Faltando 11 dias para o primeiro turno das eleições 2024, o cenário aponta para a preferência do eleitorado à ala do "centrão" em 13 das 26 capitais brasileiras.Mesmo com a polarização entre o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) exercendo pressão nas disputas municipais, o grupo de partidos sem ideologia política definida pode continuar dando as cartas em pelo menos 10 capitais.
O levantamento feito pela reportagem da Gazeta do Povo considerou pesquisas de cenário eleitoral publicadas ao longo das últimas semanas e abarcou institutos como Datafolha, Quaest, AtlasIntel e Real Big Data. As pesquisas não determinam um resultado, mas espelham o cenário eleitoral no momento em que foram feitas, a partir de metodologias próprias.
Nesse contexto, os candidatos abaixo apresentaram, até o momento da publicação desta matéria, intenções de voto que possibilitam a vitória já no dia 6 de outubro.
- Boa Vista (RR): Arthur Henrique (MDB) - Centrão
- Florianópolis (SC): Topázio Neto (PSD) - Centrão
- João Pessoa (PB): Cícero Lucena (PP) - Centrão
- Macapá (AP): Dr. Furlan (MDB) - Centrão
- Maceió (AL): João Henrique Caldas (PL) - Direita
- Palmas (TO): Janad Valcari (PL) - Direita
- Porto Velho (RO): Mariana Carvalho (União Brasil) - Centrão
- Recife (PE): João Campos (PSB) - Esquerda
- Rio de Janeiro (RJ): Eduardo Paes (PSD) - Centrão
- Salvador (BA): Bruno Reis (União Brasil) - Centrão
- São Luís (MA): Eduardo Braide (PSD) - Centrão
- Teresina (PI): Sílvio Mendes (União Brasil) - Centrão
- Vitória (ES): Lorenzo Pazolini (Republicanos) - Centrão
Analistas ouvidos pela Gazeta do Povo argumentam que a maleabilidade ideológica dos partidos permite que as siglas adaptem o discurso de acordo com as necessidades do eleitorado. Outro fator considerado é que esse grupo político foca sua atuação em pautas mais ligadas ao dia a dia da população, como infraestrutura e mobilidade, o que lhes concede vantagem política.
Essa vantagem pode ser vista nos números. PSD, MDB, PP e União Brasil lideram a lista de partidos com mais prefeituras pelo país. O PSD de Gilberto Kassab possui 968 prefeituras, enquanto a legenda do ex-presidente Michel Temer soma 838 municípios. PP e União possuem 712 e 564 prefeituras - respectivamente.
Centrão se fortalece nas capitais e projeta poder para 2026
“O centrão tem vantagem nas eleições municipais de 2024 e, se isso se confirmar, o bloco pode consolidar seu poder para 2026”, afirma o cientista político Elton Gomes, professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI). Segundo ele, as prefeituras funcionam como uma plataforma de projeção de poder, sendo fundamentais para eleições estaduais e nacionais, além de permitirem a execução de orçamentos e a ampliação de capacidades eleitorais.
Gomes destaca que partidos como União Brasil, PSD e MDB têm maior capacidade de se firmar nas eleições municipais pela baixa adesão a um projeto ideológico, o que permite uma adaptação do discurso de acordo com a situação. “Esses partidos se adaptam facilmente ao cenário político vigente, apoiando o governante ou o candidato com maior chance de vencer, seja ele de esquerda ou de direita”, afirma.
Políticos do centrão estão interessados muito mais em participar do governo, ter orçamento e cargos do que na defesa de princípios e propostas partidárias
Cientista político Elton Gomes, professor da Universidade Federal do Piauí
Para o analista político, o centrão tem uma característica de "pragmatismo político", que facilita sua inserção nos governos, independentemente de alinhamentos ideológicos. "Eles estão interessados muito mais em participar do governo, ter orçamento e cargos do que na defesa de princípios e propostas partidárias", completa Gomes.
Centrão de hoje é mais estratégico e menos fisiológico
Para o cientista político Adriano Cerqueira, docente do Ibmec de Belo Horizonte, o centrão passou por uma evolução significativa nas últimas décadas. "Os partidos que antes eram pequenos e trocavam seus votos por cargos e verbas agora estão mais focados em conquistar prefeituras e governos estaduais, além de se tornarem peças-chave para alianças presidenciais", avalia.
Ele observa que legendas como União Brasil e PL, que surgiram de fusões e mudanças estratégicas, ocupam hoje um espaço que antes pertencia ao PSDB e ao MDB. “O PL, por exemplo, com o Bolsonaro, se transformou em um partido mais ideológico e de direita, deixando de ser apenas uma legenda fisiológica, como era no início do século”, explica.
