A prisão do pastor Milton Ribeiro, ex-ministro da Educação, não mudou o humor do governo federal e da base governista, que rechaçam a possibilidade de o caso atingir a pré-candidatura à reeleição do presidente Jair Bolsonaro (PL) e a maioria dos aliados políticos. No Palácio do Planalto, integrantes do núcleo político apontam que não há um clima de desespero nem preocupação, muito menos em relação à possibilidade de instalação de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) para investigar o Ministério da Educação (MEC).
É evidente que o governo e seus aliados não desejam a instalação de uma CPI e prefeririam que a prisão não tivesse dado "munição" para a oposição atacar o governo. Porém, Bolsonaro e seus coordenadores de campanha avaliam que há mais ganhos do que danos para o governo e a pré-candidatura presidencial.
A análise no Planalto é de que a prisão amplia a polarização entre Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e cria uma cortina de fumaça propícia para o governo avançar com o planejamento da ampliação do vale-gás e do Auxílio Brasil para R$ 600, além da criação de um auxílio aos caminhoneiros. Para governistas, todo esse cenário surge sem desgastar o presidente e toda a base, ainda mais após Ribeiro ter sido solto por decisão do desembargador Ney Bello, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1).
Para o governo, o próprio Lula esvaziou o discurso da oposição de uma suposta corrupção cometida por Milton Ribeiro ao questionar nesta quinta-feira (23) se há alguma prova que confirme algum roubo cometido pelo ex-ministro da Educação. Em contrapartida, as acusações feitas por oposicionistas sobre corrupção alimentaram a retórica do governo para atacar o petista, cujos escândalos do passado – do mensalão à Lava Jato – são bem conhecidos de todos.
A estratégia do governo em relembrar investigações, denúncias e condenações judiciais contra Lula e aliados petistas foi alinhada ainda na quarta-feira (22) entre Bolsonaro e integrantes de seu núcleo político. Entre eles, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que atua na coordenação eleitoral da pré-campanha presidencial.
De Geddel a Dilma e Lula: como o governo rebateu a prisão de Milton Ribeiro
Do ponto de vista do marketing político, a estratégia do governo para rebater a oposição é partir para o enfrentamento ao não aceitar acusações de corrupção sobre Ribeiro e destacar que ele não faz mais parte do governo. E sempre que for atacado, a base política vai lembrar que ele foi demitido, é investigado, e que "corrupção de verdade" aconteceu nos governos do PT.
Para essa estratégia, o governo entende que há ampla documentação de imagem, fotografia e processos que reforçam os escândalos nas gestões petistas. A estratégia em rememorar episódios de corrupção nas gestões Lula e da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) vão desde a citação de casos notórios à associações mais recentes.
O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), vice-líder do partido na Câmara, lançou em suas redes sociais um vídeo de 2 minutos e 20 segundos em que fala sobre diferentes casos de corrupção envolvendo petistas e aliados. Ele cita que o ex-ministro Geddel Vieira Lima (MDB), condenado no caso dos R$ 51 milhões em espécie não declarados à Receita Federal achados em um apartamento, está solto e que seu grupo político apoia Lula nas eleições da Bahia neste ano.
Eduardo comenta títulos de reportagens que informam sobre prisões de ex-ministros de Dilma e destaca que não dá nem para "começar a comparar" uma suposta corrupção cometida no governo Bolsonaro com os escândalos de corrupção que resultaram em condenações nas gestões petistas. "O [ex-]ministro Milton está sendo investigado, foi preso preventivamente. Ainda tem um processo que vai correr, onde ele vai ter a chance de se defender", diz.
O senador Flávio avalia que há uma clara tentativa da oposição em usar eleitoralmente a prisão de Ribeiro para tentar colocar Bolsonaro "na mesma prateleira" de Lula e apontou que isso é "impossível". "Lula é o maior ladrão da história do nosso país", declarou. O líder do PL no Senado destaca, ainda, que a prisão do ex-ministro sugere que o governo não interfere nas investigações da Polícia Federal (PF) e que isso era diferente nas gestões petistas.
