Ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT)| Foto: Fotomontagem Gazeta do Povo (Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Ouça este conteúdo

Passado o primeiro turno das eleições municipais, o Partido Liberal, encabeçado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), teve êxito em avançar sobre importantes redutos eleitorais do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Dos 13 estados que deram vitória ao petista em 2022, o PL superou o PT no número de prefeituras em quatro. Outros seis foram para o PT, e três registraram empate entre as legendas.

CARREGANDO :)

Por outro lado, das 14 unidades da federação que votaram no ex-mandatário naquele ano, 12 elegeram mais prefeitos do PL do que do PT. Sem contar com o Distrito Federal, que não possui eleições municipais, o PL empatou com o PT somente em Roraima.

Das 509 prefeituras conquistadas pelo partido de Bolsonaro, 137 foram em redutos de Lula. No outro lado, dos 248 executivos municipais, os petistas elegeram apenas 38 gestores nos redutos de Bolsonaro.

Publicidade

O avanço sobre o eleitorado de Lula pode ser observado no Maranhão, onde a sigla de Valdemar Costa Neto arrematou 40 das 217 prefeituras, destacando-se como o partido que mais elegeu prefeitos. O PT elegeu apenas dois prefeitos.

No Rio Grande do Norte, governado por Fátima Bezerra (PT), o PL emplacou 18 gestores municipais, enquanto o PT apenas sete. Já na Paraíba, foram 11 prefeituras contra apenas uma prefeitura petista. Em Minas Gerais, os liberais elegeram 53 prefeitos e os petistas, 35.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]

Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE)

Diferença entre PT e PL pode aumentar no 2° turno

A diferença entre as duas siglas pode aumentar com o segundo turno das eleições, em que eleitores de 51 municípios brasileiros voltam às urnas para definir os prefeitos à gestão 2025-2028. Nesse contexto, o PL conta com 23 representantes nessa nova etapa, sendo 12 os mais votados no primeiro turno e 11 na segunda posição. Já o Partido dos Trabalhadores terá 13 candidatos, com cinco largando em primeiro lugar e outros oito em segundo lugar.

Publicidade

Desse número, quatro cidades brasileiras terão disputas diretas entre os partidos. Em Cuiabá, o deputado federal Abílio Brunini (PL) liderou o primeiro turno com 126.944 votos (39,61%), seguido pelo deputado estadual Lúdio Cabral (PT), com 90.719 votos (28,31%).

Em Fortaleza, o deputado federal André Fernandes (PL) somou 562.305 votos (40,20%), enquanto o deputado estadual Evandro Leitão (PT) obteve 480.174 votos (34,33%). Já em Pelotas (RS), o ex-deputado federal Fernando Marroni (PT) terminou a disputa da volta inicial com 68.443 votos (39,60%), enquanto o empresário Marciano Perondi (PL), estreante em eleições, ficou com 54.737 votos (31,67%).

Segundo o professor Elton Gomes, da Universidade Federal do Piauí (UFPI), o avanço do PL em redutos tradicionalmente petistas na Região Nordeste contribui para a transformação do PL em uma máquina eleitoral robusta, capaz de competir em pé de igualdade com o PT.

Quatro cidades brasileiras terão disputa direta entre PT e PL no segundo turno de 2024.

“Não foi só o carisma ou a retórica de Bolsonaro que fez isso; foi a máquina do PL, que se normalizou na vida política brasileira e se converteu em uma estrutura eleitoral eficiente, como um dia o PT também já foi. Essa organização permitiu ao PL vencer prefeituras em grandes capitais e cidades do Nordeste, dando ao partido uma base importante de recursos e visibilidade para as próximas disputas eleitorais", analisou Gomes.

Publicidade

Ele acrescenta explicando que a mudança de direção do eleitorado nordestino, que se aproxima mais de opções de direita e centro, representa uma transição na "janela de Overton" , pela qual novas perspectivas políticas estão se tornando aceitáveis em uma região historicamente alinhada à esquerda.

O professor pontua também que a base estabelecida pelo PL no Nordeste não apenas fortalece o partido localmente como abre oportunidades para novos candidatos conservadores em 2026, impulsionados pelo apoio logístico e financeiro de um partido que agora é central na política nacional.

