A Gazeta do Povo está publicando uma série de reportagens sobre temas que impactam a sociedade e que são vitais para a qualidade de vida das pessoas, para o avanço dos negócios e para o desenvolvimento de todo o Paraná. O propósito é, com a proximidade das eleições, estimular o debate sobre questões prioritárias ao Paraná e à próxima gestão do governo estadual. O recorte aqui é a eficiência administrativa.
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A gestão do gasto público é um dos maiores desafios dos governantes. Não se trata apenas de equilibrar receita e despesa, mas de gastar bem o que se arrecada. É necessário reverter o gasto em políticas públicas que garantam o atendimento às necessidades da população, como saúde, educação e segurança, além de prover o estado da infraestrutura necessária para sustentar o desenvolvimento.
Brasil arrecada bem, mas gasta mal
“A arrecadação e os gastos do Brasil e de vários estados são compatíveis com países ricos. O Brasil arrecada 35% do Produto Interno Bruto (PIB), quase US$ 10 mil per capita, o que é acima dos países de renda média alta, não é por falta de recursos que o país não está melhor”, analisa o professor Humberto Falcão, especialista em Gestão Pública da Fundação Dom Cabral.
Segundo ele, o governo brasileiro gasta, em média, 20% a mais do que países de renda média alta. “A pergunta é: se o país gera riqueza, se gasta acima da média, por que não está melhor? Por que esse gasto não vira resultado de política pública?”, questiona. A resposta, segundo Falcão, só pode ser uma: “porque se usa mal os recursos”.
Não há dados específicos do estado do Paraná, mas sabe-se que a realidade nacional se reflete nas gestões municipais e estaduais - e na consequente eficiência administrativa. O especialista faz referência ao Índice Integrado de Governança e Gestão (IGG), do Tribunal de Contas da União (TCU). O índice mede a eficiência da gestão. Numa escala de 0 a 10, o Brasil ficou com 5,2. “É literalmente medíocre, está na média. Não vamos conseguir tirar bom recurso da riqueza com uma administração medíocre”, pontua.
Segundo Falcão, a riqueza está muito concentrada e uma das formas de promover equidade é a desconcentração da riqueza. O índice ao qual o professor se refere ainda não é aplicado em estados e municípios. “Acredito que no curto prazo, por força dos tribunais de conta, vai acabar sendo adotado também para avaliar as gestões estaduais e municipais”, observa.
Reforma administrativa e funcionalismo
O professor da Fundação Dom Cabral critica a narrativa fiscalista, que defende a reforma administrativa para reduzir gastos. “Não é sobre reduzir gastos, mas sim arrancar um resultado do gasto que gere bem-estar, desenvolvimento e satisfação das necessidades das pessoas”, aponta. Para ele, a finalidade de uma reforma não tem que ser outra senão a de fazer com que os órgãos funcionem mais e melhor.
Falcão fala ainda que um dos entraves do bom funcionamento das estruturas públicas é a baixa produtividade da força de trabalho. “Não se consegue selecionar perfis ideais”, opina, criticando em seguida as seleções feitas para as contratações de servidores. “Os concursos têm que existir pra ter seleção baseada em critérios isonômicos, mas não selecionam a pessoa mais vocacionada. Os concursos só medem o conhecimento. Não medem valores e atitude. Assim, não vai ter produtividade. Praticamente não tem modelo de gestão de desempenho com meta a ser alcançada”, analisa.
Não é "informatizar a burocracia"
Quando o assunto é simplificar a atuação do estado para facilitar a vida das pessoas, o professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (Ebape), da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Joaquim Rubens Fontes Filho diz que “governo eletrônico não é pegar a burocracia e colocar no computador. Isso é informatizar a burocracia”, que é o que se vê na maior parte das vezes, segundo ele.
“É fundamental pegar todos os recursos do 5G, por exemplo, e colocar a serviço de todos, ter soluções mais ágeis”, diz. Para ele, alguns documentos não precisam mais. “É necessária uma revisão da própria burocracia”.
Para a gerente de pesquisa do Instituto Sivis, Thaise Kemer, a burocracia não é necessariamente ruim. “Na medida certa, é necessária, porém ninguém disse que ela tem que ser lenta”, pontua. Ela defende que o governo do Estado tenha um olhar crítico para os gargalos dos processos e busque otimizar para facilitar e reduzir etapas.
