Em entrevista à Gazeta do Povo, Ricardo Senese (UP) defende a estatização dos serviços e a equiparação de salários entre prefeitos, vereadores e os demais funcionários públicos, como professores| Foto: Wildally Souza/Divulgação UP
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Ricardo Senese, de 37 anos, é candidato à prefeitura de São Paulo pelo partido Unidade Popular pelo Socialismo (UP). Formado em um curso técnico têxtil pelo Senai, ele ingressou no curso de Ciência e Tecnologia na Universidade Federal do ABC e trancou a faculdade após se envolver no projeto de legalização do partido UP e passar no concurso público do metrô, onde trabalha há 13 anos.

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Nascido em São Paulo, Ricardo Senese passou a infância no bairro de São Miguel Paulista, na zona leste da capital. Ricardo é filho de mãe baiana, ex-operária que também atuou no setor de serviços, e pai paulistano, que trabalhou durante 40 anos na Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano (Emplasa), extinta durante o governo de João Dória.

A militância política começou na União da Juventude Rebelião (UJR), organização a favor do poder popular e do socialismo. Senese chegou a ser diretor da União Nacional dos Estudantes (UNE) e ingressou no Movimento Luta de Classes (MLC). Em entrevista à Gazeta do Povo, o candidato falou sobre as propostas para a cidade de São Paulo, afirmou que "Pablo Marçal" é uma prioridade na campanha e que tem conseguido converter votos de eleitores insatisfeitos com a política para o UP. Ele também defendeu a equiparação do salário do prefeito com o salário de uma professora de creche.

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Todos os candidatos à prefeitura de São Paulo foram convidados pela Gazeta do Povo para entrevista.

Confira a entrevista com o candidato Ricardo Senese

Como o senhor avalia essa campanha eleitoral e os ataques mútuos entre os candidatos à prefeitura de São Paulo? 

Em primeiro lugar, é um prazer realizar essa entrevista. Consideramos muito importante para a cidade a nossa candidatura, a Unidade Popular vem fazendo um importante trabalho de base, com visita às casas das pessoas, panfletagens e conseguindo construir, mesmo sem as mesmas condições que partidos adversários, um grande trabalho popular.

Então esse tipo de espaço para nós ajuda a diminuir essa distância, muito ligada ao poderio financeiro. A gente se considera realmente enfrentando os poderosos e defendendo o nosso povo trabalhador. Nós entendemos que o começo da campanha expressa essa desigualdade no processo eleitoral. A cláusula de barreira organizada pelos partidos grandes impede que partidos como o nosso tenham uma condição mais equilibrada na eleição para apresentar ideias, participar dos debates e ter o horário eleitoral. Inclusive a gente é contra esse valor do fundo eleitoral de R$ 5 bilhões. Achamos que esse valor é absurdo, e o começo da campanha expressou também essa injustiça. Para nós, seria melhor que as campanhas fossem equilibradas, isso daria uma melhor condição para o povo decidir o que realmente quer da cidade.

Eu estava vendo uma pesquisa, 45% das pessoas dizem que mudariam de voto, e a tendência é que tenha uma grande abstenção nesta eleição, considerando voto nulo, voto em branco e realmente não votar, porque as candidaturas majoritárias não estão expressando, nesse início, uma ligação com o interesse popular de mudar a situação da cidade. Nós estamos marcados por uma desigualdade e uma condição muito difícil para as pessoas viverem. A situação do transporte público superlotado, as pessoas levam de duas a três horas para ir e voltar do trabalho. A educação ruim e a saúde com muita dificuldade também. As candidaturas não estão expressando ligação com o povo e estão, na prática, fazendo um debate muito rebaixado, longe do interesse popular, de propostas, e a população não está vendo como isso vai resolver o problema de cada um.

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O problema da cracolândia em São Paulo é complexo e envolve o crime organizado, com destaque para o PCC. Qual é a proposta do senhor para resolver essa questão, considerando a força crescente dessas facções?

