O triunfo nas eleições de candidatos aliados a governadores pelas prefeituras Brasil afora aponta para a força regional dos líderes políticos, que comandam os estados com influência sob o eleitorado para transferência efetiva de votos aos apadrinhados dos municípios.
Apesar da polarização e nacionalização das disputas locais, em consequência do acirramento político com ápice no segundo turno de 2022 entre Lula (PT) e Jair Bolsonaro (PL), alguns governadores assumiram o protagonismo na construção das coligações e na campanha vencedora. Assim, deixam as eleições 2024 com maior capital político, a ser testado pelas urnas em 2026, seja como candidato ou então na troca apoio partidário.
Entre os nomes ventilados como candidatos a presidente da República na representatividade em meio ao espectro da direita e da centro-direita estão os governadores de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP); de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil-GO); e do Paraná, Ratinho Junior (PSD-PR). O trio apoiou os prefeitos eleitos nas capitais São Paulo, Goiânia e Curitiba e ofuscaram a participação de Bolsonaro na corrida eleitoral dos respectivos estados.
O caso mais evidente é do governador goiano, que entrou em rota de colisão com o ex-presidente a partir da reta final do primeiro turno, quando o candidato do União Brasil em Goiânia, Sandro Mabel, passou a ser criticado por Bolsonaro durante atos de campanha em apoio ao candidato Fred Rodrigues (PL-GO).
No segundo turno, prevaleceu a força de Caiado, reeleito pelo eleitorado goiano em 2022 e que mantém alta aprovação na gestão estadual. A vitória de Caiado sobre Bolsonaro se repetiu no segundo turno em Aparecida de Goiânia, onde o aliado Leandro Vilela (MDB-GO) foi eleito prefeito.
Em Curitiba, o grupo político de Ratinho Junior com a chapa de Eduardo Pimentel (PSD-PR) - incluindo a indicação de Paulo Martins (PL-PR) para a vaga de vice com o aval de Bolsonaro - teve que superar o fator surpresa apresentado pela novata Cristina Graeml (PMB), que se tornou a representante da direita antissistema e atraiu votos de parcela dos eleitores de Bolsonaro. Cristina teve direito, até, ao apoio informal do ex-presidente da República.
Mesmo assim, prevaleceu a presença de Ratinho Junior na campanha e com direito a participação no horário eleitoral, decisivas na transferência de votos ao vice-prefeito da capital e ex-secretário estadual. O governador foi reeleito em 2022 e conta com alta aprovação dos paranaenses, sendo que 41% dos municípios do estado serão comandados por prefeitos do PSD a partir de 1º de janeiro.
“As eleições nos estados e municípios obedecem a uma dinâmica diferente em relação ao pleito federal. Há uma ênfase, de fato, na capacidade do governador ou do prefeito em transferir votos para os sucessores ou aliados. Isso explica porque as lideranças nacionais são relativizadas no âmbito municipal”, comentou o professor do curso de Ciência Política e do mestrado em Direito do Centro Universitário Internacional Uninter Doacir Quadros.
Alinhado a Bolsonaro, o governador Tarcísio de Freitas foi o principal fiador da campanha de reeleição do prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB-SP), que chegou a ser ameaçado no primeiro turno pelo empresário e influencer Pablo Marçal (PRTB-SP), que cresceu entre os eleitores de direita com discurso combativo e antissistema. O governador paulista criticou Marçal e passou a participar intensivamente dos atos de campanha de Nunes até a vitória sobre Guilherme Boulos (Psol-SP) no segundo turno.
No PL, o governador catarinense Jorginho Mello conseguiu eleger 90 prefeitos com o apoio de Bolsonaro no estado, que é considerado o mais conservador do país. Na capital Florianópolis, o PL indicou a candidata a vice Maryanne Mattos na chapa de reeleição do prefeito Topázio Neto (PSD-SC), que teve a aprovação da maioria do eleitorado para o segundo mandato ainda no primeiro turno.
