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Senador Romário com camisa do América-RJ
Infelidade: PL pode punir Romário, mas legislação não prevê perda de mandato| Foto: Antônio Lacerda/EFE

Os senadores Romário (PL-RJ), Sergio Moro (União-PR) e Cleitinho (Republicanos-MG) desafiam os próprios partidos nas eleições municipais deste ano e são exemplos de como as siglas não conseguem limitar a postura independente de nomes de peso na política nacional. 

O trio de senadores passou a apoiar candidatos adversários às coligações costuradas pelos próprios partidos, que adiam para depois da eleição uma definição sobre o futuro dos filiados mais influentes, o que aponta para o forte personalismo político no país, onde o eleitorado vota muito mais pela identificação com o candidato do que pela representatividade partidária. 

No caso de Romário, a fama precede a política e traz mais independência para os rumos na carreira pública mesmo em contradição ao PL. No campo eleitoral, o ex-jogador da seleção brasileira mostrou postura semelhante à que adotava nos gramados e caminha ao lado do prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD-RJ), candidato à reeleição.

O prefeito é o principal adversário político do deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), aliado de Jair Bolsonaro, que participa diretamente da campanha à prefeitura da capital ao lado dos filhos, o vereador Carlos e o senador Flávio Bolsonaro, ambos do PL do Rio. O apoio público de Romário a Paes abalou a relação conturbada do senador com a família Bolsonaro.

Procurado pela Gazeta do Povo, o Partido Liberal não se manifestou sobre o assunto, no entanto, o deputado federal e presidente estadual da sigla, Altineu Côrtes, disse que a aliança de Romário com Paes é “inaceitável” e classificou o caso como infidelidade partidária. “Discordo da postura do senador Romário e acredito que o assunto será tratado internamente. É inaceitável que qualquer filiado apoie outros candidatos que não sejam do PL”, declarou pela rede social Instagram.

Paes abriu as portas do PSD para Romário, caso o senador deixe o partido de Bolsonaro. “Seria uma enorme honra. Tapete vermelho para ele, e todos nós aqui no Rio em posição de sentido”, disse o prefeito vascaíno em entrevista ao jornal O Globo

Quem também “pulou o muro” no Rio de Janeiro foi o deputado federal Otoni de Paula (MDB-RJ), que deixou a pré-candidatura a prefeito na capital fluminense para apoiar Paes. Apoiador de Bolsonaro, o pastor evangélico e conservador se desentendeu com o PL e com a família do ex-presidente da República, tendo articulado uma aliança própria com o prefeito do Rio, interessado no voto evangélico. Para apoiar Paes, Otoni de Paula afirmou que tinha a garantia que o PT não ocuparia o cargo de vice na chapa à reeleição, o que acabou sendo confirmado com a indicação de Eduardo Cavaliere (PSD-RJ). 

Após as discordâncias entre Otoni e o secretário estadual de Transporte e Mobilidade Urbana, Washington Reis (MDB-RJ), aliado do governador Cláudio Castro (PL-RJ), o partido permaneceu na coligação de Ramagem, apesar de não ter conseguido indicar o nome para a vaga de vice na chapa pura do PL. Procurado, o MDB do Rio também não se manifestou.

O advogado especialista em direito eleitoral Alberto Rollo esclarece que os políticos podem sofrer sanções dos partidos, mas em nenhuma hipótese a perda de mandato, o que é previsto apenas em caso de troca de agremiação política fora do período da janela partidária. “Sob o ponto de vista da lei partidária não dá pra falar em infidelidade partidária. O eventual apoio a adversários políticos pode configurar infidelidade partidária se prevista no estatuto do partido, com punições internas”, explica.

Senador Cleitinho “pula o muro” em BH e apoia Marçal em São Paulo

O senador mineiro Cleitinho contrariou as articulações políticas do partido Republicanos nas eleições municipais em Belo Horizonte e na cidade de São Paulo. No Senado e nas redes sociais, o parlamentar apoiador de Bolsonaro, que usa camisas de times de futebol e boné, tem um discurso combativo e antissistema com inúmeras críticas ao petismo e ao presidente Lula (PT).

