Ações contra o crime organizado e proteção a grupos identitários são o foco das propostas de governo dos candidatos à Presidência da República em 2022 no campo da segurança. Um dos consensos entre os principais programas é a necessidade do aprimoramento da inteligência nas operações policiais para o combate ao narcotráfico.
O candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é, entre os candidatos mais conhecidos, o que mais acena para o público das pautas identitárias, enquanto o atual presidente, Jair Bolsonaro (PL), foca nas conquistas do atual governo e na importância da proteção a mulheres e crianças.
Ciro Gomes (PDT) salienta o uso da tecnologia para rastrear e combater o crime organizado, enquanto Felipe D’Ávila (Novo) propõe a desburocratização do sistema de segurança pública. No campo das ideias inusitadas, Pablo Marçal (PROS) quer instituir o programa “Da Cela para a Sala”, que levaria detentos para palestrar em escolas sobre a realidade das prisões.
A candidata Simone Tebet (MDB) ainda não apresentou seu plano de governo e, por isso, não foi incluída nesta reportagem. Confira as principais ideias para a segurança pública dos candidatos que já apresentaram seus programas.
Bolsonaro foca em conquistas do governo e na preocupação com mulheres e crianças
O programa do atual presidente, Jair Bolsonaro (PL), ressalta as conquistas de seu primeiro mandato no campo da segurança e enfatiza a sua preocupação com a violência contra mulheres e crianças.
Para a equipe de Bolsonaro, o tema da segurança é uma questão social de caráter transversal que depende da atenção a diversas esferas da gestão pública. O documento diz que “os riscos ou ameaças à segurança humana podem ser nos âmbitos jurídico, público, alimentar, energético, entre outros”.
“Jair Bolsonaro espera que esse tema prioritário seja consolidado no seu próximo mandato, somando-se com as inúmeras ações já realizadas nesse sentido”, diz o plano, que cita a melhoria nos índices da segurança pública em geral e a preocupação especial com a proteção das mulheres e das crianças por meio dos canais de denúncia que o governo fortaleceu.
“Fruto das ações eficientes e integradas na área da segurança pública, com o aumento de 185% do número de operações policiais realizadas em relação a 2018, o Brasil registrou em 2021 uma queda de 6,5% no número de homicídios em relação ao ano anterior, sendo a menor taxa desde 2011, quando se iniciou a série histórica”, destaca o documento.
O plano do atual presidente enfatiza que “combater a violência contra os mais vulneráveis, como as crianças e as mulheres” foi sua prioridade e continuará sendo. Ele cita o Plano Nacional de Enfrentamento à Violência contra Crianças e Adolescentes, “contra a exploração sexual e violência física, psicológica e institucional”, e o Plano Nacional de Enfrentamento ao Feminicídio, “com o propósito de fortalecer a rede de proteção das mulheres”.
Bolsonaro também menciona números positivos de ações policiais, como a apreensão recorde de cocaína nas rodovias federais em 2021 (40 toneladas), a queda na letalidade policial, que teve redução de 4,2% em 2021 com relação a 2020, e o aumento na apreensão de armas de fogo ilegais.
Outro foco do atual presidente é “fortalecer e garantir a segurança no campo”. “A família do campo e seus bens, assim como sua propriedade, deverá ser objeto de políticas efetivas e ações céleres a fim de garantir sua segurança e liberdade, seja para o pequeno produtor da agricultura familiar, seja para o grande produtor da agropecuária”, diz o plano, que ressalta ainda a queda histórica no número de invasões de propriedades privadas nos últimos quatro anos.
Bolsonaro evoca o direito fundamental à legítima defesa para defender o aumento do acesso às armas. Seu programa fala na “potencialização do exercício da legítima defesa que, por óbvio, autoriza o uso da força para evitar injusta agressão, inclusive com o uso de arma de fogo”. Segundo ele, o acesso às armas de fogo contribui para a “pacificação social e preservação da vida”. “Neste segundo mandato serão preservados e ampliados o direito fundamental à legítima defesa e à liberdade individual, especialmente quanto ao fortalecimento dos institutos legais que assegurem o acesso à arma de fogo aos cidadãos”, afirma.
Lula acena especialmente para grupos identitários
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) promete foco na violência contra grupos identitários. A prioridade das políticas, segundo o programa, serão “a prevenção, a investigação e o processamento de crimes e violências contra mulheres, juventude negra e população LGBTQIA+”.
Outra ênfase de seu programa é a “valorização do profissional de segurança pública”, com “canais de escuta e diálogo com os profissionais, programas de atenção biopsicossocial, e ações de promoção e garantia do respeito das suas identidades e diversidades”.
Lula quer substituir o que chama de “atual modelo bélico de combate ao tráfico”, e afirma que o Brasil “precisa de uma nova política sobre drogas, intersetorial e focada na redução de riscos, na prevenção, tratamento e assistência ao usuário”.
Apesar das pautas caras aos defensores de ideias progressistas, Lula não deixa de prometer combate ao crime organizado. A proposta diz que é “fundamental uma política coordenada e integrada nacionalmente” para reduzir homicídios, por meio de “investimento, tecnologia, enfrentamento do crime organizado e das milícias, além de políticas públicas específicas para as populações vulnerabilizadas pela criminalidade”.
Lula pretende aprimorar o Sistema Único de Segurança Pública, “modernizando estratégias, instrumentos e mecanismos de governança e gestão”, mas não entra em detalhes sobre como faria isso.
Ciro propõe uso de “tecnologias avançadas” de segurança e um melhor mapeamento das zonas mais vulneráveis
O plano do candidato Ciro Gomes fala sobre a importância da “atuação conjunta e articulada das diversas agências que cuidam da segurança pública no país”, e pede o compartilhamento de informações e a coordenação de ações. Na Amazônia, segundo ele, isso é especialmente importante.