Do nosso ponto de vista, a questão da cracolândia é global e envolve a área social, a área de saúde e uma área humanitária. Nossa visão é que precisamos agir globalmente na cidade, mudando a sua estrutura. O problema da cracolândia não vai se resolver com mais repressão e violência, como temos visto por parte da GCM [Guarda Civil Metropolitana], que cometeu agressões absurdas. A primeira questão é essa: termos uma visão global para ir reduzindo ao longo do tempo essa situação e ajudando as pessoas a saírem da situação de dificuldade.

"Para combatermos o tráfico de drogas como um todo é preciso fazer uma grande reestatização dos serviços"

Ricardo Senese, candidato à prefeitura de São Paulo pelo UP

Com relação à crescente presença do tráfico de drogas e das máfias a que estão ligadas, a primeira questão é voltar a ter prefeito na cidade de São Paulo, voltar a ter um poder organizado na cidade com um elemento que só a Unidade Popular está trazendo nessas eleições, que é o da participação popular. O nosso povo não participa da elaboração das políticas públicas na cidade, isso faz com que a distância entre o poder político e as pessoas seja muito grande, abrindo espaço para o tráfico de drogas, para os mafiosos e poderosos, inclusive passando a ter parte da administração pública, como é o caso da máfia dos transportes. Inclusive em reportagem recente, considerando todo o estado de São Paulo, o PCC está atuando no setor da coleta de lixo, das OSs [Organizações Sociais de Saúde] e também nos ônibus.

Para combatermos o tráfico de drogas como um todo é preciso fazer uma grande reestatização dos serviços, passando para o controle de funcionários e funcionárias concursados, com treinamento e com esse elemento do poder popular, ou seja, a população tem que passar a controlar o que acontece na cidade. Dessa maneira, vamos ter uma política progressiva de fortalecimento do poder público, junto com a participação popular, revertendo as privatizações.

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O seu programa de governo critica abertamente Nunes e Datena, mas ao se referir a Pablo Marçal omite o nome dele e se refere como “candidaturas de influenciadores de internet, que ganham rios de dinheiro enganando o povo e fingem representar uma ruptura da política atual”. Está se referindo a ele? Por que não citar o nome abertamente?

No ato da redação do nosso programa, nós tínhamos o mapeamento de várias possibilidades de candidaturas que poderiam crescer de forma fascista na internet. Uma delas era o Marçal, mas poderia ter outras. Então, no ato da elaboração, também tivemos a preocupação de não dar espaço de citação naquele momento, mas a conjuntura mudou e temos falado em todas as nossas entrevistas que o Pablo Marçal representa o que tem de pior na política hoje. Ele representa um setor mentiroso e que vem com uma política de enganar o nosso povo, numa ideologia de que é possível todas as pessoas serem ricas, todo mundo ficar milionário. Isso é uma mentira deslavada de um coach mentiroso.

Pablo Marçal é uma prioridade na nossa campanha, a gente vem desenvolvendo essa luta política ideológica junto ao nosso povo e, inclusive, temos invertido os votos nos bairros pobres, desmistificando quem é Pablo Marçal e virando voto a favor da Unidade Popular. Nós entendemos que o Pablo Marçal tem espaço numa parte da população que está bastante desgastada da política considerada tradicional, de uma política que não tem mais espaço no povo, porque muitas promessas são feitas ao longo dos últimos 30 anos e não são realizadas, independente de qual foi o partido que ganhou determinada eleição.

Estamos vendo que está abrindo um espaço de questionamento a tudo que está acontecendo. Nós, da Unidade Popular, estamos fazendo uma discussão paciente com nosso povo, explicando quem é Pablo Marçal e por que a construção do socialismo na nossa cidade é a verdadeira solução para a classe trabalhadora, e não essa ideologia medíocre deste candidato Pablo Marçal.

