A disputa paralela nas eleições municipais 2024 entre o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União), e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que apoiavam candidatos distintos na capital e em outra cidade importante do interior chegou ao fim após dois turnos acirrados. E foi Caiado quem venceu.
Em Goiânia, Sandro Mabel (União) derrotou Fred Rodrigues (PL) com 55,53% dos votos. Já em Aparecida de Goiânia, foi Leandro Vilela (MDB) quem saiu vitorioso das urnas: com 63,6% dos votos, ele venceu do Professor Alcides (PL).
A disputa da prefeitura de Goiânia entre Mabel e Rodrigues representou muito mais do que o controle da capital goiana — refletiu o embate Caiado e Bolsonaro de olho na corrida presidencial de 2026. Caiado, que conta com mais de 70% de aprovação do eleitor de acordo com pesquisa AtlasIntel para Aparecida de Goiânia divulgada no dia 30 de setembro, lançou-se como pré-candidato à presidência da República e vê no pleito municipal uma chance de fortalecer sua imagem e influência no espectro da direita brasileira. Ele não só lançou a candidatura de Mabel como participou ativamente de atos de campanha, sobretudo na reta final.
O ex-presidente, que ainda busca reverter a inelegibilidade, apoiou Rodrigues e trabalha em formas de reafirmar o papel como líder do campo conservador. Ele optou por não ir para o Rio de Janeiro, onde vota, para acompanhar Fred Rodrigues à urna em Goiânia, onde também acompanhou a apuração. O gesto simbólico indicou a prioridade da capital para o projeto político futuro de Bolsonaro.
Em Aparecida de Goiânia, na mesma linha, Caiado apoiou Vilela contra Professor Alcides, candidato de Bolsonaro, consolidando a disputa de poder entre as duas lideranças da direita. Ex-aliados, Caiado e Bolsonaro romperam durante a pandemia de Covid-19, quando o governador de Goiás, que é médico, criticou a atuação do então presidente para lidar com a situação e divergiu de uma série de posturas dele.
O peso das forças locais na eleição para prefeito
A cientista política Priscila Lapa avalia que, numa eleição municipal, as forças locais ainda importam mais para a migração de votos. “A lógica da eleição municipal permanece sendo a da correlação de forças locais, com peso mais expressivo do que a conjuntura nacional. O resultado nas capitais sempre é interpretado como preditor do que virá nas eleições estaduais e nacionais, mas o fato é que é muito mais a representação da correlação de forças locais, das lideranças, daqueles que têm capacidade de emprestar sua popularidade e eleger seus aliados", diz ela.
Priscila Lapa complementa que "também há a prevalência do voto de estrutura, a força das máquinas que impulsionam as alianças e a alocação dos recursos”. Na análise da cientista política, a força de Bolsonaro está diluída “nas ideias que ele move" e que esse fator é preponderante aos eleitores que se identificam com o ex-presidente.
"São mais importantes para os eleitores do que a figura do Bolsonaro em si. Isso fez com que candidatos bolsonaristas se elegessem até mesmo rivalizando com Bolsonaro”, observa ela. E completa: “a eleição de 2024 deixou vários apontamentos sobre como as forças políticas precisam para se reestruturar e construir um cenário competitivo para 2026. Algumas lideranças se afirmaram em cima do bolsonarismo e talvez não precisem mais dele para um projeto político maior em 2026”.
Caiado se fortalece pra 2026, mas não para alçar voo solo
O analisa político do Ibmec Adriano Cerqueira avalia que o resultado foi decisivo para o projeto político de Caiado. Para ele, uma eventual derrota do governador de Goiás teria “praticamente inviabilizado a chance para disputar como candidato à presidência”, mas a vitória não garante força suficiente para ganhar do ex-presidente numa disputa nacional — ao menos não sozinho.
“A vitória de Caiado em seu estado lhe dá condições de ter uma base quando começar a corrida eleitoral em 2026. Ele não tem muito lastro fora de Goiás, e o impacto dele no eleitorado nacional é bem menor que o do Bolsonaro”, afirma.
“O que pode acontecer é o Caiado procurar se viabilizar alternativamente a Bolsonaro ou ao lado dele, e se cacifar com as vitórias que teve hoje. Acho que o Caiado sobreviveu como uma liderança regional de um estado importante, que é Goiás, mas isso não lhe dá condições de pensar num voo solo. Ele vai entrar com alguma força nas articulações para 2026, e se for uma candidatura dele própria, será articulando com outros partidos mais ao centro, como o PSD”, opina.
De todo modo, Priscila Lapa observa que a relação tensa entre Caiado e Bolsonaro já teve idas e vindas. "Os redutos goianos são importantes para o futuro político de Bolsonaro, por representarem celeiros clássicos do bolsonarismo. É o mesmo que o Nordeste para o lulismo.”
- Metodologia AtlasIntel Aparecida de Goiânia: 1.200 entrevistados pela AtlasIntel entre os dias 24 e 29 de setembro de 2024. A pesquisa foi contratada por Portal 6 Comunicação Ltda. Confiança: 95%. Margem de erro: 3 pontos percentuais. Registro no TSE nº GO-02163/2024.