O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apresentou nesta quinta-feira (15) à imprensa o projeto piloto do teste de integridade das urnas eletrônicas com uso de biometria e realizado nas seções eleitorais. Trata-se de um formato sugerido pelas Forças Armadas com o objetivo de verificar o funcionamento da máquina de modo mais próximo de uma votação real.
O presidente do TSE, Alexandre de Moraes, anunciou que, nas eleições deste ano, isso será feito em 56 locais de votação, em 19 unidades da federação. Usualmente, o teste, feito no dia da eleição, é feito fora do local de votação, nas sedes dos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) e sem a ativação da urna com a biometria do eleitor. Será assim em outras 585 seções.
O teste consiste em separar uma urna que seria usada na eleição, digitar nela votos previamente definidos por partidos e outras entidades fiscalizadoras, reproduzi-los em cédulas de votação impressas e, ao final, comparar o resultado emitido pelo boletim de urna (extrato emitido com a soma dos votos em cada candidato naquela máquina) com a contagem dos votos em papel. Todo o procedimento é executado por servidores, filmado e certificado por empresas de auditoria, que nunca apontaram discrepância desde 2002, quando o teste começou a ser feito nas eleições.
No fim de 2021, as Forças Armadas foram convidadas pelo TSE para participar de um grupo de fiscalização do sistema eleitoral e, no início deste ano, apresentaram à Corte a sugestão de ajuste: fazer o teste no próprio local de votação e com a biometria do eleitor. O objetivo é reduzir as chances de a urna, percebendo que passa por um teste – por estar em ambiente diferente e sem ativação por um eleitor real –, se comportar de forma diferente do que seria na eleição. A premissa teórica é que, na votação, a urna poderia desviar votos e, no teste, ocultaria a fraude.
No início do ano, técnicos do TSE recusaram a mudança no teste. Alegaram, basicamente, que já era possível às entidades fiscalizadoras inspecionar o código da urna relativo à biometria e que, como nem todas os eleitores têm suas digitais cadastradas, não seria viável a realização do teste com o mecanismo. Parte dos servidores também se opôs, em razão de dificuldades logísticas, de segurança e operacionais para fazer o teste nas seções. Não haveria, por exemplo, pessoal suficiente para fazer todo o procedimento nas 641 seções que terão urnas testadas neste ano.
Em agosto, após assumir a presidência do TSE, o ministro Alexandre de Moraes – que mantém interlocução mais próxima com os militares que seu antecessor, Edson Fachin – passou a considerar a possibilidade da mudança sugerida pela Defesa. O intuito é reduzir a desconfiança de parte do eleitorado sobre o sistema de votação, principalmente a parcela que apoia o presidente Jair Bolsonaro (PL), que há anos critica a falta de comprovante impresso dos votos, para eventual recontagem em caso de suspeita de fraude.
Na última terça-feira (13), os ministros do TSE aprovaram uma nova resolução, proposta por Moraes, para fazer o teste com biometria e na seção de parte das urnas que passarão pelo procedimento. Nesta quinta, a Corte divulgou mais detalhes: serão 56 máquinas, ou 8,74% das 641 que passarão pelo teste de integridade neste ano.
As seções onde estarão essas urnas serão previamente selecionadas, com até 10 dias de antecedência, pelos 19 TREs que aceitaram participar do projeto piloto: Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rondônia, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins.
Na apresentação do projeto piloto, Moraes disse que, após sua realização, o TSE vai avaliar se “vale a pena” fazer o teste com biometria nas seções eleitorais. “É necessário isso? Vai melhorar o teste de integridade? É exatamente isso que vamos verificar a partir desse projeto piloto. Nós vamos verificar se vale a pena ampliar e instituir isso para todas as seções ou se não há necessidade, para podermos manter o teste de integridade como ele já existe”, afirmou.
Eleitor será convidado a participar do teste
Após a declaração, funcionários da Justiça Eleitoral habituados a trabalhar nas seções e no teste simularam o que ocorrerá no dia da eleição nas urnas a serem selecionadas para o projeto piloto. O eleitor votará normalmente na eleição e depois, será convidado para participar do teste. Se aceitar, ele será levado para um ambiente adjacente, onde assinará um termo de consentimento e colocará o dedo no leitor de biometria para liberar o funcionamento da urna a ser testada.
Ele não poderá digitar o voto previamente definido por partidos, dispostos numa página impressa, e que tem candidatos reais. O objetivo é não quebrar o sigilo de seu voto real, uma vez que poderia digitar números dos mesmos candidatos que escolheu na eleição. Servidores irão digitar os votos e registrá-los nas cédulas.