O programa de governo cita Bolsonaro, Tarcísio, Nunes, Datena e “aliados da extrema direita” como representantes contra as liberdades democráticas. Poderia dar exemplos de que violações à democracia eles representam?

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Eles representam todo tipo de ameaça à democracia. Ameaça de desrespeitar o resultado de eleição, de fechamento do STF [Supremo Tribunal Federal], eles ameaçam o próprio processo eleitoral. Nós nos lembramos vivamente o que aconteceu no dia da eleição, em 2022, em que os bolsonaristas armaram uma operação nacional para impedir que o povo votasse.

Eles também tentaram diversas articulações golpistas, como em 8 de janeiro de 2023, mas foram pelo menos três tentativas durante todo o governo Bolsonaro de aplicar uma política de fechamento, de estado de sítio e implementação de um regime ditatorial fascista e sanguinário. Nós temos a consciência de que eles representam o cerceamento completo de toda a democracia que existe no país. Nós entendemos que é uma democracia precária, insuficiente, queremos aprofundar essa democracia com a participação popular, com a construção de um poder de fato do povo, mas somos contrários a qualquer derrota na democracia que existe hoje.

O partido defende a desmilitarização das polícias, inclusive da Guarda Civil Metropolitana, e uma abordagem de segurança pública que trabalha mais na prevenção do que na repressão. Como garantir que as leis serão respeitadas se os infratores verão que não haverá consequências para os crimes?

À questão da segurança nós precisamos ter um olhar sistêmico. A nossa principal proposta para reduzir o problema da segurança é diminuir a desigualdade social. Vamos promover mutirões de empregos, abrir novos postos de trabalho, melhorar a situação de quem já está trabalhando na informalidade e fortalecer a nossa educação com mais investimentos. Dessa maneira, vamos, em pouco tempo, reduzir o espaço do crime na cidade, colocando uma classe trabalhadora mais forte na cidade.

São Paulo é uma cidade muito poderosa, são 12 milhões de pessoas, é um grande potencial humano, social, cultural e humanitário que, desenvolvendo, vai reduzir sim a insegurança na cidade, porque as pessoas vão fazer mais parte da cidade. Quando o nosso povo não se sente parte da cidade, existe o crescimento da insegurança. Esse é o primeiro ponto.

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O segundo ponto é que precisamos de uma polícia que seja comunitária. [Nos locais] onde construímos as ações do poder popular na cidade, reduzimos drasticamente os índices de assalto, assassinatos e ocorrências de segurança. Onde está organizado o nosso movimento de luta nos bairros, vilas e favelas, a segurança é muito maior, porque as pessoas constroem aquela localidade conjuntamente. Uma vizinhança que se conhece, se respeita e se cuida mutuamente.

Nesse sentido, vamos ter uma GCM que vai atuar de forma comunitária, e é por isso que a desmilitarização vai ajudar, porque deixará de ser uma estrutura que busca incessantemente um inimigo que está dentro do seu próprio povo. Dessa forma, a insegurança e a impunidade serão resolvidas, no nosso ponto de vista.

Outra frente de defesa do partido é o combate à violência contra a mulher. Como essa mulher será protegida sem um sistema de Segurança Pública que puna o agressor e qual é, efetivamente, a participação da gestão pública municipal para reprimir esse tipo de crime?

Primeiro que a gente defende, sim, punição a quem agride mulher, e entendemos que a punição que existe hoje é, inclusive, insuficiente. Agora, as coisas não se resolvem somente com uma ação posterior às agressões. O que nós queremos construir com muita força é a prevenção. E como nós imaginamos a prevenção às agressões contra as mulheres? Primeiro, dando total espaço e força para as mulheres liderarem a nossa sociedade, que elas tenham condições estruturais e apoio político e de políticas públicas para que façam parte da organização da repressão também ao machismo estrutural que existe.

