O lançamento simbólico da pré-candidatura do presidente Jair Bolsonaro (PL) neste domingo (27) foi marcado por falas acerca de algumas realizações do governo e críticas veladas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e até ao ex-juiz Sérgio Moro (Podemos), ambos pré-candidatos à Presidência da República.
A fim de evitar punições da Justiça Eleitoral por uma eventual campanha antecipada, Bolsonaro, ministros e quem mais usou a palavra para falar aos eleitores, evitou tornar a solenidade em uma campanha eleitoral. Oficialmente, o evento, chamado de "Movimento Filia Brasil", teve por finalidade filiar quadros políticos para as eleições de 2018.
Contudo, não faltaram declarações com cunho eleitoral e referências à disputa que ele terá no pleito deste ano. Bolsonaro, por exemplo, falou que o "inimigo" do Brasil não é "externo", mas "interno". Segundo ele, não é uma luta da "esquerda contra a direita", mas "do bem contra o mal". "E nós vamos vencer esta luta", declarou.
O presidente procurou, no entanto, deixar claro o intuito de não transparecer que o evento é o lançamento de uma pré-campanha. "Aqui não é local de fazer campanha para ninguém. Todos aqui têm suas obrigações, sabem das suas responsabilidades e se apresentam para mais uma nova missão, de representar cada um de vocês", disse.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que atua como coordenador da campanha presidencial à reeleição, disse que os eleitores "têm a verdade" ao lado e que não seria "um mentiroso de nove dedos, nem um traidor" que conseguiria "enganar" o brasileiro "como fizeram no passado". A fala é uma referência a Lula e a Moro, que é chamado de "traidor" entre aliados do presidente.
Bolsonaro critica pesquisas eleitorais e afasta "golpe"
Ao longo de seu discurso, Bolsonaro fez críticas veladas às pesquisas eleitorais. Boa parte delas o aponta em segundo lugar, atrás de Lula, e sem fazer menção a um instituto ou pesquisa em específico, ele declarou que "uma pesquisa mentirosa publicada mil vezes não fará um presidente da República".
O clima interno no governo é de desdém em relação às pesquisas eleitorais. O núcleo duro de Bolsonaro faz, inclusive, cálculos sobre as chances de ele ser reeleito ainda em primeiro turno. Houve, contudo, o reconhecimento de que Bolsonaro precisaria se afastar de assuntos polêmicos para reduzir sua rejeição junto ao eleitorado e crescer nas pesquisas.
Não à toa que, embora não confiem plenamente nas pesquisas, os coordenadores eleitorais de Bolsonaro comemoram nos bastidores o o recente crescimento do presidente nas pesquisas eleitorais. É um dos motivos pelos quais o núcleo político e os principais aliados políticos pregam que ele se afaste de assuntos polêmicos, como críticas a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
Mesmo após o ministro Alexandre de Moraes, do STF, bloquear o aplicativo Telegram e irritar a base eleitoral do presidente, Bolsonaro evitou "esticar a corda". Neste domingo, ele disse que, "por vezes", "embrulha o estômago ter que jogar dentro das quatro linhas".
"Mas eu jurei — e não foi da boca para fora — respeitar a Constituição e aqueles que estão ao meu lado, todos, em especial os 23 ministros, eu digo-lhes: 'vocês têm a obrigação de, juntamente comigo, fazer com que quem esteja fora das quatro linhas seja obrigado a voltar para dentro das quatro linhas'", declarou Bolsonaro.
Na sequência da fala, ele afastou qualquer associação de um possível "golpe" caso não vença as eleições. Quando Bolsonaro criticou as urnas eletrônicas e o posicionamento contrário de ministros do STF ao debate do voto impresso auditável, ele foi acusado por opositores de que não respeitaria o resultado das urnas. Tal hipótese foi rejeitada por ele.
Inclusive, Bolsonaro defendeu que seu governo atua de forma contrária a um governo ditatorial. "Geralmente, as ditaduras quase sempre começam no poder Executivo. Eu nunca vi um Legislativo ou Judiciário dar golpe. Sempre no mundo afora os golpes vêm pelo Executivo e primeiro se desarma a população de bem, o nosso governo age na contramão disso", ponderou.
O presidente disse que seu governo não busca censurar o povo ou a mídia brasileira e ressaltou não ter a intenção de desarmar a população. "Com o que tínhamos em legislação aprovada, ampliamos a posse e porte de arma de fogo para o cidadão de bem", afirmou.
Corrupção, segurança pública, emprego e ações do governo: o que foi dito
Com um discurso muito improvisado, segundo admitiu o próprio senador Flávio Bolsonaro, o presidente da República pouco falou sobre os esforços do governo em geração de emprego, a vacinação contra a Covid-19 e outras realizações do governo, como era previsto por aliados. "Para variar, o nosso amado presidente, meu pai, quebrou todos os protocolos. Estava tudo organizado, mas se não for assim, do jeito dele, com o coração dele, as cosias não dão certo", disse o filho.
