Os candidatos Ricardo Nunes (MDB) e Guilherme Boulos (Psol) se encontraram na noite desta sexta-feira (25) no debate que marca o fim de uma campanha eleitoral tensa que vai decidir o prefeito da maior capital do país nos próximos quatro anos. O encontro começou às 22h nos estúdios da TV Globo em São Paulo, com mediação do jornalista Cesar Tralli.
Apesar de Ricardo Nunes ter sido convidado para mais de uma dezena de debates nesta reta final rumo à votação no domingo (27), este foi o terceiro e último que contou com a participação do prefeito de São Paulo que tenta a reeleição. Além de não ter ido no primeiro encontro promovido pelos veículos de comunicação O Globo, Valor e Rádio CBN, ele se ausentou de outro debate realizado por RedeTV!, Folha de S.Paulo e UOL e recusou outros convites.
Já o candidato do Psol defendeu a realização de nove encontros durante este segundo turno e aceitou diversos convites alegando não fugir do debate e do diálogo, como a sabatina promovida nesta sexta-feira (25) pelo ex-candidato pelo PRTB, Pablo Marçal, com quem Boulos teve discussões acirradas na disputa do primeiro turno.
Segurança pública foi tema inicial do debate da Globo
No primeiro bloco do debate da noite desta sexta-feira na Globo, Nunes voltou a bater na tecla de um tema que explorou exaustivamente ao longo da campanha ao questionar por que Boulos, como deputado federal, não votou favoravelmente a um projeto de lei que prevê tempo de cumprimento de pena a criminosos. Em resposta, Boulos afirmou que não votou porque "não estava na sessão" e que "nesse momento estava em uma reunião com o presidente Lula".
Nunes seguiu optando pelo tema da segurança pública enquanto Boulos enfatizava problemas na cidade de São Paulo, como o custo do uso da capela em um cemitério privatizado. O candidato à reeleição lamentou por Boulos não ter respondido a questão sobre a segurança pública e acenou para o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), presente entre os convidados, e perguntou a Boulos sobre a liberação das drogas.
Em resposta, Boulos afirmou que sempre defendeu a diferenciação entre usuário e traficante de drogas. "Traficante de droga que estraga a vida dos outros é criminoso e tem que ser preso", respondeu ele, questionando se Nunes defende que o usuário seja preso. Em resposta, o candidato do MDB afirmou que defende "o que está na lei".
Outra questão levantada por Nunes foi o uso de armas pelas autoridades, questionando se Boulos "vai tirar os fuzis da polícia". Em resposta, Boulos negou e retrucou dizendo que "os fuzis comprados para a GCM não foram usados nem uma única vez".
Boulos criticou privatizações e Nunes defendeu PPPs
No início do último debate que antecede as eleições em São Paulo, promovido pela Globo, Boulos defendeu que ele representa a mudança e que Ricardo Nunes não foi um bom prefeito. O candidato do Psol abordou o tema do apagão em São Paulo, bem como a privatização da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) e os cemitérios privatizados, afirmando que eles "têm custado muito ao povo de São Paulo".
"Você sabe quanto custa para uma família fazer uma oração em uma capela de um dos cemitérios que você privatizou?", questionou ele a Nunes, que respondeu que "todos que estão no CadÚnico têm acesso gratuito" e que é possível pagar com 20% de desconto. Insistindo na pergunta sobre o custo, Boulos perguntou se Nunes não se importa com as pessoas que querem utilizar a capela, e então o prefeito afirmou que vai "na missa todo domingo". Na sequência, o candidato do Psol falou que "uma oração em uma capela [em um cemitério privatizado] custa R$ 580".
Defendendo as parcerias público-privadas (PPPs), Nunes citou a privatização da Sabesp e apostou em evidenciar a parceria com o governador Tarcísio. "Nós fizemos a concessão, é assim um governo liberal", disse, acrescentando a privatização do Parque Ibirapuera.
Nunes defendeu, ainda, o Smart Sampa, programa de câmeras de monitoramento da cidade, feito por meio de licitação, afirmando que o Psol votou contra o projeto, e questionou se Boulos quer acabar com a iniciativa. Em resposta, o candidato disse que, além do Psol, o "Ministério Público barrou" a proposta e afirmou ainda que "a Sabesp pode virar a Enel da água", comparando a empresa de saneamento básico recentemente privatizada aos problemas que a cidade de São Paulo vêm enfrentando com a empresa de energia Enel.