Dessa maneira, criando uma política pública coordenada por mulheres e com as mulheres, em pelo menos metade dos cargos políticos, nós vamos conseguir mostrar para a sociedade que a mulher vai ser respeitada e quem desrespeitar a mulher vai ser punido. Por isso também nós colocamos a parceria com o Movimento de Mulheres Olga Benário e outros movimentos de mulheres como uma prioridade da nossa gestão. E isso vai ser coordenado pela nossa vice, a Júlia Soares, que é coordenadora do Movimento de Mulheres Olga.

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Com essas parcerias, vamos construir casas abrigo e casas que possam receber as mulheres que estão em situação de violência. Um dos principais problemas das mulheres que estão sob violência é não ter opção de para onde ir, de ter um local de amparo jurídico, psicossocial e de assistência para que elas saiam de uma situação de violência. Vamos dar todo o suporte para as mulheres na cidade poderem sair das situações de violência e vai ter punição para machistas, agressores e assediadores de toda ordem.

O programa de governo do senhor se posiciona contra a militarização das escolas. Tendo em vista que o partido luta pelo socialismo, o senhor defende algum tipo de doutrinação em sala de aula ou justamente o contrário, ou seja, que a escola se restrinja a ensinar disciplinas como português e matemática e não entre em questões morais e ideológicas?

Do nosso ponto de vista, a educação praticamente acabou na cidade de São Paulo. Então, a primeira medida nossa é voltar a ter uma educação, que é muito mais do que ensinar uma conta ou ensinar alguém a escrever e a ler. Nós estamos numa cidade com analfabetismo funcional crônico, ou seja, as pessoas têm uma baixa formação quando terminam o ginásio, o ensino médio e quando terminam a escola. Precisamos investir na educação em primeiro lugar, promover uma educação que dê força crítica para as pessoas, que dê mais conhecimento, e que a gente valorize professores e professoras dentro de sala de aula.

Valorizar a educação vai fazer com que a criança ou o adolescente tenha mais vontade de ir à escola, de desenvolver o conhecimento. Isso não está acontecendo hoje, a juventude não tem tanta vontade de estudar e isso se deve à estrutura que está colocada. As escolas parecem prisões, não preparam os jovens para o futuro, não ensinam uma profissão, não têm matérias psicopedagógicas. As pessoas não aprendem a ter cultura, a desenvolver o gosto por isso. A própria área esportiva é defasada. A escola, do nosso ponto de vista, está praticamente a zero.

Uma formação quadrada, voltada para um conhecimento mecânico, precisa acabar. Se isso for ideologia, então para nós vai ser um conhecimento ideológico, porque o que forma as pessoas é, de fato, ter um conhecimento vasto e isso não está acontecendo. Não existe conhecimento distribuído largamente na sociedade, sequer tem internet nas escolas.

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Faltam professores, falta merenda, falta tudo. Vai me desculpar quem acha que isso é ideologia, porque se é ideologia ter tecnologia à disposição, ter conhecimento à disposição, ter biblioteca à disposição, ter laboratórios pedagógicos à disposição, então nós somos ideológicos, sim.

Aqui na pergunta eu me referi à ideologia, por exemplo, a implementação do socialismo, ensinar a luta de classes para os alunos, esse tipo de formação.

Na sociedade, houve diversos sistemas políticos, econômicos e culturais, inclusive desde o feudalismo, passando pela escravidão, passando pelo regime do Egito antigo, todo tipo de sistema tem que ser ensinado na escola, inclusive o próprio capitalismo, tem que ser explicado o que é e a sua origem de desigualdade.

Nós defendemos, sim, que o socialismo faça parte da grade curricular, assim como todos os sistemas desde o início da humanidade. Também vai fazer parte da nossa grade curricular.

Não com ênfase?