Cerqueira também comenta que partidos especialmente de centro-direita estão mais fortalecidos nas capitais, o que pode ser decisivo para as eleições de 2026. "Os resultados das eleições municipais vão definir quais partidos ganharão força, e é provável que partidos mais à direita e centro-direita tenham papel determinante, inclusive na escolha do futuro presidente da Câmara e na disputa presidencial", pontuou.
Emendas possuem papel central no desempenho eleitoral do centrão
Como a Gazeta do Povo mostrou, as emendas parlamentares são componente vital para a articulação política dos parlamentares do Centrão. De janeiro a julho deste ano, 9 das 10 prefeituras que mais receberam “emendas pix” são controladas pelo centrão. A exceção é Guararema, em São Paulo, governada pelo PL, o principal partido de oposição ao governo. Confira:
- MACAPÁ-AP: R$ 44.391.815,83 - Prefeito: Dr. Furlan (MDB)
- COARI-AM: R$ 33.648.764 - Prefeito: Keitton Pinheiro (PP)
- CORAÇÃO DE MARIA-BA: R$ 20.282.398 - Prefeito: Kley Carneiro Lima (PP)
- COTIA-SP: R$ 18.590.076 - Prefeito: Rogério Franco (PSD)
- SENA MADUREIRA-AC: R$ 18.582.668 - Prefeito: Mazinho Serafim (Podemos)
- CARAPICUÍBA-SP: R$ 18.285.054 - Prefeito: Marcos Neves (PSDB)
- SÃO PAULO-SP: R$ 16.343.729 - Prefeito: Ricardo Nunes (MDB)
- OSASCO-SP: R$ 16.084.268 - Prefeito: Rogério Lins (Podemos)
- SÃO MIGUEL DO GUAMÁ-PA: R$ 15.249.610 - Prefeito: Eduardo Pio X (MDB)
- GUARAREMA-SP: R$ 15.118.900 - Prefeito: Zé do PL (PL)
Nesse tipo de transferência, as emendas são enviadas diretamente ao destinatário, sem a necessidade de especificar para que os recursos devem ser utilizados, como ocorre com aquelas destinadas a fundos municipais de saúde ou viários. A verba entra na conta do município sem uma finalidade determinada, podendo ser utilizada pela prefeitura da forma como o prefeito achar melhor.
Além da disputa municipal, as emendas estão no centro da disputa entre Legislativo, Executivo e Judiciário. Desde o ano passado, Congresso e governo protagonizam uma queda de braço pelo controle das verbas do Orçamento da União. Hoje, elas totalizam R$ 49 bilhões, um quarto do orçamento federal.
Em agosto, o ministro Flávio Dino determinou a suspensão do pagamento de todas as emendas impositivas, aquelas que o governo é obrigado a pagar, até que o mecanismo de transferência de verbas seja tornado mais transparente. O argumento do STF é que não havia transparência suficiente sobre quem mandou cada emenda e como elas foram usadas.
A medida foi vista por integrantes do Congresso como uma jogada do governo para reaver os recursos, visando dois objetivos: compor o orçamento para o arcabouço fiscal e limitar os recursos da União para parlamentares que não votam com o governo — ação que pode limitar o desempenho político de adversários nas eleições municipais.
Centrão vira alvo da oposição no Congresso e nas eleições
Nos últimos dias, o centrão virou alvo da oposição por conta do pedido de impeachment contra o ministro Alexandre de Moraes, do STF, que se encontra nas mãos do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD). Por ser responsável pela abertura do processo contra o magistrado, parlamentares do PL realizaram uma campanha nas redes sociais contra a sigla de Kassab. O pedido de cassação de Moraes, firmado por 152 deputados, tem a adesão de 36 senadores. Faltam cinco votos para o Senado constituir maioria simples.
Em entrevista ao programa Entrelinhas, o deputado Eduardo Gayer (PL-GO) criticou o PSD, alegando ser “o partido mais perigoso e que mais está ajudando o Brasil a se transformar em uma ditadura”. Na mesma linha, o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) pontuou que o partido presidido por Kassab detém três ministérios (Agricultura, Pesca e Minas Energia) no governo Lula. Ele lembra que a sigla foi um dos grandes fiadores da eleição do ministro Flavio Dino para uma vaga no STF.
Apesar da campanha contra o PSD, o Partido Liberal possui vínculos com a sigla de Kassab no pleito deste ano. O próprio Nikolas Ferreira, na última segunda-feira (23), declarou apoio à candidatura de Tiago Amaral (PSD-PR) à prefeitura de Londrina, cidade do interior do Paraná. O evento, organizado pelo PL estadual, contou com a presença de lideranças conservadoras, como os deputados federais Filipe Barros (PL-PR) e Fernando Giacobo (PL-PR), presidente da sigla no Paraná.
O caso não é isolado. De acordo com levantamento feito pelo site Poder360, PL possui 846 coligações com o PSD. Em 241 candidaturas, os partidos possuem candidatos a prefeito e vice-prefeito juntos.
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