Um país próspero depende de mudanças profundas na estrutura administrativa do governo e no sistema tributário.| Foto: Marcelo Andrade/Arquivo Gazeta do Povo
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O desenvolvimento do Brasil passa necessariamente pelo setor privado. Para investir no país, o empresário precisa de um ambiente de negócios amigável, no qual tenha clareza sobre os custos atuais e futuros de sua atividade, entre eles os impostos. E a carga de tributos é reflexo direto do tamanho e da eficiência do Estado.

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Um país próspero, portanto, depende de mudanças profundas na estrutura administrativa do governo e no sistema tributário. Não haverá crescimento duradouro sem essas reformas. Como, aliás, bem prova o desempenho errático da nossa economia neste século.

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Não há como reduzir o peso do Estado sem limitar suas principais despesas. Nesse sentido, um primeiro passo foi dado com a aprovação da reforma da Previdência, em 2019. Embora pudesse ter sido mais eficiente, ela já ajuda a conter o crescimento das despesas do INSS com inativos e seus pensionistas: em 2021, elas chegaram a 8,2% do Produto Interno Bruto (PIB), o menor nível desde 2016. Mas é preciso ir além e atacar também o gasto com os servidores da ativa.

A despesa com pessoal do governo está diminuindo em decorrência de medidas administrativas como o corte de cargos comissionados, a queda na reposição de servidores aposentados e o avanço na digitalização de serviços públicos. No ano passado, o gasto com o funcionalismo federal foi de 3,8% do PIB, o menor em pelo menos 24 anos, ligeiramente abaixo dos patamares de 2013 e 2014. Mas ainda há o que enxugar.

A começar porque a despesa primária da União segue acima da receita líquida (excluídas as transferências a estados e municípios). Isto é, o Estado continua não cabendo na arrecadação, que é sabidamente elevada. O exemplo de estados como Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, que até há pouco mal conseguiam pagar os salários em dia, ilustra o que ocorre quando os governos resistem a pôr as contas em ordem. Por outro lado, um Estado que administra sua folha com racionalidade traz confiança, que se reflete em investimentos, crescimento econômico, arrecadação e mais margem para investir e contratar quando necessário.

Mas a reforma administrativa não é questão apenas de finanças públicas. Há também a necessidade de adequar a remuneração dos servidores à realidade do país. Segundo estudo do Banco Mundial, o poder público brasileiro se destaca não pela quantidade de funcionários, mas pelos salários, em especial na esfera da União e, em menor grau, nos estados. Conforme a instituição, servidores federais ganham em média 96% a mais que os trabalhadores da iniciativa privada que atuam em funções equivalentes, a maior discrepância de uma amostra de 53 países.

A reforma administrativa, além disso, teria efeitos salutares para o próprio funcionamento da máquina e a prestação de serviços ao público. Um deles é a definição de diretrizes para a avaliação de desempenho dos servidores. Dessa forma, um desempenho insatisfatório por vários períodos pode resultar na demissão desse empregado, o que hoje só ocorre por decisão judicial transitada em julgado ou processo administrativo disciplinar.

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A proposta que está no Congresso também prevê, corretamente, o desligamento de servidores de cargos obsoletos e a extinção de uma série de vantagens, como férias superiores a 30 dias, licença-prêmio, progressão baseada exclusivamente em tempo de serviço e aposentadoria compulsória como modalidade de punição.

A outra reforma primordial é a tributária. Nosso sistema de impostos, um dos piores do mundo, está entre os maiores obstáculos à atividade empreendedora e à atração de investimentos. E gera um imenso desperdício de tempo e dinheiro não só dos contribuintes, mas do próprio governo, que tem de dedicar pessoas e verbas para enfrentar sonegação e evasão fiscal e infindáveis disputas na Justiça.

Em países com um sistema tributário civilizado, esses recursos seriam direcionados a eficiência, inovação, competitividade. Não por acaso, simplificar os mecanismos de tributação é uma das exigências que o país terá de cumprir para ingressar na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), grupo que fomenta a adoção de boas práticas econômicas e políticas públicas em seus países-membros, que estão entre os mais ricos do mundo.

Na última edição do relatório Doing Business, do Banco Mundial, o Brasil ocupava a 184.ª posição, de 190 países, no quesito facilidade para pagamento de tributos. No tempo gasto com o pagamento de impostos, nosso país era o pior de todos, com 1.501 horas por ano, cerca de cinco vezes a média da América Latina e dez vezes a média dos países da OCDE.

Segundo cálculos do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), União, estados e municípios editaram mais de 443 mil normas fiscais desde a Constituição de 1988 (53 por dia útil, em média), das quais 4,6 mil estão em vigor. Acompanhar as mudanças e se adequar a elas gera uma despesa gigantesca: as empresas brasileiras gastam aproximadamente R$ 181 bilhões por ano em pessoal, sistemas e equipamentos para isso, conforme o IBPT.

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O resultado desse estado de coisas é que o valor envolvido no contencioso tributário – as disputas entre contribuintes e entes da federação – já equivale a pelo menos 75% do PIB brasileiro, segundo o Núcleo de Estudos da Tributação do Insper. Somente o contencioso administrativo federal corresponde a 15,9% do PIB. Nos países pertencentes à OCDE, esse porcentual é de 0,28%, em média. Em países da América Latina, de apenas 0,19%.

Sozinha, a simplificação do sistema tributário já seria um enorme avanço. Porém, uma verdadeira reforma deve ir além disso. É preciso rever a própria estrutura da tributação no Brasil, que onera demais a produção (punindo quem produz) e o consumo (encarecendo produtos e serviços e pesando mais sobre os pobres). O ideal é reduzir esses impostos e deslocar a tributação em direção a patrimônio e renda, em conformidade com a ideia de “justiça tributária”, como fazem os países mais desenvolvidos do mundo.

Infelizmente, nenhuma das reformas em discussão – propostas pelo governo ou pelo Congresso – enfrenta essa questão. As propostas tentam modificar somente um tipo de tributação (sobre o consumo ou sobre a renda, por exemplo), de forma que a estrutura da tributação não seria substancialmente alterada.

Enquanto o país adia a verdadeira reforma e mantém seu sistema tributário pesado e distorcivo, grupos de interesse pressionam Executivo e Legislativo por benesses que possam atenuar os custos de suas atividades.

Assim nascem e se multiplicam os benefícios tributários, que, na tentativa de corrigir determinados problemas, acabam criando distorções na alocação de recursos. Em vez de se guiar pela busca da eficiência, empresários passam a decidir onde e em que investir tendo em vista quais atividades são menos prejudicadas ou mais beneficiadas pelo anacronismo das regras.

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O resultado é a perenização da baixa produtividade, com empresas ineficientes sobrevivendo à custa de desonerações e outras sucumbindo à competição desleal estimulada pelo próprio Estado. Se de um lado abre mão de 4% do PIB todos os anos em benefício de alguns contribuintes, segundo estimativas da Receita Federal, de outro a União compensa essa perda punindo os pagantes regulares, para quem a carga tributária segue elevada.

A busca por um país mais moderno e justo passa necessariamente pelo enfrentamento dessas questões.