Representantes das Forças Armadas não compareceram à demonstração apresentada nesta quinta, na sede do TSE. A reportagem apurou que eles também não participaram das discussões internas no tribunal sobre os procedimentos definidos para o projeto piloto.
Ministério da Defesa analisa procedimento do TSE; auditor do PL aponta problemas
Consultada sobre o modo como o TSE concebeu o projeto piloto, o Ministério da Defesa afirmou à reportagem que ainda vai analisar a resolução que regulamentou o novo teste. A norma diz que o presidente da Corte, Alexandre de Moraes, ainda editará uma portaria para “regulamentação e instalação do Projeto Piloto de Biometria”.
O TSE ainda não detalhou o que essa nova norma vai especificar, mas cogita-se, entre os militares, a possibilidade de definição mais minudente sobre características das seções a serem escolhidas, o grau de aleatoriedade da seleção e como será feita a conferência dos lacres afixados nas urnas (que garantem que não foram manipuladas), por exemplo.
No fim de agosto, quando Moraes acertou com o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, que iria trabalhar em prol do projeto piloto, um militar de alta patente envolvido nas discussões disse à Gazeta do Povo que as Forças Armadas não iriam se envolver no planejamento sobre a quantidade e procedimentos que seriam definidos pelo TSE para fazer o teste nas seções com a biometria. Disse que não haveria problemas em realizá-lo numa amostra do total, desde que ela fosse “estatisticamente correta”. A percepção, dentro da pasta, é que suas sugestões haviam, afinal, sido compreendidas e seriam acolhidas de forma amigável.
Antes, na gestão de Fachin, a relação com os militares havia se estremecido. Além da mudança, a Defesa havia defendido uma amostra maior de urnas a serem testadas. O TSE respondeu que já havia ampliado de cerca de 100 para mais de 600, e que os militares incorriam em erros conceituais e de cálculo ao questionar o tamanho da amostra.
Questionado nesta quinta se as 641 urnas do teste (que representam 0,1% do total de 577.125 urnas a serem distribuídas pelo país), e se as 56 (0,009% do total) que serão ativadas com biometria no projeto piloto, são adequadas estatisticamente, o secretário de Tecnologia do TSE, Júlio Valente, respondeu que a amostra total é suficiente.
“Os nossos cálculos da nossa área de estatística apontam 99% de confiabilidade. Em relação ao projeto piloto, não acredito ser adequado fazer análise de confiabilidade, por ser um projeto piloto. Nós estamos apenas exercitando a prática do projeto e a gente pode ir evoluindo e fazer algum tipo de reflexão sobre índices”, afirmou.
Também consultado pela reportagem, o engenheiro Carlos Rocha – um dos desenvolvedores do primeiro modelo da urna eletrônica e responsável, neste ano, pela auditoria de conformidade contratada pelo Partido Liberal (PL) para avaliar a segurança do sistema de votação – apontou problemas no teste da forma definida no projeto piloto. O principal está no fato de os TREs poderem selecionar até 10 dias antes as seções de onde serão testadas as urnas.
“É muito positivo o interesse do ministro em acolher sugestões e fazer esse avanço. Entretanto, o projeto piloto apresentado não atende à resolução 23.673/2021, que define a verificação deve ser feita em condições reais de uso”, diz, ele, em referência à resolução principal do TSE que define a forma de realização do teste de segurança.
“A urna saberá que está sendo testada, porque o teste será realizado em uma sala especial preparada e a escolha será feita com antecedência. A seleção das seções auditadas deve ser feita por sorteio, para garantir aleatoriedade. Foi criada uma sala especial, com procedimentos especiais de teste feito por funcionários da Justiça Eleitoral, com uma urna especial separada para o teste. Desta forma, o dispositivo inteligente saberá que está sendo testado”, afirma.
Questionado sobre se a seleção prévia das seções não quebraria a lógica do teste, pelo risco de as urnas a serem testadas serem programadas de forma diferente da que funcionaria na eleição, o secretário de Tecnologia do TSE, Júlio Valente, afirmou que não haverá problema.
“Nós [Justiça Eleitoral] vamos selecionar os locais, mas as seções não estarão preparadas ainda. Vão ser preparadas e deslocadas para o local respectivo como no teste de integridade. E é uma necessidade também, porque precisamos, em alguns lugares, ajustar a infraestrutura do local. Nós temos que ter espaços e tomadas pra computadores, filmadoras. Há necessidade de nós sabermos antecipadamente em um lugar sem tomadas suficientes”, afirmou.
Ele também foi questionado se, na hipótese de o projeto piloto não identificar discrepâncias entre o resultado eletrônico e o impresso, ele possa ser abandonado nas eleições seguintes. “Aí é uma definição do pleno, dos ministros.”
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