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Ênfase não, igual a todos os outros. Eu acho que a educação crítica vai fazer as pessoas olharem criticamente o sistema capitalista, a gente tem que dar todo tipo de informação para que as pessoas desenvolvam seu próprio intelecto. E a partir da nossa própria experiência, o dia a dia vai mostrando que nós vivemos num sistema que, inclusive, está acabando com o meio ambiente, com a natureza, olha o ar que a gente respira. Isso se deve, do nosso ponto de vista, ao capitalismo. A educação crítica vai fazer as pessoas chegarem às suas conclusões e desenvolverem um sistema melhor para a gente viver.

No que diz respeito à saúde, o senhor defende a estatização completa do SUS. Como viabilizar esse modelo em São Paulo, onde muitas unidades de saúde funcionam por meio de OSs [Organização Social de Saúde]?

Primeiro que nós vamos fazer uma auditoria de todos os contratos com as OSs, inclusive com esse dado recente de que o PCC está envolvido. Estamos muito preocupados com o dinheiro público que está sendo repassado para mãos corruptas, mafiosos, que estão degenerando a nossa saúde, acabando com a vida de pessoas. A corrupção que está instalada nas OSs vai ser alvo de auditoria e combate permanente, sem trégua, porque queremos moralizar e organizar a saúde da cidade.

Todos os contratos em que forem comprovadas relações fraudulentas vão ser rompidos, porque a nossa cidade não pode ficar na mão de pessoas que não se importam com a vida da população. Disso decorre a nossa reestruturação da saúde pública, porque com a saúde pública acabamos com esse intermediário. Achamos que os prefeitos fugiram da responsabilidade de organizar a saúde pública, entregando-a nas mãos de organizações sociais, quando teria sido mais competente governantes, prefeitos que de fato assumissem a responsabilidade.

E aqui eu queria dizer para o povo de São Paulo: nós assumimos a responsabilidade integralmente de prover a saúde que o nosso povo precisa, com mais investimentos, com melhor qualidade, porque quem precisa de pediatra, ginecologista e chega no posto e não tem, sabe o que isso significa. Nosso povo está com a vida arriscada e a nossa expectativa de vida diminuída por essa política desastrosa, corrupta e fascista na saúde de São Paulo.

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Além da estatização completa do SUS, o senhor defende o mesmo para educação, transporte público, saneamento básico e diversos outros setores. Na maioria das vezes, no entanto, as empresas estatizadas acabam sendo loteadas por aliados do governo, que se beneficiam às custas do dinheiro público. Como evitar que isso aconteça?

A gente defende a reestatização com controle popular. Essa forma de controle popular nunca foi implementada na história de São Paulo, nem na história do país. Controle popular é chamar as pessoas não só para participarem de conselhos consultivos, mas para passarem a ter poder de deliberação. No caso da saúde, queremos que os conselhos de saúde tenham poder deliberativo, inclusive sobre orçamentos e políticas de saúde, de forma conjunta com os funcionários.

Então, por exemplo, o paciente passa a ter poder de deliberação, o funcionário passa a ter poder de deliberação e a prefeitura também. Com esses três eixos - mais ou menos um conselho de 33% para cada - vamos conseguir construir uma política pública que tenha controle popular justamente para evitar [problemas].

Outra coisa que vamos fazer para acabar com cabide de emprego no serviço público é reduzir os salários. O prefeito hoje recebe R$ 27 mil, nós entendemos que ele deve receber o mesmo valor que uma professora de creche. Vereadores recebem R$ 18 mil, tem que reduzir o salário, e todo tipo de cargo comissionado vai receber o mesmo salário das pessoas que trabalham na política pública, na ponta, por volta de R$ 5 mil. Essa é a nossa proposta, porque o cabide e a corrupção do serviço público vêm de benesses que não deveriam existir. Acreditamos que a política tem que ser construída pelo povo e de forma popular.

E em relação à eficiência das empresas públicas, como garantir a produtividade se os funcionários públicos têm estabilidade de emprego? Uma das maneiras de incentivar os resultados, que vão se converter em benefício à população, é por meio de bonificação e programas de meritocracia.

