Campanha do presidente Jair Bolsonaro e aliados da base acreditam que economia vai ajudar o projeto de reeleição, mas especialistas fazem ressalvas.| Foto: André Coelho/EFE
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O comitê de campanha do presidente Jair Bolsonaro (PL) e a base política estão entusiasmados com as notícias da economia brasileira nas últimas semanas. Cada vez mais aliados e integrantes do núcleo político da candidatura incorporam a melhora de indicadores em discursos e comentários nas redes sociais.

Pouco a pouco, a campanha esboça as estratégias para convencer o eleitorado de que a reação econômica é fruto de ações do governo. Mas alguns sinais já estão dados e incorporados no próprio discurso de Bolsonaro.

"Zeramos impostos federais do gás de cozinha desde o ano passado e do diesel há quatro meses. E foi colocado um teto do ICMS, que é o imposto estadual, não apenas para combustível, mas para a energia elétrica, para as comunicações e para o transporte. Temos certeza que teremos deflação no corrente mês", disse o presidente na convenção do PL que oficializou sua candidatura.

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A revisão para cima das projeções de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB); a desaceleração da inflação após queda de preços de combustíveis e energia elétrica; e a redução do desemprego aos menores níveis em sete anos, com geração de empregos formais, são três dos principais fatos econômicos destacados no governo, no comitê de campanha e na base política.

A criação de postos de trabalho com carteira assinada, captada pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), foi destacada por Bolsonaro na última quinta-feira (28). O país gerou 278 mil empregos formais em junho e mais de 1,3 milhão no primeiro semestre.

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"Assim como um agricultor não gera os frutos, mas cuida do solo para que seja fértil e produtivo, um presidente não cria empregos, mas trabalha para tornar o ambiente fértil e favorável para a iniciativa privada, que é quem realmente gera. É exatamente isso que estamos fazendo", comentou o presidente no Twitter.

Aliados da base também destacam os sinais de recuperação da economia. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), destacou no Twitter o avanço de alguns indicadores econômicos. "Má notícia para os pessimistas de plantão! Estamos na contramão do mundo, mas isso é bom! Inflação em baixa, PIB em alta. Desemprego com a menor taxa dos últimos anos. Estamos trabalhando com o Brasil real, que vai prosperando, melhorando, avançando", comentou.

As comemorações de Bolsonaro e Lira são exemplos de como a coordenação eleitoral e a base política querem transmitir ao eleitor a mensagem de que o governo e parlamentares agiram para conter a alta dos preços, gerar empregos, consumo e crescimento econômico. Economistas e cientistas políticos ouvidos pela Gazeta do Povo dizem que a campanha do presidente tem motivos para comemorar, mas eles têm dúvidas sobre o alcance, em termos de intenção de voto, da melhora dos indicadores.

Como os estímulos à economia podem ajudar a campanha de Bolsonaro

A reversão do quadro de avanço da inflação e baixo crescimento econômico tem, entre suas causas, um "pacote de bondades" encampado pelo Congresso e pelo governo. Nas últimas semanas houve a promulgação da Emenda Constitucional 123/22 – a PEC dos Benefícios, antes chamada de PEC Kamikaze pelo ministro da Economia, Paulo Guedes – e a sanção da Lei Complementar 194/22, que fixou um "teto" de incidência do ICMS sobre combustíveis, energia elétrica, telecomunicações e transporte coletivo.

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Os efeitos das ações do governo e do Congresso trazem boas notícias no curto prazo, afirma o economista-chefe da Necton Investimentos, André Perfeito. Em razão dos impactos das medidas, ele revisou a projeção de aumento do PIB neste ano de 0,5% para 1,5%, e baixou de 9% para 7% a estimativa para o IPCA, considerado o indicador oficial de inflação.

Setores que respondem de maneira mais contundente ao gasto público, como o comércio e os serviços, tendem a apresentar melhor dinâmica e impulsionar o crescimento econômico devido à injeção de recursos em programas sociais como o Auxílio Brasil e o vale-gás, além da criação de vouchers para taxistas e caminhoneiros autônomos. Na esteira desse movimento, outros setores também podem ser beneficiados, como a indústria.

