O desenvolvimento da infraestrutura é indispensável para que o Brasil possa crescer de forma duradoura, a taxas mais elevadas e sem gerar pressões inflacionárias. É fundamental para a atividade produtiva, a atração de investimentos e turistas e o bem-estar dos cidadãos.
Entendemos que, nessa área, o papel adequado para o Estado é o de planejar e regular. Repassar ao setor privado a administração da infraestrutura nada mais é que aplicar o princípio da subsidiariedade e reconhecer o papel da iniciativa privada como o verdadeiro propulsor do desenvolvimento.
Durante muito tempo, o país ficou preso ao conceito ultrapassado de que o Estado deve ser o principal – ou mesmo o único – provedor de infraestrutura. Com muito atraso, essa noção felizmente foi sendo abandonada e o país foi, aos poucos, abrindo espaço para o setor privado.
As primeiras concessões de rodovias datam de 1993, no governo de Itamar Franco. O governo FHC avançou com as privatizações nas áreas de energia e telecomunicações, além de concessões de ferrovias. O governo Dilma Rousseff deu início às concessões de aeroportos e também fez arrendamentos de terminais portuários. E foi só recentemente, já na gestão de Jair Bolsonaro, que o país decidiu abrir de fato o setor do saneamento para a iniciativa privada.
Os últimos anos têm demonstrado o que a mudança de mentalidade do poder público pode fazer pela infraestrutura do país. A chegada de um governo que efetivamente acredita na iniciativa privada como motor da economia trouxe uma transformação nesse campo, com a realização de leilões de concessão que vão resultar em algumas centenas de bilhões em investimentos em portos, aeroportos, rodovias e ferrovias nos próximos anos.
No caso das estradas de ferro, outro acerto foi o novo marco regulatório, com a adoção do modelo de autorização, mais simples e rápido que as concessões. Apenas nos seis primeiros meses, o governo recebeu cerca de 80 pedidos de autorização para a construção de ferrovias, com investimento potencial superior a R$ 240 bilhões.
Desde o fim do governo petista, em 2016, o Brasil evoluiu bastante na modelagem de concessões de infraestrutura. O caso dos aeroportos é ilustrativo, com a remoção de obstáculos como a participação obrigatória da estatal Infraero e a adoção do sistema de blocos com vários aeroportos, misturando “joias da coroa” com terminais menores – uma herança do governo Temer que a gestão Bolsonaro soube aproveitar.
A primeira razão para a abertura ao setor privado é o reconhecimento de que o Estado não tem capacidade nem agilidade para melhorar a infraestrutura na velocidade desejada. Muito menos dinheiro. Décadas atrás, quando o Orçamento público ainda não estava completamente sufocado por gastos obrigatórios (como folha de pessoal e aposentadorias), os recursos – mais abundantes que os atuais – com frequência eram desperdiçados por corrupção ou falhas de planejamento ou execução, com monumentos ao desperdício multiplicando-se pelo país. Nos últimos anos, as verbas disponíveis não dão conta nem mesmo de manter as condições do que já existe.
As rodovias são exemplo disso. Nos últimos anos, o investimento público não tem sido suficiente nem para manutenção e adequações, isto é, para evitar que as estradas piorem. Fruto da compressão dos gastos discricionários, em meio ao avanço dos obrigatórios, o Orçamento da União de 2022 reservou originalmente apenas R$ 4,2 bilhões para investimentos nas rodovias sob gestão federal, sendo que o ideal seria algo próximo de R$ 12,3 bilhões, estima a Confederação Nacional do Transporte (CNT).
De 2016 a 2020, aponta a CNT, o setor público – em todas as esferas – investiu em média R$ 163 mil por quilômetro sob sua gestão, ao passo que o setor privado desembolsou mais que o dobro, cerca de R$ 381 mil por quilômetro concedido.
O resultado dessa discrepância nos investimentos é que, dos 24 mil quilômetros de estradas concedidas ao setor privado, 74,2% têm estado bom ou ótimo, segundo a pesquisa mais recente da CNT, de 2021. Nas rodovias sob gestão pública, que ainda são a grande maioria e somam 85 mil quilômetros, somente 28,2% estão em bom ou ótimo estado.
Apesar das escolhas acertadas feitas pelo governo nos últimos anos, números como os das rodovias mostram que ainda há muito espaço para avançar. O Brasil está apenas começando a recuperar o tempo perdido. O investimento em infraestrutura de transporte ainda precisa crescer – mais que dobrar em relação ao atual, como proporção do PIB – para que o Brasil tenha uma rede considerada moderna daqui a duas décadas.
E um desafio já surge no horizonte: o esgotamento dos empreendimentos mais lucrativos e, portanto, atraentes à iniciativa privada – os chamados “filés”, no jargão do setor. Parte do que não foi leiloado nas rodovias, por exemplo, são ativos potencialmente deficitários, que dificilmente atrairiam interessados num modelo convencional de leilão. Cabe ao governo encontrar soluções adequadas, dentro de um leque de opções que inclui concessões em blocos (que reúnam ativos lucrativos, os “filés”, com os “ossos”, deficitários) e parcerias público-privadas, entre outras possibilidades.
O país ainda tem de lidar com a “herança maldita” das concessões devolvidas pelas empresas privadas. Baseados em premissas irrealistas de que o país continuaria crescendo a taxas elevadas mesmo sem fazer reformas estruturantes e anabolizado por despesas públicas insustentáveis, editais da era petista superestimaram a demanda futura – que, frustrada ano após ano, gerou receitas muito inferiores às projetadas e inviabilizou os investimentos previstos em contrato.
Se o governo, além de desenhar bons editais e contratos, souber ganhar a confiança do investidor com estabilidade institucional, segurança jurídica, saúde fiscal e um ambiente de negócios realmente amigável ao investidor, o país será amplamente beneficiado.