Boulos propõe "Poupatempo da Saúde" com apoio de Lula e Nunes, o "Paulistão da Saúde"
Em relação ao tema da saúde, o candidato do Psol acusou a gestão de Nunes de, "apesar de haver dinheiro em caixa", não conseguir atender a necessidade da população por atendimentos médicos e medicamentos. Em resposta, o candidato à reeleição afirmou que abriu 10 hospitais e aumentou de três para 30 as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs). Ele discursou, ainda, que até o fim do ano vai inaugurar a UPA da Lapa e do Sacomã e prometeu, em um eventual próximo mandato, inaugurar 15 UPAs e 25 Unidades Básicas de Saúde (UBSs.
Em resposta, Boulos afirmou que três UPAs foram feitas pela gestão de João Dória (PSDB) e provocou Nunes por "estar se confundindo" com o ex-prefeito. O candidato do Psol prometeu que em uma eventual gestão vai fazer "o Poupatempo da Saúde" com o apoio do presidente Lula e que eles serão construídos no Grajaú, no Capão, em Perus, no Itaim Paulista, entre Cidade Tiradentes e São Mateus, totalizando 16 Poupatempos da Saúde nos locais que "mais precisam".
Em contrapartida, Nunes afirmou que vai fazer o "Paulistão da Saúde", um centro de saúde que reúne diversas especialidades em um mesmo local. Alfinetando Boulos, Nunes afirmou que "eles são bons de prometer", se referindo ao ex-prefeito do PT em São Paulo, Fernando Haddad.
Os candidatos também acenaram às pessoas no Transtorno do Espectro Autista (TEA). Enquanto Nunes prometeu um centro especializado no atendimento de autistas e familiares, Boulos afirmou que vai "fazer cinco na cidade de São Paulo".
Covid-19 volta ao debate entre os candidatos de São Paulo
O enfrentamento à pandemia de Covid-19 voltou à tona no debate entre os candidatos à prefeitura de São Paulo, com Boulos questionando por diversas vezes se Nunes teria coragem de repetir que Bolsonaro "fez tudo certo na pandemia”. Em resposta, o prefeito defendeu a política adotada pelo ex-presidente, enfatizando o envio de vacinas pelo governo federal.
“Bolsonaro enviou as vacinas para São Paulo. Você tomou, eu tomei. Eu fiz o meu papel. Eu não sou julgador do presidente, como prefeito tornei São Paulo a capital mundial vacina”, disse ele. Ao mudar de assunto, Nunes questionou “por que vocês [o Psol] entraram no STF para manter a saidinha dos criminosos”. Em resposta, Boulos disse que a afirmação era uma mentira e acusou os opositores a quererem que o eleitor “tenha medo”, lembrando que, nas eleições de 2022, falaram que "Lula ia fechar igrejas".
Candidatos acenam aos jovens e propõem políticas ligadas a empreendedorismo
Tanto Nunes quanto Boulos acenaram ao eleitor jovem e fizeram propostas ligadas ao empreendedorismo e ao primeiro emprego nas periferias de São Paulo. Enquanto Nunes falou que criou o "Meu Trampo", Boulos afirmou que "dá para fazer muito mais e melhor" e lembrou que a vice dele na chapa, Marta Suplicy (PT), fez os Centros Educacionais Unificados (CEUs).
Boulos defendeu fazer o "CEU 2.0", com wi-fi livre e estúdio de audiovisual, e questionou Nunes por não ter feito nenhum CEU. O candidato do MDB, por sua vez, respondeu que reformou todos e está fazendo outros 16.
Na sequência, Nunes perguntou por que o Psol se posicionou contra a redução de impostos, como o ISS de streaming, o ISS de aplicativos, do audiovisual e de franquia e franchising. Em resposta, Boulos afirmou que o Psol votou a favor da redução em um primeiro momento, mas que na segunda votação havia “jabutis” incluídos, como uma autorização para a prefeitura "poder pegar dinheiro em várias moedas estrangeiras". "Jabuti" é um termo utilizado no meio político para se referir à inserção velada de uma ou mais propostas que não têm relação ao tema principal do projeto proposto.
Nunes retrucou dizendo não ser verdade a alegação de Boulos. Complementou que se tratam de projetos distintos e que a moeda estrangeira se referia a um projeto internacional de ônibus elétricos.