A desaceleração da inflação e o crescimento da atividade ajudam a desencadear uma criação líquida de empregos que, em uma perspectiva de curto prazo, deve ajudar a campanha de Bolsonaro. "Isso vai se traduzir em melhora do presidente nas pesquisas? A minha opinião é que sim, pode haver efeitos em um cenário eleitoral", diz Perfeito.

O economista-chefe da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), Antonio da Luz, prevê deflação em julho e não descarta uma outra queda de preços em agosto por força da redução tributária. O cenário construído sugere a ele que, além de desaceleração da inflação, aumento de empregos e crescimento econômico, Bolsonaro chegará às eleições com índices de confiança do consumidor e do empresário em alta.

"É natural que medidas como as tomadas acelerem o crescimento econômico e tragam um ambiente positivo para a economia no curto prazo. Bolsonaro vai chegar na eleição com alguns indicadores bons, como é o caso do emprego, um indicador superimportante, só que todos esses pontos de melhora partem de um nível ruim", diz.

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Apesar dos esforços do governo e da base para construir um cenário eleitoral favorável no curto prazo, Luz e Perfeito acreditam que o governo pode ter dificuldades para transformar em votos os sinais de melhora da economia. Outros economistas também entendem que a percepção de crescimento pode ser insuficiente para impulsionar a campanha e assegurar a reeleição.

Quais indicadores sugerem sinal de alerta à reeleição de Bolsonaro

A despeito de alguns indicadores positivos, os juros compõem um fator que sugere cautela quanto ao potencial eleitoral da recente reação econômica. A taxa básica (Selic) deve encerrar o atual ciclo de aperto monetário em torno de 14%, com média de juros real de 5% em 2022, alerta o economista Fábio Silveira, sócio-diretor da MacroSector Consultores.

"Com juros altos, você provoca desemprego e derruba salários. Os juros subiram muito, não derrubaram o emprego, mas derrubaram os rendimentos", alerta. Silveira prevê uma queda em 2022 de 4,2% do rendimento médio real — ou seja, já descontada a inflação. Para compensar a política monetária restritiva e melhorar o desempenho do mercado de trabalho e, consequentemente das empresas, o governo e o Congresso encamparam a PEC dos Benefícios.

Para Silveira, os efeitos da Emenda Constitucional sobre a economia podem ser suficientes para assegurar uma alta do PIB de 1,5%, devido à expectativa de alta de 3,7% da massa de rendimentos real (a soma as remunerações de todos os trabalhos). Porém, ele acredita que esses fatores serão insuficientes para mostrar uma melhora significativa ao eleitor no terceiro trimestre e em outubro, período crucial para a campanha de Bolsonaro considerando o primeiro e segundo turnos.

"Eu acho que os efeitos da PEC Kamikaze vão chegar um pouco tarde", diz Silveira. "Não sei se vai dar tempo para gerar uma melhora substantiva da economia e levar o eleitor indeciso a cravar um voto no Bolsonaro", explica.

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O sócio-diretor da MacroSector destaca que, além de os resultados econômicos não serem persistentes, ainda há uma grande fatia de pessoas desempregadas e desalentadas (as que desistiram de procurar emprego). Por esses motivos, outros analistas também entendem que a campanha presidencial pode encontrar dificuldades para convencer o eleitor.

O economista-chefe da Necton Investimentos destaca que, embora tenha subido nas últimas medições, o rendimento médio real (já descontada a inflação) ainda está em patamares de 2012, o que sugere a ele uma dificuldade para a campanha de Bolsonaro reverter uma percepção ruim em relação à economia por parte da grande massa de eleitores.

"No primeiro momento, a economia até pode ajudar nas pesquisas, mas desconfio que o efeito pode ser muito modesto e trava na questão da inflação e renda. O momento é insuficiente para apagar ou alterar a percepção das pessoas a respeito da piora que já teve. O presidente está com um grande problema na mão. O que fez até agora gera alívio de curto prazo, mas não sei se é o suficiente para reverter uma leitura ruim", pondera Perfeito.