Para Fontes Filho, é fundamental também garantir o acesso a todos, promovendo a efetiva inclusão digital. “Não vai resolver se tiver apenas um pequeno grupo, isso não vai fazer diferença”, observa. O professor insiste que o governo tem que se aproximar mais da sociedade. E isso tem que valer para todos. As pessoas mais simples têm mais dificuldade. Não basta ter o computador, tem que ter facilidade de acesso”, aponta.
Transparência é deixar claro para todos
Transparência tem sido uma palavra muito usada pelos governantes e, em especial, pelos candidatos. Os atuais gestores públicos falam que seus governos são transparentes e os candidatos prometem transparência na gestão. Será que de fato todos os dados, todas as informações disponibilizadas cumprem a função de prestar contas ao eleitor de forma clara, para se confirmar como está a eficiência administrativa?
O conteúdo pode até estar disponível, conforme determina a legislação, mas o que se questiona é o acesso de forma simples, a decodificação dos dados e a linguagem usada.
Para o professor da FGV, que estuda o tema, ainda falta muito para isso. “Não é só colocar o dado lá. É ter o desejo de informar, entender que o cidadão é o dono do governo, do estado e tem o direito de ver e entender”, defende Fontes Filho. “Não é publicar o balancete”, exemplifica.
Segundo ele, na medida em que um governo não é transparente, de fato, ele dificulta o acesso a instrumentos como convênios e contratos. Mais um elemento que pode comprometer a eficiência administrativa do poder público. “E não é só o cidadão. Prefeituras menores que têm poucos recursos e pouco pessoal especializado têm dificuldade de entender todas as regras, imagine uma pessoa humilde que precisa acessar uma informação ou um serviço?” questiona.
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A gerente de pesquisa do Instituto Sivis fala na mesma linha. “Transparência não é deixar um documento num anexo de um apêndice. Isso não é facilitar o acesso”, observa. Ela defende que as informações sejam acessíveis a qualquer cidadão. “O governo deve trabalhar ativamente não apenas para deixar a informação ali no sistema, mas tem que promover um esforço de comunicação para fazer a mensagem chegar às pessoas no dia a dia", defende.
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Nesse ponto, o governo do Paraná tem um desempenho considerado bom. Avaliação da Transparência Internacional, divulgada em julho último, colocou o estado na terceira colocação no ranking nacional no índice de Transparência e Governança Pública. O Paraná atingiu 89 pontos, ficando atrás apenas de Espírito Santo (90,4) e Minas Gerais (90).
No entanto, a atual gestão chegará ao fim sem ter viabilizado o Sistema Integrado de Finanças Públicas do Estado do Paraná (Siaf), principal instrumento de registro, acompanhamento e controle da execução orçamentária, financeira e patrimonial do governo estadual.
O problema - que compromete a eficiência administrativa - vem desde a gestão passada, com deficiência na atualização do software que apresentou falhas resultando em duplicidade de pagamento a fornecedores e erros na prestação de contas ao Tribunal de Contas do Estado. Sem o Siaf funcionando, o paranaense não consegue ter acesso detalhado às despesas do estado.
Políticas públicas têm que sobreviver às trocas de gestão
Não é raro programas de governo mudarem de uma gestão para outra. Ainda mais quando quem vence a eleição é um grupo político diferente do antecessor. “Para um planejamento de longo prazo é necessário um acordo mínimo. É preciso o entendimento de que há políticas de estado e não de governo, não se pode perder a continuidade”, defende o pesquisador da FGV.
“Precisamos que uma política pública dure porque as necessidades das pessoas não se esgotam em quatros anos”, observa Thaise Kemer, do Instituto Sivis.
Segundo ela, para que uma política tenha essa viabilidade de longo prazo tem que responder aos anseios sociais. “Quando um governo é trocado, permanece a máquina estatal que precisa ser capaz de continuar respondendo às necessidades da sociedade”, pontua. Para Kemer, uma das formas de garantir políticas de longo prazo é envolver a comunidade.
A importância da participação popular para a eficiência administrativa
Kemer destaca a importância do diálogo com a sociedade civil, que é quem vai receber a política pública. “A participação popular é fundamental para que a política pública seja aderente. Começa antes mesmo de se tornar uma política, começa com o diagnóstico. É uma avaliação inicial para se entender o problema e fundamentar o que precisa ser feito”, afirma.
Para a representante do Instituto Sivis, a participação popular também é fundamental para se avaliar se o dinheiro público está sendo bem aplicado, comparar custos e resultados. Ela lembra que a sociedade tem ferramentas para isso, como as chamadas públicas, audiências públicas e portais da transparência.
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