Filiado ao Partido Liberal (PL) desde novembro, o presidente Jair Bolsonaro reforçou o seu discurso para a base ideológica no intuito de manter o seu eleitor mais conservador para as eleições de outubro. De acordo com aliados do Palácio do Planalto, a entrada em um partido do Centrão desagradou essa fatia do eleitorado, tida como primordial para a manutenção da viabilidade eleitoral do presidente.
Além disso, articuladores do governo calculam que a entrada do ex-ministro Sergio Moro (Podemos) na corrida presidencial pode atrair parte do eleitorado que votou em Bolsonaro em 2018, mas que ficou descontente com a filiação dele ao PL. Por isso, a expectativa é de que Bolsonaro continue a fazer acenos e discursos mais voltados para esse grupo ideológico durante os próximos meses.
Dias após a sua filiação, Bolsonaro admitiu em um evento no Palácio do Planalto que tinha sido aconselhado a "não se meter" em decisões proferidas pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) contra seus aliados. Mesmo assim, ele justificou esse comportamento a seu eleitorado mais ideológico.
"Doeu no meu coração ver um colega preso? Doeu. Mas o que fazer? Será que queriam que eu tomasse medidas extremadas? Como é que ficaria o Brasil perante o mundo? Possíveis barreiras comerciais, problemas internos", disse Bolsonaro a uma plateia na qual estava o deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), que ficou preso por sete meses por determinação do ministro Alexandre de Moraes.
Já em dezembro, em entrevista à Gazeta do Povo, o presidente subiu o tom contra Alexandre de Moraes por causa de decisões contra seus aliados. "Lamento a prisão do jornalista [Oswaldo Eustáquio], Trovão [Zé Trovão, líder de caminhoneiros], Roberto [Jefferson, ex-presidente do PTB]. Isso é uma violência sem tamanho praticada por um ministro do Supremo que agora abriu mais um inquérito em função de uma live que eu fiz há poucos meses. É um abuso. É o que eu disse: ele está no quintal de casa. Será que ele vai entrar? Será que ele vai ter coragem de entrar? Não é um desafio para ele. Quem tá avançando é ele, não sou eu", afirmou Bolsonaro.
Na mesma entrevista, Bolsonaro disse que se Moraes "quiser jogar fora das quatro linhas [da Constituição]", ele joga também. Mas emendou que "não pretende fazer isso". "Tudo tem um limite. Eu jogo dentro das quatro linhas, e quem for jogar fora das quatro linhas, não vai ter o beneplácito da lei. Se quiser jogar fora das quatro linhas, eu jogo também."
Essas foram as primeiras declarações de Bolsonaro contra o STF desde a crise gerada por conta das manifestações de Sete de Setembro. Desde então, Bolsonaro vinha evitando desgastes com os membros da Corte. Agora, aliados do Planalto avaliam que o presidente não está "atacando", mas apenas "desabafando" para defender seus aliados.
Depois de Mendonça, Bolsonaro promete novos evangélicos para o STF
Em outra frente, Bolsonaro e seus aliados também buscam manter o apoio do eleitorado evangélico conquistado nas eleições de 2018. Representando cerca de 30% dos eleitores, os evangélicos já são cortejados por diversos adversários do presidente, entre eles Sergio Moro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Logo após a aprovação do nome de André Mendonça pelo Senado para a vaga de ministro do STF, Bolsonaro prometeu, se reeleito, indicar mais dois nomes evangélicos para a Corte. “Se eu for candidato e for reeleito, a gente bota mais dois no início de 2023 lá [no Supremo]”, disse o presidente a apoiadores. O próximo presidente será responsável por indicar os substitutos para as vagas de Ricardo Lewandowski e Rosa Weber, que em 2023 completam 75 anos de idade, limite para a aposentadoria compulsória.
