Os movimentos de rua conservadores definiram a pauta que será defendida nas manifestações do dia 7 de setembro, convocadas pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) no ato de lançamento da sua candidatura à reeleição. Serão quatro pontos: a celebração dos 200 anos de independência do Brasil e a defesa das liberdades; o respeito à democracia e a todas as instituições; a demanda por eleições transparentes; e o amor ao Brasil e à bandeira nacional.
A pauta foi fechada após reuniões presenciais e remotas entre organizadores de diferentes movimentos ao longo das últimas três semanas. Alguns deles se reuniram com integrantes do núcleo político de Bolsonaro para alinhar a pauta com a campanha presidencial, a fim de evitar uma desconexão com o discurso do presidente ou até mesmo correr o risco de causar algum impacto à candidatura dele.
O entendimento dos coordenadores dos movimentos de rua é que todos os quatro pontos estão alinhados com os anseios da maioria da população, sejam apoiadores ou não de Bolsonaro. Os organizadores defendem que a pauta é democrática e afirmam que foi definida a "várias mãos" a fim de engajar a sociedade sem acalorar mais os ânimos.
Como a pauta expressa a preocupação por um 7 de setembro democrático
A definição da pauta e até mesmo a redação dos tópicos a serem defendidos, alinhados e divulgados nas redes sociais de páginas conservadoras e movimentos de rua expressam uma preocupação dos organizadores em não alimentar um discurso hostil e inflamado por parte de apoiadores e até alguns líderes desses movimentos.
Pela interação em grupos de WhatsApp, Telegram e em reuniões presenciais, a maioria dos influenciadores e organizadores notaram um elevado grau de "animosidade" entre os apoiadores, diz reservadamente um dos coordenadores dos atos de 7 de setembro à Gazeta do Povo.
A discordância de conservadores a diversas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ao longo dos últimos anos já havia elevado a "temperatura" entre apoiadores, e o clima ficou ainda mais acalorado em grupos após a Procuradoria-Geral Eleitoral pedir multa a Bolsonaro por questionar o sistema eleitoral em reunião com embaixadores.
A indignação de uma parcela dos apoiadores provoca em grupos debates que sugerem uma ruptura institucional. Há quem também fale em interpretar o artigo 142 da Constituição Federal de modo que as Forças Armadas atuem como um "Poder Moderador", embora grande parte dos juristas afirmem que o dispositivo não atribui aos militares esse papel em caso de crise entre os poderes.
Temas como esses chegaram ao conhecimento de coordenadores dos movimentos de rua, que trabalharam para fechar uma pauta alinhada com Bolsonaro e a maioria dos conservadores. O sentimento do comitê da campanha e dos organizadores dos atos de 7 de setembro é que a agenda fechada é democrática e tem alto poder de engajamento.
Organizadores dos atos de 7 de setembro contam com apoio de Bolsonaro
A fim de evitar, ou ao menos mitigar, discursos com teor antidemocrático, alguns organizadores dos movimentos de 7 de setembro também contam com o apoio de Bolsonaro para que ele defenda a pauta em uma de suas tradicionais lives na internet ou em um vídeo gravado que possa ser compartilhado em grupos e nas redes sociais.
O objetivo de coordenadores é que o próprio presidente atue antecipadamente para defender os pontos da pauta e evitar discursos inflamados que, porventura, possam ser usados contra ele e sua candidatura à reeleição por opositores políticos, acusando-o de apoiar manifestações antidemocráticas.
A ativista política Kelly Santos, uma das organizadoras do movimento de rua conservador em Brasília, entende que, independentemente da pauta, os adversários e opositores de Bolsonaro vão acusar o presidente e as manifestações. Por isso, ela entende que todas as lideranças do país vão dar total liberdade aos cidadãos. Porém, admite que os organizadores vão orientar para que os manifestantes se atenham à pauta fechada pelos movimentos.
"O brasileiro vai às ruas dar o seu discurso, pois estamos em um país livre, cada um vai ter a liberdade de falar o que quiser. Poderíamos ficar todos caladinhos com a 'pombinha da paz', lencinhos brancos e todos de mão dada que iriam acusar a nós e o presidente da mesma forma. Entretanto, queremos um discurso único em cima dessas pautas [bicentenário da independência, respeito à democracia e às instituições, eleições transparentes e o patriotismo]", afirma.
Sobre Bolsonaro defender a pauta única, Kelly acredita que o presidente possa falar algo em uma transmissão ao vivo. "Durante as lives, ele vai dar as orientações e o recado certo, que é o que a gente tem esperado. Todo mundo vai entender em bom e alto som, mas ninguém vai impor nada a ninguém. Nós, da direita, só queremos o respeito do 'outro lado' às liberdades. Que obedeçam a Constituição e a liberdade de expressão", diz.
O deputado federal Coronel Tadeu (PL-SP), vice-líder do partido na Câmara, prevê uma Avenida Paulista lotada no 7 de setembro e não acredita que os manifestantes irão sugerir uma ruptura institucional. O aliado de Bolsonaro também não acredita em uma pauta única fechada e encampada previamente pelo presidente.
"Ninguém vai mexer com essa história de artigo 142, esquece. E não dá para dizer que a pauta será algo fechado, mas todo mundo já sabe o que é. É o apoio ao presidente, aos candidatos majoritários e à nossa bandeira. O Bolsonaro vai conduzir ele mesmo no microfone a fala e a narrativa em relação ao STF e às urnas. E aí, o povo acompanha. Na verdade, ele não vai ditar nada antes", prevê.
