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Voto de evangélicos é disputado na eleição de Recife.
À esquerda, o prefeito do Recife, João Campos (PSB); à direita, Gilson Machado Neto (PL)| Foto: Montagem Gazeta do Povo (Rodolfo Loepert/PCR e Isac Nóbrega/Presidência da República)

A disputa pela prefeitura de Recife (PE) está colocando o segmento evangélico em lados opostos dos espectros políticos. Representando a esquerda, o prefeito João Campos (PSB) se aproxima de lideranças para ganhar a simpatia do público. Já pela direita, o ex-ministro do Turismo Gilson Machado Neto (PL) assegurou a candidatura de vice para Leninha Dias, empresária evangélica e ex-diretora da rádio Maranata.

O racha dentro do segmento ocorreu quando a rádio acusou a campanha de Machado de uso indevido da imagem da empresa durante o anúncio de Leninha como candidata na chapa do Partido Liberal, ocorrido em 2 de agosto.

"Está aqui ao meu lado uma vice-prefeita que não será decorativa na minha chapa. A Leninha Dias foi escolhida para ser uma mulher guerreira, uma mulher que, feito eu, sofreu na vida para poder conseguir as coisas. É como se diz: uma self-made woman", afirmou Gilson Machado.

Segundo o diretor da rádio Maranata, André Carvalho, o veículo não autorizou o uso de seu nome ou de colaboradores durante a campanha. Em nota enviada ao blog do jornalista Jamildo Melo, o diretor afirmou que a “Maranata sempre se pautou pela ética e compromisso com a verdade e não aceitará jamais que seu nome ou sua marca sejam utilizados de forma irresponsável na tentativa de se autopromoverem”.

Por outro lado, na última sexta-feira (16), primeiro dia de campanha eleitoral, Carvalho declarou apoio ao prefeito socialista. Em comunicado enviado à imprensa local, ele afirmou que esteve ao lado de João Campos desde 2020 e que não poderia ser “incoerente”.

“Apesar de entender que ainda há coisas que precisam ser feitas, creio que, dando mais quatro anos ao atual prefeito, ele continuará executando um ótimo trabalho para o Recife. Por esses motivos, João Campos tem o meu apoio”, disse o diretor da rádio Maranata.

O peso do voto evangélico pode ser sentido quando a vereadora Michelle Collins (PP-PE), atualmente substituindo a deputada Clarissa Tércio (PP-AL) na Câmara dos Deputados, foi aventada como possível candidata à prefeitura do Recife.

Antes das convenções partidárias, a sigla comandada pelo deputado federal Eduardo da Fonte (PP-PE) chegou a estudar a viabilidade da candidatura. Sendo mulher e evangélica, a avaliação era de que a parlamentar teria mais apelo junto ao eleitorado local. No entanto, da Fonte preferiu apoiar Daniel Coelho (PSD), candidato da governadora Raquel Lyra (PSDB).

Esquerda usa pragmatismo para se aproximar de religiosos

A análise sobre o comportamento do voto evangélico na eleição da capital pernambucana revela uma situação complexa, no qual as alianças políticas locais não seguem uma divisão clara entre esquerda e direita. Segundo o cientista político Arthur Leandro, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a figura de João Campos não representa uma esquerda tradicional, mas sim uma articulação política que transcende essa categorização simples.

"João Campos não é exatamente esquerda aqui. Ele se coloca como um player fundamental na política pernambucana, articulando diversas tendências políticas. Ele pode jogar nos dois campos."

Ele acrescenta que o apoio de evangélicos a Campos mostra que o prefeito busca flexibilizar sua base em nome de alianças locais. "A divisão entre os campos políticos é mais fluida do que parece. João Campos, com sua articulação política, demonstra que o voto evangélico pode se dividir entre candidaturas que, apesar de aparentarem antagonismo, operam dentro de um espectro político pragmático e adaptável."

Candidatos precisam pensar como evangélicos pensam

A cientista política Priscila Lapa destaca que o eleitorado evangélico tem uma importância estratégica crescente na disputa política, tanto em termos quantitativos quanto qualitativos. Segundo Lapa, o aumento do número de eleitores que se identificam como evangélicos tem levado os candidatos a traçarem estratégias com base nas características únicas desse grupo.

“O candidato que vai atuar para atrair os votos desse segmento precisa parecer e pensar como esse segmento, porque não há margem para diálogo”, afirmou. Lapa também aponta que os evangélicos desenvolveram uma capacidade particular de transitar entre o diálogo presencial e o digital, utilizando amplamente as mídias sociais para difundir crenças e valores.

“Eles já usam intensivamente esses meios para difundir essas crenças e essas verdades, então a utilização desses canais para fins político-eleitorais se tornou quase que uma consequência natural”, observou. Além disso, ela sublinha que esse eleitorado busca representantes que compartilhem integralmente de suas pautas e visões de mundo, tornando difícil a adesão a candidatos que não se alinhem completamente com suas expectativas.

Evangélicos disputam segunda maior cidade de Pernambuco

Em Jaboatão dos Guararapes, segunda maior cidade do estado e localizada na Região Metropolitana do Recife, a disputa entre evangélicos é representada por um embate entre duas famílias: os Ferreira e os Tércio.

Buscando a reeleição, o prefeito Mano Medeiros é apoiado pelos Ferreira, cujos expoentes são o deputado federal André Ferreira (PL-PE), o deputado mais votado em 2022, e o ex-prefeito de Jaboatão Anderson Ferreira (PL). Apesar de serem um grupo político consolidado no estado, a família ligada à Assembleia de Deus voltou aos holofotes ao apoiar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Do outro lado, a deputada federal Clarissa Tércio (PP-PE) é outro expoente da política pernambucana, também proveniente da Assembleia de Deus. Sendo a segunda parlamentar mais votada na última eleição, ela disputa com Mano o apoio dos evangélicos de Jaboatão.

Comentando a situação, Priscila Lapa explica que o crescimento do segmento evangélico - e seu avanço em bancadas e cargos executivos - trouxe uma maior fragmentação e competição interna. A divisão de atenção entre os candidatos reflete uma disputa discursiva e de liderança, em que "a divisão é quase que uma consequência do crescimento".

“Quanto mais crescer, mais vai ter divisões. Talvez isso faça muito sentido para eles. Diferentemente do que acontece na Igreja Católica, onde há um poder central muito forte que demanda pautas para a política, o segmento evangélico é todo fragmentado. Essa fragmentação amplia as possibilidades de alianças, mas também fragmenta. Isso pode resultar exatamente no que estamos vendo agora: grupos religiosos dentro do mesmo município e distrito eleitoral disputando o poder", disse a cientista política.

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