O economista e cientista político Ricardo Sennes, fundador e sócio-diretor da consultoria Prospectiva, concorda que os efeitos econômicos das medidas do governo podem ser insuficientes para sobrepor a percepção negativa existente até então. "Do ponto de vista eleitoral, é possível ter um certo efeito, mas é pouco provável que reponha o grosso das perdas que ainda se mostram para a economia de maneira geral", avalia.

"A massa salarial ainda está 10% abaixo do que era no período pré-pandemia. Essas medidas teriam que compensar de alguma maneira esses 10% da redução e acho que não vão conseguir fazer essa compensação. Esse pico inflacionário que estamos vivendo, que tende a baixar nos próximos meses, consume fortemente a capacidade de compra de segmentos importantes da população", complementa.

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Campanha de Bolsonaro já vê melhora de percepção após pacote

O comitê de campanha e aliados de Bolsonaro estão confiantes de que as as "bondades" às vésperas do período eleitoral vão se sobrepor a uma percepção ruim do eleitorado sobre a economia. A campanha desenha estratégias para comunicar os feitos do governo na propaganda eleitoral, que começa dia 16. Para interlocutores, é uma questão de tempo que a candidatura à reeleição consiga votos de eleitores indecisos.

O comitê da campanha também alinhou com a base política estratégias para defender o legado do governo. A previsão feita no núcleo político é de que nas próximas semanas as medidas econômicas devem se refletir de forma mais clara em uma redução na margem para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas pesquisas eleitorais.

A campanha de Bolsonaro entende que a última pesquisa Datafolha já dá indícios de uma melhora na percepção do eleitorado em relação à economia (confira a metodologia). Caiu cinco pontos percentuais o índice de beneficiários do Auxílio Brasil que dizem não votar no presidente de jeito nenhum, e a rejeição dele entre as mulheres caiu sete pontos em relação ao levantamento anterior.

Segundo a pesquisa mais recente, 54% dos brasileiros que recebem o Auxílio Brasil se recusam a votar no presidente. Entre as mulheres, o índice é o mesmo. De acordo com o Datafolha, Bolsonaro também subiu três pontos percentuais entre eleitores que ganham até dois salários mínimos. Essa é a principal faixa de renda da pesquisa, equivalente a 53% dos entrevistados. Eleitores que ganham até dois salários mínimos estão entre os potenciais beneficiários do Auxílio Brasil.

O cientista político e sociólogo Paulo Baía, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), avalia que há fundamentos para o otimismo do comitê da candidatura de Bolsonaro. "A população tem visão curta sobre a economia, ela não vai lembrar da inflação de quatro meses atrás. Quem lembra disso somos nós especialistas, a classe média alta e os ricos", sustenta.

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A leitura mais imediatista de grande parte da população é atribuída por Baía aos menos abastados. "A população mais humilde pensa no agora, no hoje, esquece com muito mais rapidez. As categorias que usamos em pesquisas de opinião e mercado, E, D e C, C2 e C1, e B2, ou seja, as classes médias baixas, os pobres e os miseráveis, esquecem com muita rapidez a inflação de quatro meses atrás", destaca. "E por quê? Porque a população consegue consumir mais, está se sentindo melhor já agora, mesmo antes do Auxílio Brasil de R$ 600, só com a diminuição do ICMS", complementa.

O economista e cientista político Ricardo Sennes concorda que os efeitos econômicos do pacote de bondades podem surtir impactos eleitorais por atingir as classes mais baixas da sociedade, que incluem mulheres e negros, mas mantém seu entendimento acerca do curto alcance que a dinâmica econômica teria sobre o potencial eleitoral.

"É verdade que os pacotes endereçam muito fortemente uma população que, do ponto de vista eleitoral, estava mais propensa a [votar em] Lula. Quando pega o perfil de quem recebe o Auxílio Brasil, é basicamente classes D e E, tem muita mulher e negros", avalia o sócio-diretor da Prospectiva. "Se não repõem as perdas de massa salarial de assalariados, por outro lado, focam muito no público que é anti-Bolsonaro, que, hoje, pesa nas pesquisas."