"Olha a diferença de postura. Enquanto o Bolsonaro afasta o [ex] ministro, a Polícia Federal faz a investigação isenta, independente, sem interferência. Os governos passados, como aconteceu no caso da Dilma, ela tenta promover o Lula a ministro para que ele não fosse preso por corrupção, enquanto no governo federal, quando há um caso isolado de suspeita de alguma coisa, a pessoa tem que ser investigada e ela tem que provar sua inocência", disse Flávio em comunicado divulgado à imprensa.
Que outras estratégias foram incorporadas pelo governo e aliados
O posicionamento de que a investigação sugere que o governo não interfere na PF é endossada pelo deputado federal Sanderson (PL-RS), vice-líder do governo na Câmara. Policial federal de carreira, ele destaca que isso prova que o governo combate a corrupção e que a corporação tem "autonomia operacional e funcional" e isso é "rigorosamente respeitado e valorizado cada vez mais".
"A ação policial é a exata prova de que, no governo Bolsonaro, o combate à corrupção é prioridade, doa a quem doer. Agora, é imperioso termos a responsabilidade para não condenar ninguém de forma antecipada. Por isso, acho fundamental e prudencial aguardar o resultado das investigações para, só depois, fazermos um juízo de valor", destacou o parlamentar em comunicado à imprensa.
Nesta quinta, a PF informou ter aberto um procedimento interno para apurar se houve eventual interferência a favor do ex-ministro. O delegado que comandou a operação teria afirmado em mensagens a colegas da PF que houve "interferência na condução da investigação" e dito não ter "autonomia investigativa para conduzir o inquérito deste caso com independência e segurança institucional".
A decisão do juiz federal Renato Borelli em prender Milton Ribeiro desencadeou críticas do governo e da base sobre um suposto ativismo judicial. No Planalto, a análise é de que a decisão do magistrado segue uma ideologia política.
“O juiz que decretou a prisão foi o mesmo que no ano passado de uma sentença, uma liminar, que cada vez que alguém me visse na rua sem máscara ele iria me multar em R$ 2 mil”, afirmou o presidente Bolsonaro em transmissão ao vivo nas redes sociais, nesta quinta-feira (23). Segundo ele, o juiz já abriu várias ações “contra o governo”. “Não é competência dele, todas [as ações] foram arquivadas”, disse.
O deputado Filipe Barros (PL-PR) republicou em seu Twitter um comentário de André Porciuncula, ex-Secretário Nacional de Incentivo e Fomento à Cultura, em que sugere que a decretação de prisão preventiva de Ribeiro "por causa de uma venda legal de carro" denota um ativismo judicial do juiz. "É uma daquelas insanidades que só acontece porque o juiz tem certeza da total impunidade ao atuar fora do que a lei autoriza. A ausência de limites para o ativismo judicial é o maior problema da nossa democracia", critica.
Aliado do governo, o pastor Silas Malafaia, líder da Igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo, cita em um vídeo a decisão do desembargador Ney Bello, que concedeu o habeas corpus ao ex-ministro do MEC, e comenta que não há no mandado de prisão expedido pelo juiz Borelli nenhuma referência sobre a motivação.
"Não existe prisão sem prévia e fundamentada justificativa. O próprio órgão acusador, o Ministério Público Federal, dá parecer contrário às prisões. É uma vergonha, foi tentativa para atingir o presidente Bolsonaro, o resto é conversa fiada", declarou. "Querer comparar corrupção de governo Lula com governo Bolsonaro só pode ser piada. O PT, só de acordos de devolução de dinheiro roubado nos governos, são R$ 22 bilhões", acrescentou.
Qual é a estratégia para rebater a abertura de uma CPI do MEC
O governo e sua base também traçaram uma estratégia para rebater a defesa da oposição pela instalação de uma "CPI do MEC" no Senado. O líder do governo no Senado, Carlos Portinho (PL-RJ), rechaça a possibilidade de isso ocorrer ao citar que há outras três CPIs na fila no aguardo de suas criações.