Para Ciro, é preciso usar “tecnologias avançadas de gestão do conhecimento, informação, comunicação e rastreamento, incluindo o referente às armas e munições, cuja expansão e uso se encontram fora de controle” para combater o crime organizado. Seu plano diz que um elemento importante do enfrentamento à criminalidade é a investigação das operações financeiras e da lavagem de dinheiro dos grupos criminosos.
É necessário, segundo o plano, “reestruturar as carreiras policiais”, valorizando quem atua diretamente no combate ao crime e em contato com a população. “Os programas de qualificação devem ser aprimorados e disseminados, bem como devem ser implementados programas de atenção à saúde biopsicossocial dos profissionais de segurança pública”, afirma Ciro.
Para o candidato, é importante melhorar o mapeamento de regiões mais inseguras, “de forma a privilegiar as populações mais vulneráveis”. Além disso, diz ele, a política sobre drogas “deve ser redesenhada, partindo de uma abordagem intersetorial de redução de riscos e danos que esteja articulada com justiça, saúde e assistência social”.
Ciro também fala sobre a necessidade de aprimorar a gestão prisional, com o objetivo de “elevar o percentual da população carcerária que venha a se ressocializar”.
O foco da prevenção aos crimes, para Ciro, devem ser as mulheres, os jovens negros e a atenção a “população LGBTQIA+, de forma a enfrentar a discriminação e o racismo estrutural”. É necessário, além disso, “fortalecer os programas de proteção social que atuem na direção da redução da vulnerabilidade social de crianças e adolescentes”, diz o candidato.
Pablo Marçal tem ideias mais inusitadas para segurança; Felipe D’Ávila foca em ações contra o crime organizado e a corrupção
Entre todos os candidatos que já apresentaram seus programas de governo, aquele que trouxe as ideias mais inusitadas para o campo da segurança pública foi, certamente, Pablo Marçal (PROS).
Ele propõe, por exemplo, a instituição do programa “Da Cela para a Sala”, que levaria detentos para palestrar em escolas sobre a realidade das prisões e a importância dos estudos, com o benefício da redução da pena.
Marçal também quer implementar o que chama de “Empresídio”, um programa que permitiria a profissionalização de detentos por meio de parcerias com empresas dentro das unidades prisionais. “Reformataremos e ampliaremos o trabalho carcerário, proporcionando condições ao sistema penitenciário para que a população carcerária possa produzir e ressocializar com uma profissão, inclusive com parcerias com empresas de RH para o retorno de detentos ao mercado de trabalho”, diz o plano.
O coach também quer fazer um “Mapa Brasileiro das Vulnerabilidades Estruturais, Sociais e Criminais (MBVES)”, usando big data para produzir um sistema de alerta de risco que permita a redução de crimes violentos. Outra ideia sua é a criação das “Forças Armadas Modernizadas - F.A.M.”, que usaria “aeronaves de combate e de monitoramento, sistemas de radares e de segurança cibernética, inclusive com o apoio governamental para a criação de centros de pesquisas e desenvolvimento de tecnologias em áreas de natureza estratégica e de defesa”.
Já o candidato do partido Novo, Felipe D’Ávila, levanta as bandeiras do “combate rigoroso ao crime organizado e à corrupção” e da desburocratização do sistema de segurança pública. “A vulnerabilidade do país decorre, de um lado, do modelo institucional da segurança pública, fragmentado e sobreposto. De outro, do corporativismo reinante, que muitas vezes age para livrar malfeitores. Basta ver a pressão que foi exercida para sepultar a Lava Jato, que se notabilizou como a mais contundente resposta já dada pela sociedade brasileira contra os desmandos dos poderosos”, diz o plano.
Os focos de D’Ávila seriam a integração entre os sistemas de inteligência das diversas unidades da federação com o governo federal; uma maior autonomia da Polícia Federal, com mandato fixo para seu diretor-geral; a aprovação da prisão em segunda instância; o fim do foro privilegiado para políticos; e o endurecimento da execução penal.
Extrema-esquerda propõe desmilitarização das polícias e descriminalização das drogas
Os candidatos da extrema-esquerda, como PCB, PSTU e União Popular, defendem ideias como a desmilitarização da polícia e a descriminalização das drogas. Além disso, as pautas identitárias são uma de suas principais bandeiras.
Sofia Manzano (PCB) propõe a “descriminalização do uso de drogas, com legalização da maconha a curto prazo”, além da “desmilitarização completa da segurança pública”. Também quer a “revogação completa da Lei Antiterrorismo” e o “fim imediato das Unidades de Polícia Pacificadoras e políticas similares”.
Leonardo Péricles (União Popular) também prega o “fim da polícia militar” e “de qualquer repressão aos movimentos sociais” e a “desmilitarização das polícias estaduais”.
A candidata Vera (PSTU) defende “o desmantelamento completo de todo o aparato repressivo contra o povo e a revogação das leis repressivas”. Propõe, como solução para a violência, “organizar a autodefesa, pelos próprios trabalhadores, das suas lutas e organizações contra os ataques das polícias e dos paramilitares da ultradireita”. “Esta é uma tarefa urgente que deve ser tomada pelos sindicatos, pelos movimentos populares, pelas organizações da juventude, associação de moradores etc.”
Segundo ela, a descriminalização das drogas “acabará com o comércio ilegal, com as gangues bilionárias” e com “a corrupção policial por essas gangues”. Para ela, as polícias atuais “são irreformáveis, violentas e corruptas”. “Defendemos a criação de outra polícia, com seus comandantes eleitos pela população. Isso pode favorecer um controle por parte da população sobre as polícias”, diz.
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