Boulos acusa Nunes de corrupção e prefeito ganha direito de resposta
No debate da Globo em São Paulo, o candidato do Psol tentou relacionar Nunes a denúncias de corrupção. Em uma delas, se referiu a umasuposta extorsão de vendedores ambulantes por um grupo de fiscais da prefeitura. Em resposta, Nunes afirmou que a gestão "é tolerância a zero" em relação à corrupção, disse que colocou mais controladores e está recebendo "prêmios nacionais e internacionais" pelo combate à corrupção. "Comigo é o seguinte: andou errado é procedimento administrativo e rua, como eu já demiti vários", disse ele.
Em mais uma das acusações, Boulos alegou que a gestão de Nunes teria pago "40 vezes mais para adquirir armadilha para mosquito de dengue", de uma empresa que pertenceria "a um compadre". Boulos também acusou a administração do prefeito de superfaturar ”garrafinha de água no carnaval”.
Ao obter direito de resposta, Nunes usou o tempo adicional para dizer que Boulos foi condenado pela Justiça por 32 vezes, incluindo "mentiras no horário eleitoral". Nunes afirmou que, no debate, Boulos repetia a prática, “mesmo descumprindo decisão judicial”.
"Nunca tive um indiciamento, uma condenação", disse Nunes. Ao ser desafiado novamente por Boulos a abrir o sigilo fiscal, Nunes afirmou que abriria a “qualquer autoridade” e que, quando o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) abriu a conta dele, “não foi identificado nada”.
Rebatendo as acusações, Nunes leu uma nota de janeiro de 2017 da Polícia Civil de São Paulo. “Dois integrantes do MTST foram detidos, acusados de participar de ataques contra a Polícia Militar”, disse Nunes, questionando se Boulos se arrependia “de ter depredado a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo)”.
Em resposta, Boulos afirmou que estava defendendo famílias que estavam sendo "despejadas e perdendo tudo o que tinham". O candidato do Psol disse ainda que não precisava ficar “lendo coisas” e afirmou: “o Ricardo parece aquela criança que anda de bicicleta, uma rodinha é o Tarcísio e a outra é o Bolsonaro. Se tirar, ele cai".
As regras do debate da Globo em São Paulo, o último antes das eleições
O debate entre os candidatos a prefeito de São Paulo foi transmitido ao vivo, com início às 22h, pela Globo e Globoplay em São Paulo. Houve transmissão simultânea pela GloboNews e pelo portal de notícias G1 para todo o país. Os candidatos puderam circular livremente pelo cenário, que tem no chão o desenho de um mapa da cidade de São Paulo, durante todos os quatro blocos.
No primeiro e no terceiro blocos, o debate da Globo em São Paulo teve tema livre, com 20 minutos de duração cada. No segundo e quarto blocos, o tempo foi dividido em dois temas predefinidos pela organização, em cada bloco. Cada candidato teve cinco minutos para falar sobre cada um dos temas, que foram sorteados entre seis opções oferecidas pelo canal, sem possibilidade de repetição. Ao final do quarto bloco, os candidatos tiveram um minuto e meio para considerações finais.
Primeiro turno em São Paulo foi o mais disputado desde a redemocratização
Com a disputa mais acirrada desde a redemocratização, o resultado do primeiro turno das eleições à prefeitura de São Paulo foi definido apenas após 99% das urnas apuradas. No total, Nunes recebeu 1.801.139 votos (29,48% dos votos válidos), enquanto Boulos teve 1.776.127 votos (29,07%). O candidato Pablo Marçal (PRTB), com 1.719.274 votos (28,14%), ficou fora da disputa do segundo turno.
No maior colégio eleitoral do país, a disputa no segundo turno reflete a polarização nacional entre o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), apoiadores, respectivamente, de Nunes e de Boulos.
Ricardo Nunes (MDB), de 57 anos, iniciou a carreira política como vereador na cidade de São Paulo e foi eleito como vice de Bruno Covas na prefeitura de São Paulo. Ele assumiu o cargo de prefeito após o falecimento de Covas em decorrência de um câncer, em 2021. Com perfil discreto, Nunes era pouco conhecido pelos paulistanos no início da gestão e apostou em políticas de maior popularidade.
Guilherme Boulos (Psol), de 41 anos, é deputado federal e uma figura central do Psol. A carreira política se destaca pelo foco em movimentos sociais e pela defesa dos direitos de moradia. Desde 2020, quando se candidatou à prefeitura de São Paulo, ele se consolidou como uma das principais vozes da esquerda paulistana, buscando expandir a influência no cenário municipal.
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