A cadeirada que o apresentador e candidato a prefeito de São Paulo José Luiz Datena (PSDB) deu no adversário Pablo Marçal (PRTB) não é suficiente para retirar o primeiro da disputa eleitoral. A conduta de agredir alguém fisicamente é violenta e criminosa, mas mesmo as consequências penais do ato não tornariam Datena inelegível.
Nesta segunda-feira (16), Marçal anunciou que pedirá a cassação de Datena. A defesa do tucano rechaçou essa hipótese. “A legislação eleitoral não há previsão de cassação por agressão física. Datena continuará sendo candidato”, disse seu advogado Guilherme Ruiz.
Especialistas em direito eleitoral consultados pela Gazeta do Povo dizem que, embora reprovável, o ato de Datena não implica em cassação do registro de candidatura. “Agressão em debate não é hipótese para cassação de candidatura. Datena pode responder pela prática de crime de lesão corporal, mas não vejo espaço para a cassação do seu registro de candidatura", diz o advogado eleitoral Alexandre Rollo.
Ele explica que as hipóteses para cassação estão expressamente previstas na legislação eleitoral. "São questões como compra de votos, abuso dos poderes político, econômico e dos meios de comunicação social, uso da máquina administrativa, entre outras. Mas agressão em debate eleitoral não figura entre elas”.
Rollo acrescenta que a própria Constituição, ao prever as hipóteses de inelegibilidade, diz que a finalidade desse tipo de punição eleitoral é “proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração”.
“Quem tenta bater em alguém é violento, mas não tem problema de probidade administrativa, o que não significa que a conduta não seja conduta reprovável. Mas não a ponto de o constituinte elevar isso à possibilidade de inelegibilidade. Porque, grosso modo, pensou em casos de desonestidade. É com isso que o constituinte preocupou mais, não se desacato a um policial, ou uma lesão corporal simples, como foi o caso”, diz o advogado.
Datena, de qualquer modo, pode responder pelo crime de lesão corporal, que tem pena pequena, de até um ano de prisão. Mas dificilmente, segundo advogados criminalistas, ele pegaria uma pena assim, porque como o crime é de menor potencial ofensivo, em geral é oferecido ao acusado uma transação penal, um tipo de acordo pelo qual confessa o crime, paga uma quantidade de cestas básicas e se compromete a não repetir a conduta, livrando-se assim da condenação e de seus efeitos.
Se não concordasse com a transação, ele poderia converter a pena de prisão, da condenação, em serviços à comunidade. Só enquanto essa punição durasse – alguns meses, por exemplo – ele ficaria com os direitos políticos suspensos, sendo proibido, com isso, de votar e ser votado.
Uma condenação por lesão corporal, de qualquer forma, não acarreta a inelegibilidade prevista na Lei da Ficha Limpa, pela qual o condenado por um crime, em órgão colegiado (tribunal de segunda instância ou superior), fica impedido de concorrer por oito anos após o cumprimento da pena. Isso porque a lei elenca os tipos de crime que levam à inelegibilidade, delitos mais graves (como aqueles contra o patrimônio, meio ambiente, saúde, lavagem de dinheiro, escravidão, entre outros) e não lesão corporal e semelhantes.
Campanhas estão ficando mais violentas
Advogado eleitoral, Irapuã Santana lamenta o fato de que campanhas estejam ficando mais violentas, a ponto de candidatos chegarem a agressões físicas. Considera que, provavelmente, haveria apelo popular e vontade política no Congresso para aprovar lei que preveja inelegibilidade para esses casos. Porém, ele diz que isso, por si só, não deixaria as campanhas melhores, no sentido de propositivas e voltadas para solução de problemas coletivos.
"Acho que a resposta tem que vir nas urnas, porque isso traz uma responsabilidade maior para o eleitor. Mas quando a gente fala em agressão ou em difamação, por exemplo, já existe uma legislação penal. No caso do Marçal, é uma lesão corporal leve. Não traz prisão, mas pode haver um processo civil, por danos morais. Mas a inelegibilidade cumpriria as funções que as pessoas querem? A gente precisa muito investir, para além da legislação, numa campanha de esclarecimento e amadurecimento do eleitorado”, diz Santana.
Para ele, agressões desse tipo, no calor de um debate, acabam sendo aproveitadas eleitoralmente, seja pelo agressor, seja pela vítima. “Muita gente gosta da postura do Pablo Marçal de colocar os outros na parede. E muitos gostaram do Datena não ter sangue de barata. Se eles forem retirados, vão entrar outros no lugar. Muda as peças sem mudar o tabuleiro.”
Em nota sobre a agressão de Datena em Marçal, o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, que julga as irregularidades de campanha dos candidatos a prefeito no estado, manifestou repúdio a “qualquer tipo de ofensa ou violência entre os atores do processo eleitoral, sejam candidatos, eleitores, partidos políticos e instituições em geral”.
“O TRE-SP defende um debate de ideias civilizado, respeitoso e pacífico, a fim de que o eleitorado obtenha as informações necessárias para realizar a escolha de seus candidatos e candidatas de forma consciente e responsável, contribuindo, dessa forma, para a consolidação da nossa democracia”, afirmou.
Muita gente gosta da postura de Marçal de colocar os outros na parede. E muitos gostaram do Datena não ter sangue de barata. Se eles forem retirados, vão entrar outros no lugar. Muda as peças sem mudar o tabuleiro.
Advogado eleitoral Irapuã Santana
Nesta segunda-feira (16), dia seguinte à cadeirada de Datena em Marçal, o deputado federal Sanderson (PL-RS) apresentou um projeto de lei que, além impor pena de quatro anos de prisão para o crime de lesão corporal contra candidato, prevê o cancelamento do registro de candidatura ou do diploma que oficializou o mandato do candidato que agrediu outro. “O objetivo do projeto é manter o decoro dos debates eleitorais e coibir qualquer tipo de agressões contra candidatos a cargos eletivos”, justificou o parlamentar.
A RedeTV!, que promoverá o novo debate entre os candidatos a prefeito de São Paulo na manhã desta terça-feira (17), adotou uma medida preventiva: pregar as cadeiras no chão com parafusos.
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