"O presidente acena para esse grupo para estancar uma fuga de apoiadores descontentes com o casamento com o Centrão e com o afastamento do governo nos últimos meses das pautas ideológicas", admitiu um assessor palaciano.
Em 2018, Bolsonaro recebeu cerca de 70% dos votos dos eleitores evangélicos no segundo turno. Fernando Haddad, candidato derrotado do PT, recebeu cerca de 30%.
Por eleitor ideológico, Bolsonaro se afasta do presidente da Anvisa
Ainda como forma de acenar aos seus eleitores mais ideológicos, integrantes do governo admitem que o presidente Bolsonaro se afastou do presidente da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antônio Barra Torres. O descontentamento de Bolsonaro com Barra Torres cresceu principalmente depois de decisões contrárias ao entendimento do governo em relação ao passaporte da vacina e à aprovação do imunizante da Pfizer para crianças de 5 a 11 anos no último mês. Posteriormente, a Anvisa ainda viria a aprovar o uso da Coronavac em crianças a partir dos 6 anos.
O primeiro desgaste entre Bolsonato e Barra Torres veio depois que a Anvisa recomendou que o governo adotasse chamado passaporte da vacina para a entrada de estrangeiros no Brasil. A exigência acabou sendo vetada pelo presidente, que criticou publicamente a agência.
"Eu vejo o ministro Gilson Machado [Turismo], que não está presente aqui, trabalhando com o turismo. Ninguém tem o que nós temos. Estamos trabalhando agora com a Anvisa, que quer fechar o espaço aéreo. De novo, porra? De novo vai começar esse negócio?", declarou Bolsonaro.
Após o veto de Bolsonaro, o ministro Luís Roberto Barroso, do STF, determinou que a exigência do comprovante vacinal fosse adotada no Brasil. De acordo com aliados do Planalto, a decisão da Corte acabou liberando Bolsonaro para fazer mais acenos a sua base, que é crítica ao documento e aos ministros do Supremo.
Outro ponto que aumentou a crise com a Anvisa foi a aprovação da agência para o uso do imunizante da Pfizer contra Covid-19 para crianças de 5 a 11 anos no Brasil. Após a liberação, Bolsonaro prometeu divulgar os nomes dos técnicos responsáveis pela liberação da vacina. Sobre os episódios, o chefe do Palácio do Planalto afirmou que está "impossível" conversar com Barra Torres.
"Não vou falar mais de Anvisa aqui porque fechou o diálogo. Fechou o diálogo. É impossível conversar mais ali com o presidente da Anvisa. Ele tem a opinião dele, tem mandato, e continua lá. Boa sorte para ele, tomara que ele acerte. Mas, quando se fala em vacinar crianças, isso é uma coisa que mexe conosco", disse Bolsonaro durante uma de suas lives semanais.
No momento de maior tensão, Barra Torres divulgou carta aberta em que pediu que Bolsonaro se retratasse com a Anvisa ou determinasse “imediata investigação policial” sobre a agência. A carta foi divulgada no início de janeiro, após o presidente questionar os interesses que estariam por trás da liberação das vacinas. “O que está por trás disso? Qual o interesse da Anvisa por trás disso aí? Qual o interesse daquelas pessoas taradas por vacina? É pela sua vida, pela sua saúde?”, questionou Bolsonaro.
Posteriormente, Bolsonaro negou ter acusado o presidente da Anvisa de corrupção e disse ter considera que a carta era "agressiva".
Barra Torres foi indicado para a presidência da Anvisa por Bolsonaro e, posteriormente, teve seu nome aprovado pelo Senado. O seu mandato como presidente da Anvisa vai até dezembro de 2024, por isso não pode ser demitido por Bolsonaro.
Antes da crise, o presidente da Anvisa mantinha proximidade com Bolsonaro e diversas vezes fazia aparições ao lado do presidente. Para interlocutores do Planalto, Barra Torres defende uma agenda oposta da que Bolsonaro defende para este ano eleitoral.
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