A legenda é composta por diferentes grupos e caciques nos estados, sendo alguns mais e outros menos afeitos ao Planalto. Em Alagoas, por exemplo, a família Calheiros comanda o MDB e faz oposição ao governo federal e à família de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara e aliado de Bolsonaro.
Além disso, o MDB é o único dos três partidos desejador por Bolsonaro que tem uma pré-candidatura posta, a da senadora Simone Tebet (MDB-MS). E p presidente nacional do MDB, deputado federal Baleia Rossi (SP), é um crítico de Bolsonaro.
Diante das disso, a estratégia mais provável do Planalto é trabalhar para inviabilizar a candidatura de Simone Tebet e para que o MDB não tenha candidato a presidente, liberando o partido nos estados a apoiar quem quiserem. Nesse cenário, Bolsonaro poderia vir a ter uma aliança informal com alguns emedebistas.
Na Executiva Nacional emedebista, um dos nomes que apoia a liberação da bancada nos estados é o prefeito de Duque de Caxias (RJ), Washington Reis, segundo-secretário. Segundo ele, a Baixa Fluminense está dividida entre Bolsonaro e Lula. "Aqui, não acreditamos mais na terceira via", afirma.
Duque de Caxias é o terceiro município mais populoso do Rio de Janeiro, reduto eleitoral de Bolsonaro. Em março, por exemplo, o presidente da República cancelou um encontro com o prefeito da capital fluminense, Eduardo Paes (PSD), para estar com Reis. O prefeito também já foi recebido pelo presidente em agenda no Planalto.
O prefeito tenta se viabilizar como candidato ao Senado e se aproximou de Flávio Bolsonaro – que, por sua vez, quer o apoio de quadros do MDB a Bolsonaro nos estados. Uma chapa do presidente com Reis como candidato a senador foi algo dialogado, mas enfrenta resistências do senador Romário (PL-RJ), que tentará a reeleição.
Mas há alas do MDB que não acreditam que o Planalto vai ter sucesso com a sigla. O deputado federal Hildo Rocha (MDB-MA), primeiro-vice-líder do partido na Câmara, não acredita na possibilidade de a legenda aderir à base eleitoral de Bolsonaro. "É improvável. E partido está imbuído na candidatura da Simone Tebet. Qualquer outra conversa é prejudicial a isso. É uma excelente candidata, está disposta, e a gente não conversa sobre outra coisa que não seja a candidatura dela. Ficaria ruim", afirma.
Questionado sobre as conversa de Washington Reis com Bolsonaro e Flávio, Rocha diz não acreditar que somente o prefeito de Duque de Caxias seja determinante para assegurar a neutralidade do partido na disputa presidencial. "Não é algo fácil. Embora o Washington Reis seja uma liderança muito forte, uma pessoa que sempre foi do MDB e é muito respeitada, não sei até que ponto ele conseguiria o êxito que deseja. Mas na política nada é impossível", diz.
Qual é a posição de interlocutores do núcleo eleitoral do governo
O governo tem deixado claro nas conversas com integrantes do União Brasil, PSD e MDB que está disposto a ceder cargos e órgãos públicos aos partidos, mas que alguns não vão fazer parte das negociações. A Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil, por exemplo, são consideradas inegociáveis.
A acomodação de apadrinhados ou nomes com o aval de partidos em outras estatais, contudo, tem ocorrido. E um exemplo dessa disposição de acomodar aliados no governo é a Petrobras. A estatal terá como novo presidente o economista Adriano Pires, um nome técnico, mas com proximidade junto a caciques do Centrão – como o ministro-chefe da Casa Civil e presidente licenciado do PP, Ciro Nogueira, que deu aval para a indicação.
Segundo afirma um interlocutor do governo, Bolsonaro tem resistências a ceder a algumas acomodações políticas, mas tem sido convencido por Valdemar Costa Neto (PL) e Ciro Nogueira (PP) a compor com os partidos. "Jair é uma pessoa difícil, mas o Valdemar tem conquistado a confiança dele", diz. "Se o Valdemar conseguir convencer o Jair a fazer concessões em relação a operar parte da máquina para o Kassab, por exemplo, aí acabou, eu acredito que eles levam os três partidos [PSD, MDB e União Brasil]", complementa.
O esforço do governo para puxar o PSD para a base eleitoral, por exemplo, é apontado por um cálculo político pragmático. "A questão do Kassab [presidente do PSD] não é porque ele pode ser determinante para o presidente [Bolsonaro]. É mais para retirar o restinho da oposição e isolar o espectro da esquerda", explica um interlocutor palaciano.
A conta feita é que, se o PSD não estiver com Bolsonaro, pode estar com Lula. Kassab, inclusive, já teve conversas com o PT. "Se tirar da órbita os partidos que estão no centro e deixar a esquerda isolada, isso estrategicamente é bom porque deixa clara a polarização, que é um interesse total da estratégia de campanha. Não no sentido de radicalismo, mas de a polarização não deixar espaço para a população fazer escolhas mais ponderadas", reforça o interlocutor do Planalto.
Por esse motivo é que, embora a coligação formal com os três partidos seja o ideal, a liberação das bancadas nos estados também é algo bem visto pelo governo. Nessa situação, os quadros do PSD, MDB e União Brasil poderiam fazer campanha para Bolsonaro, por exemplo.
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