Pouco engajamento de Lula pode explicar resultado do PT

Em discurso oficial, o Partido dos Trabalhadores celebra a conquista de novas prefeituras. Em 2020, a legenda elegeu 183 prefeitos, o pior resultado desde 2016 — quando o partido havia eleito 600 gestores municipais. Ao justificar os números deste ano, a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PT), afirmou que a sigla “não irá reproduzir métodos sectários” da direita.

“Obviamente que a gente não usa os mesmos recursos, nem as mesmas formas que eles utilizam para ganhar redes, com discurso fácil, com discurso que leva as pessoas a achar que qualquer um pode fazer o que eles fazem, com mentiras. Isso nunca foi uma prática nossa e nunca será”, disse a parlamentar em entrevista ao site UOL.

Entretanto, o sentimento interno da legenda é que Lula poderia ter participado mais ativamente da campanha em cidades consideradas prioritárias. A campanha do deputado federal Guilherme Boulos (Psol) à prefeitura de São Paulo é um exemplo citado por quem acompanha o partido.

Publicidade

Apesar de participar de programas eleitorais, Lula esteve com o deputado para eventos de campanha somente em dois dias: em 24 de agosto, quando participou de dois comícios; e em 5 de outubro, na “Caminhada Arrancada da Vitória” — último ato de campanha de Boulos.

Avanço do PL de Bolsonaro em redutos de Lula fortalece articulações para 2026

O crescimento do partido de Bolsonaro nas eleições municipais de 2024 em regiões tradicionalmente petistas e de Lula indica uma nova dinâmica nas futuras eleições estaduais e federais, consolidando a base da direita e criando novos desafios para a sigla de Lula, conforme analisado por Adriano Cerqueira, professor do Ibmec de Belo Horizonte.

“Esses resultados do avanço do PL sobre antigos redutos do PT vão impactar diretamente nas eleições de 2026, porque vai ser a base para as articulações nos estados”, aponta Cerqueira, ressaltando que o fortalecimento das bases locais com prefeitos e vereadores alinhados ao PL dará um peso estratégico importante nas disputas estaduais e presidenciais.

Além disso, o avanço do PL se diferencia pelo posicionamento ideológico mais rígido, contrastando com o pragmatismo de PSD e MDB, que adotam posturas mais flexíveis, segundo o professor. “O PL é hoje a marca de direita mais visível no principal polo de oposição ao PT”, destaca Cerqueira.

No campo progressista, o PSB surge como novo articulador político, “reivindicando a liderança dentro da esquerda por conta do seu melhor resultado relativo nas eleições municipais deste ano”, acrescenta.

Publicidade

Viagens de Bolsonaro contribuíram para desempenho do PL

Desde que voltou dos Estados Unidos, após ser derrotado nas eleições de 2022, Bolsonaro passou a articular em Brasília o avanço da legenda em diversos estados. Ao lado de Michelle Bolsonaro, o casal viajou às cinco regiões do país, chegando a redutos de Lula, como Pernambuco, Bahia, Ceará e demais estados do Nordeste.

No início, os eventos tinham caráter apenas de apoio ao ex-presidente, mas, à medida que a campanha se aproximava, Bolsonaro passou a impulsionar filiações de pré-candidatos e prefeitos interessados em disputar pelo PL. Na avaliação do cientista político Juan Carlos, diretor-executivo do Ranking dos Políticos, as visitas do ex-mandatário do país colocaram em evidência a capacidade de articulação da direita pelo país.

“As viagens de Bolsonaro, principalmente durante seu mandato, ajudaram a construir sua imagem e a expandir a base de apoio em regiões tradicionalmente petistas, como o Nordeste. Essa estratégia de presença física nos redutos do Lula, aliada a um discurso direcionado ao público local e ao uso de recursos federais em obras e programas, certamente contribuiu para o resultado eleitoral observado agora”, disse o diretor-político do Ranking dos Políticos.

Ele também afirmou que “o fortalecimento do PL nessas eleições mostra que a estratégia de Bolsonaro de romper a bolha e adentrar nos redutos petistas deu frutos eleitorais, ainda que em um cenário de alta polarização”.