Organizadores preveem "festa democrática"
Os organizadores entendem que é justificável a indignação e revolta de apoiadores em relação a decisões judiciais do STF e do TSE. Porém, defendem que a atitude tomada em cima da construção da pauta pode fazer a diferença pela reeleição de Bolsonaro, destaca o empresário Paulo Generoso, criador e coadministrador da página República de Curitiba.
"Estamos alinhados ao presidente, que quer uma festa democrática gigante, mas pacífica e ordeira, que defenda e demonstre o nosso amor pelo país sem atacar instituições, até para o presidente se precaver, pois a imprensa coloca tudo na 'conta' do presidente, que é o alvo principal", sustenta.
A ideia da pauta, reforça Generoso, não é pedir impeachment de ministros e de "ninguém". "A gente entende que o 7 de setembro é para fazer uma grande festa democrática, demonstrar nosso amor ao Brasil, o valor das instituições, da liberdade e da democracia. E, acima de tudo, mostrar um recado ao mundo que o Brasil não aceita comunismo e apoiamos o nosso governo", destaca.
O empresário Tomé Abduch, fundador e coordenador do Nas Ruas, entende que muitos brasileiros estão assustados em poder se posicionar e com medo de ter sua liberdade de expressão limitada. Ele assegura, porém, que as manifestações serão educadas e respeitosas.
"Não há nenhum tipo de manifestação a fazer com ataques individuais a pessoas ou a instituições. Isso não vai acontecer, pois não pactuamos com isso e, independentemente de nossa opinião, pregamos o respeito a tudo e a todos. Não será ato antidemocrático em nenhum sentido, muito pelo contrário. Defendemos a paz institucional, a democracia e as cores verde e amarela", afirma.
Abduch reforça que o mapeamento de redes feito pelo Nas Ruas sugere que as manifestações deste ano serão ainda mais numerosas em comparação a 2021. Um dos motivos apontados por ele é que, no ano passado, os atos foram organizados em pouco mais de 200 cidades. "Hoje, estamos em contato e organizando em mais de 300 cidades", afirma.
A previsão de Abduch é que o número de cidades a organizarem um ato a favor da pauta única e de Bolsonaro cresça "bastante" nos próximos dias.
"O mapeamento nas redes sociais já está muito maior do que o 7 de setembro do ano passado e a população está entendendo que nós não podemos, de maneira alguma, pactuar com o retorno das pessoas que claramente assaltaram o Brasil", afirma, citando que um dos motivos para a atração de um público maior é a proximidade das eleições.
Como será a agenda de Bolsonaro no dia 7 de setembro
Das mais de 300 cidades previstas a receber algum ato em 7 de setembro, as atenções estarão voltadas para o eixo Rio-São Paulo-Brasília. Até o momento, a presença de Bolsonaro está garantida apenas no tradicional desfile cívico-militar na capital federal. Mas não está descartada a possibilidade dele comparecer aos atos públicos em Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro. Alguns organizadores até cravam essa possibilidade, embora a campanha ainda não confirme.
"Torcemos para contar com a presença do presidente em defesa da liberdade e do patriotismo. Mas, assim como foi no ano passado também, ele não confirma, até pela questão de segurança, e é o certo, porque ele acaba movimentando muita gente, é toda uma preparação de área. Por isso, não dá para dizer que ele vai estar ou não", diz Kelly Santos.
A união de movimentos de rua conservadores em Brasília já fez o pedido para a realização do ato em 7 de setembro à Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF). A previsão é que o ato se inicie às 10 horas, mas Kelly diz que às 7 horas os organizadores já estarão na Esplanada. Também existe a possibilidade de chegarem ainda na noite do dia anterior, como ocorreu em 2021.
A participação de Bolsonaro na Avenida Paulista também não é garantida. Integrantes do núcleo político da campanha estimulam o presidente a manter o local como o principal palco dos atos do Dia da Independência, mas ele segue disposto a transferir sua ida para o Rio de Janeiro.
Tomé Abduch, do Nas Ruas, diz que o movimento manterá a mobilização na Paulista e confirma que, até o momento, não obteve resposta do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República — responsável por cuidar da segurança presidencial — sobre a decisão de Bolsonaro ir ou não.
"Óbvio que estamos super abertos a recebê-lo no nosso caminhão, como sempre estamos, mas, até agora, não houve nenhum tipo de contato do GSI para nos informar se o presidente tem interesse de vir ou não. Mas organizaremos a mobilização normalmente, por entender que é importante comemorar os 200 anos da independência, dia que a população vai às ruas para lutar por nossa liberdade e defender as nossas instituições", destaca.
No momento, a hipótese provável é que Bolsonaro mantenha sua ida ao Rio de Janeiro, no período da tarde, às 16 ou 17 horas. Porém, a participação conjunta com o desfile militar a ser realizado na capital fluminense está descartada. A meta do presidente era que o desfile ocorresse na praia de Copacabana, mas ele foi convencido a desistir da ideia por coordenadores eleitorais de sua campanha e por integrantes do Alto Comando das Forças Armadas. "É praticamente certo a presença do presidente no Rio de Janeiro", admite Paulo Generoso, do movimento República de Curitiba.
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