Em meados da década de 2010, uma onda de moralização da política tomou conta do Brasil, engajando a sociedade civil, a imprensa e autoridades do poder público. A intolerância com a corrupção teve muitos resultados concretos: a condenação de dezenas de envolvidos em desvios, a recuperação de bilhões de reais para os cofres públicos e uma mudança no perfil de casas legislativas pelo país.
Mas esse entusiasmo contra a corrupção foi prematuramente aniquilado por instâncias de todos os poderes da República. Destruiu-se paulatinamente o legado da operação Lava Jato com decisões do Supremo e alguns projetos de lei aprovados no Congresso e sancionados pelo Planalto. Criminosos se tornaram vítimas, e os procuradores e juízes responsáveis por um trabalho corajoso e histórico contra os corruptos acabaram sendo acusados de abuso de poder, senão de serem eles mesmos criminosos.
Mais do que isso, a narrativa sobre a corrupção sofreu um desvirtuamento na opinião pública. O que se considerava inaceitável de forma quase unânime é hoje relativizado em nome de preferências políticas. É comum ouvir que a necessidade de derrotar certos grupos políticos justifica a tolerância com a corrupção, como se os corruptos fossem a única alternativa real ao triunfo de ideias adversárias.
Foi essa triste mudança repentina de paradigma que levou a Gazeta do Povo a lançar uma campanha, em 2021, para recordar a população brasileira sobre a importância do combate à corrupção. As eleições de 2022 serão um teste de memória para o brasileiro. Como afirmamos em algumas ocasiões, a resposta contra a corrupção não veio de cima para baixo, mas é preciso demonstrar às autoridades que ela pode vir de baixo para cima.
Uma vitória do povo seria eleger um Congresso que, nos próximos anos, legislasse para reverter decisões do Judiciário que minaram o combate à corrupção. É preciso, por exemplo, restringir o direito ao foro privilegiado, que não pode mais contemplar todos os políticos. Também é necessário reverter pela via legislativa a decisão do STF contra a prisão após condenação em segunda instância. A aprovação de emendas constitucionais e leis nesse sentido dependerá, é claro, de uma pressão constante da sociedade civil, que precisará recuperar algo do fervor por essa pauta que marcou os meados da década de 2010.