O presidente da Escola Nacional de Administração Pública (Enap), Diogo Costa, publicou em seu perfil na rede social Linkedin, em agosto, uma celebração ao fato de ter promovido a revogação de 42 normas internas da instituição. "Os avanços promovidos por esta medida são perceptíveis ao longo do tempo: menos burocracia, mais agilidade e mais racionalidade", escreveu.
A comemoração de Costa à derrubada de normas é parte de um tipo de ação que vem ganhando popularidade entre os gestores públicos: a revogação ou revisão em massa de normas obsoletas, os chamados "revogaços" ou "revisaços".
No plano federal, esse tipo de medida ganhou corpo a partir de 2019, com o Decreto 10.139 e outras ações semelhantes do governo Jair Bolsonaro (PL). O presidente fez, em diferentes ocasiões, solenidades públicas para celebrar a execução dos "revogaços". Uma ação recente foi assinada em maio, para eliminar normas ligadas ao combate à pandemia de Covid-19.
Os "revogaços" do plano federal têm como meta eliminar normas que, de acordo com o Decreto 10.139, tenham "se exaurido no tempo", "cuja necessidade ou cujo significado não pôde ser identificado" ou já tenham sido "revogadas tacitamente". Este último aspecto diz respeito a normas cujos efeitos tenham sido suplantados por outras normas posteriores, mas que formalmente ainda estavam em vigor.
Num exemplo hipotético: é como se existisse uma lei proibindo a compra do produto X e, depois, surgisse uma lei autorizando a compra do produto X. Na prática, como as duas leis falam do mesmo assunto, a segunda lei, por ser mais recente, acabaria com a validade da primeira. Mas a primeira oficialmente continua válida formalmente, o que pode gerar conflitos jurídicos.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que é candidato à Presidência em 2022, falou recentemente em "revogaços", mas sua proposta tem foco específico e não aborda a eliminação de leis antigas. Os "revogaços" defendidos por Lula abordam legislações para a população indígena que ele considera inadequadas e os sigilos decretados por Bolsonaro para diferentes casos, como o cartão vacinal do presidente e as reuniões que ele manteve com pastores acusados de comandar um esquema de corrupção no Ministério da Educação.
Lula vem repetindo que fará um "revogaço" nas normas sobre sigilo logo em um primeiro dia de seu eventual novo governo.
"Revogaços" são positivos e necessários, diz ex-secretário de Guedes
O advogado Paulo Uebel, ex-secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital no Ministério da Economia na gestão Paulo Guedes/Jair Bolsonaro, considera "positivos e necessários" os "revogaços". "Numa democracia, o cidadão precisa saber as regras a que está submetido. Hoje nós temos regras confusas, de vários tipos, em vários níveis. E no momento em que tudo é confuso, abre caminho para corrupção e privilégios", opinou.
Segundo Uebel, que mantém uma coluna semanal na Gazeta do Povo, a "limpeza" do quadro legal permitida pelos "revogaços" traz benefícios inclusive aos servidores públicos, que passam a saber melhor como devem aplicar as normas em seus cotidianos.
Ele relata que participou de um esforço encabeçado pela Casa Civil para que todas as instâncias do governo federal expusessem seu conjunto de normas – o que inclui portarias, decretos e outras regulações internas – para que os textos fossem revisados e, se necessário, adaptados a outras necessidades.
Especialistas reforça necessidade, mas pedem cautela
O advogado e consultor Luiz Gomes, especialista em Direito Administrativo, considera que a adoção de "revogaços" se encaixa na necessidade do ambiente jurídico se tornar mais compreensível ao cidadão geral. Este esforço, segundo ele, se dá com linguagens mais simples, decisões mais compreensíveis e também com a eliminação do que ele chama de "colcha de retalhos", muito comuns no ambiente administrativo.
Ele relatou que a complexidade de normas obsoletas e contraditórias é um quadro que se verifica na esfera federal e também nos ambientes municipais e estaduais. Embora isso indique o tamanho do problema a ser superado, Gomes destaca que o panorama permite também que os gestores locais conduzam seus próprios "revogaços", sem a necessidade de autorização ou inspiração de outras esferas de poder.
O advogado aponta que uma preocupação que deve existir em torno dos "revogaços" é a de evitar que a medida seja uma eliminação pura e simples de normas, sem considerar outros aspectos envolvidos, como custos e o aumento da insegurança jurídica.
A observação é endossada pelo também advogado Felipe Estefam, sócio de direito público e regulatório da Cascione Pulino Boulos Advogados. Para ele, é necessário que seja observada também uma eventual consequência econômica das normas. Estefam defende que qualquer "revogaço" seja precedido de um "amplo debate".
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