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A gente tem a visão que esses programas de meritocracia não ajudam no aumento da produtividade. Embora se lute para ganhar uma coisa ou outra a mais, no fundo são metas colocadas pelo mercado que tornam as pessoas com uma saúde prejudicada. Essa pressão por metas faz com que aumentem problemas de saúde mental e física, e torna as pessoas escravas do seu próprio emprego.

Essa é uma lógica perversa, nós temos uma contrariedade e não entendemos que isso está ajudando as pessoas a se desenvolverem nos locais de trabalho. O que vai ajudar a pessoa a ver que o seu trabalho tem valor e que o seu papel tem importância é dar condições de trabalho adequadas, metas realmente acessíveis, com uma jornada de trabalho reduzida. Nós defendemos que seja reduzida para 30 horas semanais e que acabemos com a escala seis por um, cinco por um, 12 por 36, e que haja formação continuada para as pessoas.

Muita gente fica lutando por metas, deixa de estudar, de viver a vida, de ter contato com familiares e acaba se prejudicando no médio e longo prazo. Tudo isso faz com que tenhamos uma lógica de humanizar o trabalho e, através da humanização do trabalho, vermos pessoas felizes, cumprindo seu papel e seu trabalho. Temos certeza que reduzindo a jornada de trabalho, tendo um salário justo, com formação continuada, teremos a melhor política pública do mundo, que é uma política voltada para o ser humano e não para a geração de lucro.

 O senhor pretende retirar estátuas, nomes de rua e praças que fazem referência ao que chamam de “racistas e fascistas” e homenagear “defensores do povo”. Quais seriam as homenagens retiradas e quais as substituiriam?

A gente quer trocar Salim Farah Maluf pra homenagear pessoas que foram assassinadas e torturadas pela ditadura. São mais de 400 pessoas que a ditadura militar matou e assassinou no nosso país. Nós vamos chamar a comissão de familiares dos mortos e desaparecidos para que a gente tome uma decisão coletiva de qual será o nome implementado.

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Também vamos trocar os nomes ligados aos grandes ditadores, como Castelo Branco, enfim, outros que comandaram a ditadura, para também homenagear os mortos e desaparecidos políticos. Então nós temos Carlos Marighella, Ísis Dias de Oliveira, Honestino Guimarães, Manoel Lisboa de Moura, enfim, essa comissão terá cargo e poder de decidir quem será o homenageado.

E no caso dos Bandeirantes que cometeram o genocídio dos povos indígenas, nós vamos trocar todos os nomes e homenagens, estátuas e monumentos pra homenagear os povos indígenas. E todos os nomes que foram escravocratas, também a gente vai trocar por nomes que referenciam a luta antirracista, como Zumbi dos Palmares, Clóvis de Moura, Dandara [dos Palmares], tantas outras pessoas que lutaram contra o racismo no Brasil. Nós vamos coordenar o processo com todas as pessoas envolvidas na luta antirracista e na luta em defesa dos povos indígenas.

Existe uma parcela da população que se sente representada por essas pessoas. Não seria antidemocrático impedir que linhas de pensamento diferentes se manifestem na cidade e também não seria apagar a história?

Nós estamos defendendo abertamente isso na eleição. Ganhando a eleição, o nosso programa e nossas propostas passaram pela aferição democrática das eleições. A gente entende que não é antidemocrático porque estamos sendo transparentes em todo o processo eleitoral para valorizar pessoas que foram assassinadas e torturadas.

E a gente, inclusive, gostaria de levar à reflexão dessas pessoas que querem homenagear ditadores sanguinários, por que não se pode homenagear uma mulher negra, um resistente indígena, pessoas que lutaram pela democracia na ditadura? Gostaríamos de fazer essa reflexão de forma mais aprofundada com o nosso povo, para que possamos homenagear pessoas que lutaram pela democracia, pela igualdade racial e pela cultura dos povos indígenas.

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