A postura contra a “velha política” também entrou em cena na corrida eleitoral pelo comando das duas capitais. Em Belo Horizonte, Cleitinho participou da convenção partidária do Partido Liberal, no início de agosto, e anunciou o apoio ao candidato a prefeito Bruno Engler (PL-MG) às vésperas do lançamento da coligação encabeçada pelo correligionário Mauro Tramonte, que terá como vice Luísa Barreto do Novo, partido do governador mineiro Romeu Zema.

O senador ainda criticou a filiação do ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil ao partido Republicanos. “O Kalil, em 2022, teve o apoio do maior líder da esquerda, que é o presidente Lula. Então, na hora que for fazer uma entrevista com o Kalil pode perguntar para ele: você virou de direita? E pergunta para o Republicanos se ele virou de esquerda”, afirmou durante o lançamento da candidatura de Engler.

Em São Paulo, Cleitinho também foi contra o partido que integra a coligação de Ricardo Nunes (União-SP), apoiado pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) e por Bolsonaro, e declarou apoio ao candidato Pablo Marçal (PRTB-SP) durante encontro no gabinete do parlamentar no Senado. 

“Você vai ser um dos maiores líderes políticos do Brasil. Eu escutei alguém falando que você não tem preparo político. Mas esse preparo político que quase todo mundo tem aqui [em Brasília], o brasileiro não quer mais. É o preparo para roubar, desviar dinheiro e para ser lobista”, disse o senador que apoia Marçal na corrida eleitoral que disputa o comando da capital paulista.

No Paraná, o senador Sergio Moro articula a criação de agências municipais anticorrupção, proposta que foi levada em consideração para o apoio do ex-juiz da Lava Jato aos candidatos nos municípios do estado. “O combate à corrupção, que foi destruído em Brasília pelo governo Lula, será retomado de baixo para cima, passo a passo, com a criação das modernas agências municipais anticorrupção com diretores autônomos e mandatos fixos”, postou Moro no X, anunciando os candidatos que se comprometeram com o projeto.

Entre eles, está o candidato a prefeito de Cascavel pelo PP, Márcio Pacheco, que recebeu apoio de Moro, apesar da aliança do União Brasil com o ex-prefeito Edgar Bueno (PSDB-PR) e da indicação da candidata a vice Suely Frare (União-PR), que completa a chapa encabeçada pelo tucano. 

Em junho, o senador pediu à direção nacional a dissolução de quatro diretórios municipais no Paraná, entre eles, Londrina e Maringá, as duas maiores cidades do interior do estado. A justificativa foi a “insatisfação generalizada” dentro da legenda por conta das definições de nomes feitas de forma “isolada” e “arbitrária” por parte do deputado federal Felipe Francischini, presidente estadual do União. No fim, Moro venceu a queda de braço, o partido não lançou candidato em Maringá e entrou na coligação do deputado estadual Tiago Amaral (PSD-PR) em Londrina.

Voto do brasileiro é personalista, independente dos partidos de candidatos

Na avaliação do cientista político e professor do Ibmec Belo Horizonte Adriano Cerqueira, os senadores são exemplos de “nomes fortes” que possuem projeção sobre os partidos, o que resulta em “autonomia e liberdade” para tomada de decisões.

“Existe um leque de possibilidades, entre elas, a saída do partido levando o prestígio dele para uma outra sigla que seja mais interessante para o projeto pessoal e político. Muitas vezes, o partido até aceita essa independência pelo prejuízo de perder um senador da República”, afirma o cientista político. 

Cerqueira lembra que estudos apontam que aproximadamente 70% do eleitorado vota por identificação com os candidatos e não pelo partido representado. “O voto no Brasil é personalista, apesar de ser proporcional no caso de deputados e vereadores. Com certeza, o brasileiro tem uma postura majoritária na urna. Ou seja, ele vota no candidato independente do partido, o que dá certa autonomia ao político que recebe muitos votos”, analisa ele.

Ainda de acordo com Verqueira, a postura de oposição dentro do partido também pode ser uma sinalização de insatisfação e uma forma de negociação política por cargos e participação na administração pública, em caso de vitória nas urnas do candidato aliado.

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