Entre os governadores cotados para a corrida eleitoral em 2026 em oposição a Lula, caso Bolsonaro não reverta a inelegibilidade imposta por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o mineiro Romeu Zema (Novo-MG) foi o que enfrentou mais dificuldades nas eleições municipais e amargou uma derrota dupla em Belo Horizonte.
Na capital de Minas Gerais, Zema apoiou o candidato Mauro Tramonte (Republicanos-MG) e indicou a correligionária Luísa Barreto como vice na chapa, mas os votos da direita mineira foram capturados por Bruno Engler (PL-MG). No segundo turno, o governador apoiou o candidato de Bolsonaro contra à reeleição do prefeito Fuad Noman (PSD-MG), que venceu a disputa em BH.
Na avaliação de Quadros, a direita conseguiu uma projeção significativa com os resultados das eleições municipais no Brasil, mas possui lideranças “extremamente personalistas”, como os governadores com alto capital político estadual, além do ex-presidente Bolsonaro e do outsider Pablo Marçal.
“Eu presumo que a direita não tem uma liderança que consiga convergir todos os interesses em uma única candidatura [a presidente da República] em razão dos diferentes tipos de eleitores que exigem um guarda-chuva muito grande”, comentou o cientista político.
"Chance só tenho eu", diz Bolsonaro sobre governadores na disputa contra Lula
Em entrevista à revista Veja publicada na última sexta-feira (1º), Bolsonaro afirmou que é o único nome da direita com capacidade de enfrentar o presidente Lula nas urnas em 2026 e adiantou que deve lançar a candidatura para voltar ao comando do país. “Eu pretendo disputar 2026. Não tem cabimento a minha inelegibilidade. […] As alternativas são o Parlamento, uma ação no STF, esperar o último momento para registrar candidatura e o TSE que decida. Não sou otimista, sou realista, estou preparado para qualquer coisa", respondeu.
O ex-presidente elogiou o governador de São Paulo, mas afirmou que ele próprio "não está morto", politicamente, na corrida presencial. "Falam em vários nomes, Tarcísio, Caiado, Zema. O Tarcísio é um baita gestor. Mas eu só falo depois de enterrado. Estou vivo. Com todo o respeito, chance só tenho eu, o resto não tem nome nacional. O candidato sou eu", declarou.
Aliados de governadores de MDB e PT vencem eleições nas regiões Norte e Nordeste
O governador do Pará, Helder Barbalho (MDB-PA), saiu vitorioso das eleições em Belém após lançar a candidatura do primo e ex-secretário estadual Igor Normando (MDB-PA), que rompeu com a polarização entre Psol e PL na corrida pela prefeitura da capital paraense.
Aliado de Lula, o clã Barbalho não contou com o apoio do PT, que tinha o compromisso de fazer parte da coligação pela reeleição do prefeito Edmilson Rodrigues, único psolista no comando de uma capital. A alta rejeição deixou o prefeito de fora do segundo turno, disputado por Normando e pelo deputado federal Eder Mauro (PL-PA), que teve o apoio de Bolsonaro na campanha.
Além do governador, a vitória de Normando teve a participação do ministro das Cidades, Jader Barbalho Filho, presidente do MDB estadual. A sigla foi a segunda a eleger mais prefeito no país, com total de 864 cidades. Apesar das alianças com o PL de Bolsonaro em capitais do Sul e do Sudeste, o clã Barbalho defende que o MDB faça parte de uma coligação pela reeleição de Lula em 2026.
No Nordeste, Fortaleza foi a única capital com vitória petista, mas o governador cearense Elmano de Freitas (PT-CE) não foi o protagonista da eleição do candidato Evandro Leitão. Na campanha polarizada com André Fernandes (PL-CE), a candidatura petista contou com o apoio de Lula e do ministro da Educação e ex-governador cearense, Camilo Santana, com imagens frequentes dos aliados de Brasília no programa eleitoral de Leitão. O petista foi eleito com 50,38% dos votos válidos no segundo turno, com uma diferença de apenas 10,8 mil em relação ao candidato apoiado por Bolsonaro.
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