Uma das CPIs citadas por Portinho foi protocolada por ele próprio. Trata-se da proposta de uma comissão para investigar problemas no Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e os motivos que levaram 2 mil escolas a estarem inacabadas, a grande maioria, segundo ele próprio, no período de 2006 a 2016, ou seja, nos governos petistas.
O deputado Marco Feliciano (PL-SP), vice-líder do governo no Congresso e líder da Igreja Assembleia de Deus Catedral do Avivamento, critica a proposta da oposição de CPI do MEC e aponta que ela tem o objetivo de evitar a instalação da CPI da Petrobras, articulada pela base na Câmara.
"Com uma diferença: o que tenha ocorrido no MEC já está sendo investigado pelas autoridades. E o lucro pornográfico da Petrobras às custas do trabalhador brasileiro, quem está investigando?", comentou no Twitter.
A estratégia da oposição em pedir a CPI do MEC permitiria a base na Câmara avançar com a instalação da CPI da Petrobras, defende o deputado federal Coronel Tadeu (PL-SP), vice-líder do partido na Câmara. "Deixa eles tentando cavar defunto onde não tem enquanto isso a gente vai desenterrando aqueles que sabem que tem. Isso na minha ótica fica muito mais legal para a direita, para o presidente e o governo porque a gente vai voltar a bater com fatos", disse à Gazeta do Povo.
Tadeu defende que a CPI da Petrobras seria relevante para "levantar muita coisa da época do PT. "Tem que aproveitar bem esse espaço para detonar. Vamos trazer a Graça Foster [ex-diretora da estatal], o [Sérgio] Gabrielli [ex-presidente da petroleira] e fazer contarem tudo sobre Pasadena e desenterrar processos dos navios sonda, que foi construído para a Petrobras e não navegou um único dia. Dá para reverter aquilo que fizeram na [CPI] da Covid, mas fazer com propriedade", destaca.
"Vamos devolver o Renato Duque [ex-diretor da Petrobras] para a cadeirinha da inquisição e perguntar por que resolveu devolver R$ 120 milhões e se não tem mais nada guardado", acrescenta.
Como a prisão de Milton Ribeiro ajuda a avançar a ampliação de auxílios
O governo entende que sai beneficiado do caso Milton Ribeiro também à medida em que a oposição gasta energia à toa em encampar o pedido de instalação da CPI do MEC. Para o Planalto, isso ajuda a avançar no debate de ampliar o Auxílio Brasil dos atuais R$ 400 para R$ 600. Discute-se nos bastidores que a forma de operacionalizar isso seja feito pela desistência da proposta de emenda à Constituição (PEC) que compensa os estados que zerarem o ICMS sobre o gás de cozinha e o óleo diesel.
A proposta de ampliar o Auxílio Brasil para R$ 600 foi confirmada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes ao site Poder 360. Porém, o chefe da equipe econômica não deu maiores detalhes sobre a engenharia financeira para financiar. A proposta vinha sendo discutida nos bastidores e a prisão do ex-ministro da Educação acelerou os diálogos entre os núcleos político e econômico do governo.
O núcleo político de Bolsonaro aponta que o problema mais urgente para se resolver pelo governo e pelo Congresso é encontrar a melhor forma de reduzir o custo de vida do brasileiro e manter a dignidade aos mais pobres. Por isso, interlocutores palacianos admitem que o debate para ampliar o Auxílio Brasil para R$ 600 vem em boa hora.
A princípio, os recursos sairiam dos R$ 29,6 bilhões que compensariam os estados que zerarem as alíquotas do diesel e do gás de cozinha. "O governo está com a energia toda focada nesse debate. Existe esse diagnóstico de que precisa fazer alguma coisa para dar suporte à alta da inflação em um debate que vai ser feito junto com o Congresso", afirma um interlocutor palaciano.
Além do Auxílio Brasil de R$ 600, o governo também vai manter o debate sobre a ampliação do vale-gás e a criação do auxílio aos caminhoneiros, apesar da ideia de um "voucher" aos transportadores rodoviários de carga desagradarem a categoria.
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