Quais os alertas dos especialistas sobre a política de curto prazo

Auxilie ou não a campanha de Bolsonaro, o pacote de bondades tem chances significativas de deixar um legado econômico negativo para quem vencer as eleições deste ano.

Para o economista-chefe da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), os R$ 41,25 bilhões injetados na economia podem levar a um aumento da inflação.

"Todo crescimento econômico é bom, só que esse atual é o músculo que cresce com anabolizante, não com exercício. Eu estaria comemorando um crescimento se tivéssemos feito uma reforma tributária e administrativa para aumentar a produtividade, tornar o gasto mais eficiente e gerar mais resultados, não por aumento de gastos", analisa Antonio da Luz.

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O economista da Farsul pondera que o cenário atual é diferente do de 2020, quando o governo injetou recursos para salvar a economia em meio à pandemia. "A inflação atual é fruto de uma medida correta. A oferta agregada se retraiu e a demanda agregada aumentou por força dos gasto do governo, o que, se não fosse feito, levaríamos 20 ou 30 anos para recuperar o tecido econômico. Mas no momento em que se joga mais R$ 50 bilhões, isso vai contra os esforços desinflacionários", diz.

A perspectiva de melhora no curto prazo em detrimento de uma expectativa de piora a médio e longo prazo já está contabilizada nos cálculos da Necton Investimentos para 2023. A projeção de alta inflacionária levou a corretora a rever uma alta do IPCA de 3,5% para 5,1%, afirma André Perfeito.

"Os ruídos que deixa para frente são relevantes, tanto que as taxas de juros não caíram por conta disso, porque se sabe que os efeitos são transitórios. É tudo muito excepcional e fora da normalidade, e isso gera uma discussão e preocupação a respeito de 2023 adiante", diz o economista.

O economista e cientista político Ricardo Sennes reforça as preocupações para a economia em 2023, sobretudo pela ótica da perda de credibilidade do país e seus impactos sobre o chamado custo Brasil.

"Isso significa juros mais altos e câmbio mais baixo, é a medida clássica do populismo. Uma das principais ferramentas de gestão das finanças públicas, que é o teto de gastos, está completamente desacreditado, e não é o primeiro atentado", diz o sócio-diretor da Prospectiva.

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O cientista político e sociólogo Paulo Baía, da UFRJ, afirma que, do ponto de vista estrutural de uma teoria de economia política, as medidas aplicadas são uma "catástrofe".

"Não corrigem o passado e abrem um abismo para o futuro. O que está acontecendo não é uma estratégia de política econômica, é uma estratégia exclusivamente de política eleitoral", avalia.

O economista Fábio Silveira, sócio-diretor da MacroSector Consultores, concorda que logo os impactos do pacote de bondades vão se transformar em desequilíbrio fiscal. "Se não neste ano, no ano que vem", diz. Porém, ele prevê um cenário econômico menos adverso.

"Em 2023, se não ocorrer nenhuma outra tragédia internacional, como a China invadir Taiwan, a economia brasileira pode ter uma inflação mais baixa. Os combustíveis estão caindo de maneira gradual e consolidada, mas só no ano que vem que vai se perceber isso, porque aí você vai ter um efeito menor dos juros, da baixa do preço dos combustíveis, de taxa de desemprego menor, e dos fundamentos da economia e commodities em escala global", avalia.

Metodologia das pesquisas citadas

Sobre o levantamento do Datafolha de julho, o instituto entrevistou 2.556 eleitores entre os dias 27 e 28 de julho em 183 cidades. O levantamento foi contratado pelo jornal Folha de S. Paulo e está registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com o protocolo BR-01192/2022. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos, e o nível de confiança é de 95%.

Sobre a pesquisa Datafolha divulgada em junho, o instituto entrevistou 2.556 eleitores entre os dias 22 e 23 de junho em 181 cidades. O levantamento foi contratado pelo jornal Folha de S. Paulo e está registrado no TSE com o protocolo BR-09088/2022. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos, e o nível de confiança é de 95%.

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