No entanto, algumas falas foram ditas por Bolsonaro sobre alguns assuntos característicos em uma campanha eleitoral. O presidente falou sobre a segurança pública, ao fazer acenos sobre a violência, que, segundo ele, está em queda no Brasil. Nesse momento, ele dividiu os méritos com os governadores e seus secretários de segurança pública, e elogiou o trabalho feito por policiais militares e policiais civis. Também enalteceu a Polícia Federal (PF) e a Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Sem falar sobre a vacinação contra a Covid-19 e os imunizantes comprados com recursos da União, Bolsonaro comentou sobre o brasileiro ter sentido o "gosto da ditadura" ao longo da pandemia. Ele fez críticas veladas a governadores que "tiraram direito até de ir e vir" e "obrigaram" o povo a "ficar em casa". "Muitos informais trabalhavam ao longo do dia para levar um prato de comida a noite para sua casa", comentou. Ele disse, no entanto, que lamenta todas as mortes.
Bolsonaro sugeriu que a crise da pandemia foi superada, mas ponderou que "outra apareceu", em referência à guerra na Ucrânia. "O mundo está conectado. Nós sofremos aqui o que se faz há 10 ou 20 mil quilômetros de distância. As consequências são para todos", disse. Ele não comentou os esforços adotados pelo governo para superar o momento econômico, como o lançamento do pacote bilionário de estímulo ao consumo.
O presidente falou, porém, sobre algumas pautas defendidas pelo governo, a exemplo da mineração em terras indígenas, pauta em debate no Congresso. "Vejo irmãos indígenas na minha frente que querem e clamam para que o Congresso aprove um projeto de lei de modo que os liberte dentro da sua própria terra", disse, em referência a alguns apoiadores que usavam adornos indígenas. "Eles querem produzir, não querem ser tutelados pelo Estado", acrescentou.
Bolsonaro também elogiou algumas ações de "libertação" adotadas pelo Estado ao longo de sua gestão, como o Pix, meio de pagamento eletrônico instantâneo e gratuito oferecido pelo Banco Central. "Olha a liberdade do Pix, quem diria. Criou-se mais, dezenas de milhões de microempresários no Brasil", comemorou. Ele também falou sobre a redução de 25% no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e o perdão de dívidas de estudantes com o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) a 2,7 milhões de jovens.
O presidente também destacou o Auxílio Emergencial, benefício que foi pago durante a pandemia, e o Auxílio Brasil, classificado por ele como "mais compatível com a necessidade de sua população". Ambos os programas sociais serão citados ao longo do ano como os grandes carros-chefes do governo na campanha à reeleição.
Ao falar sobre corrupção, Bolsonaro sinalizou que, diferentemente de governos anteriores, as estatais em sua gestão não operaram com dívidas oriundas de corrupção. "Só o endividamento da Petrobras e do BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] na casa de R$ 1,4 bilhão daria para fazer 100 vezes a transposição do Rio São Francisco. Alguns foram contra a gente, ora é o sistema, ora são as pessoas conhecidas, ora é a imprensa, que estão descontentes conosco", disse.
O ministro da Cidadania, João Roma, pré-candidato ao governo da Bahia, falou antes de Bolsonaro e destacou que a gestão zerou a fila dos programas sociais, enquanto governos anteriores, segundo ele, "faziam com que as pessoas ficassem dependentes". Ele também ressaltou os R$ 400 pagos pelo Auxílio Brasil, o que triplicou o benefício em relação ao Bolsa Família.
O ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, foi outro que usou a palavra para enaltecer os feitos do governo. Em sua fala, disse que o governo Bolsonaro constrói um caminho a um "salto de prosperidade" com emprego e sem corrupção. "Por isso, estou orgulhoso de fazer parte dessa história e vê-la sendo construída", declarou.
PL filia aliados e Bolsonaro faz acenos aos partidos da base
Para desassociar o evento do lançamento de pré-candidatura — embora a solenidade contou com a abertura a eleitores e apresentou o slogan de campanha "O capitão do povo" —, o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, usou a palavra para anunciar algumas filiações. Seu partido filiou os ministros da Cidadania, João Roma, e da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marcos Pontes.
Deputado federal licenciado, Roma se desfiliou do Republicanos para se filiar ao PL. Ele é pré-candidato ao governo da Bahia, mas interlocutores do governo não descartam que ele lance candidatura ao Senado ou à Câmara pelo estado. Já Marcos Pontes vai se lançar deputado federal por São Paulo.
Outro ministro que tinha a filiação esperada para este domingo era o do Turismo, Gilson Machado, que vai ser candidato ao Senado por Pernambuco na chapa com o prefeito de Jaboatão dos Guararapes (PE), Anderson Ferreira (PL).
Quem também se filiou ao PL foi o senador Eduardo Gomes (TO), líder do governo no Congresso, que deixou o MDB para ingressar ao mesmo partido de Bolsonaro. Ele é um dos nomes cotados nos bastidores para assumir o Ministério do Trabalho e Previdência, atualmente comandado por Onyx Lorenzoni (PL), pré-candidato ao governo de Rio Grande do Sul.
Em sua fala, Bolsonaro fez acenos aos partidos aliados. Citou o presidente do PL, Costa Neto, que está a frente do "movimento" junto a outros partidos. "Com o PP, o Republicanos e o [Partido] Trabalhista [Brasileiro, PTB], entre outros", disse. Segundo o presidente, os partidos estão unidos em busca para "somar forças para bem administrarmos o nosso Brasil".
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