O presidente Lula em cerimônia na qual anunciou investimentos bilionários na refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco.| Foto: Ricardo Stuckert/PR
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A Petrobras está perto de fechar a compra da Refinaria de Mataripe, na Bahia, hoje pertecente ao fundo árabe Mubadala. O negócio deve ser um marco na reestatização do setor de refino do petróleo brasileiro. O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já sinalizou algumas vezes que quer de volta as unidades que foram vendidas no governo passado, de Jair Bolsonaro (PL).

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A Refinaria Landulfo Alves (RLAM), rebatizada de Refinaria de Mataripe, foi vendida pela estatal em 2021, por US$ 1,65 bilhão, para a Acelen, que pertence ao grupo árabe. Segundo o Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), ela representa 15% da capacidade de refino da petroleira.

Os valores ainda não estão definidos, nem a operação. O mais provável é que a Petrobras compre totalmente a refinaria. A Acelen entraria como sócia em um projeto de energia renovável. Segundo relatos de bastidores, a expectativa é que o negócio seja efetivado em 2025.

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Procurada pela Gazeta do Povo, a Petrobras informou que “não houve qualquer decisão nem da Diretoria Executiva e nem do Conselho de Administração nesse sentido”. A Mubadala não está comentando o assunto. E a Acelen Acelen disse que, por ser uma questão que envolve o investidor, a companhia também não aborda o tema.

Ainda no ano passado, em novembro, a Petrobras decidiu cancelar a venda da Lubnor, no Ceará, que havia sido negociada em 2022. Foi o primeiro passo da estatal na retomada de ativos de refino.

Governo quer retomar refinarias que foram vendidas

O esforço do governo petista é traduzido nos anúncios feitos ao longo do ano. Além da recompra da refinaria na Bahia, a Petrobras conseguiu manter mais cinco outras que deveriam ser vendidas e anunciou a retomada de investimentos bilionários na Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco.

Das 13 refinarias que a Petrobras tinha, três foram vendidas na gestão Bolsonaro. Em novembro de 2022, a empresa desistiu de vender uma quarta unidade, a Regap, de Minas Gerais.

Mas o governo atual, segundo o Ministério de Minas e Energia, busca ampliar a cadeia de refino e petroquímica e fortalecer a garantia do abastecimento nacional e reduzir a dependência externa.

Um dos principais movimentos da Petrobras nesse sentido é a tentativa de voltar a ser dona ou pelo menos sócia majoritária da refinaria no Recôncavo Baiano. As negociações para a fase final de aquisição e formação de parceria com a Mubadala Capital foram anunciadas em março pela estatal. Esta última etapa, conhecida como downstream, engloba escoamento, logística e distribuição.

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Paralelamente, a companhia conseguiu manter em seu portfólio outras refinarias. Em 2019, o governo de Jair Bolsonaro firmou um termo de compromisso de cessação (TCC) com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para que a Petrobras vendesse oito plantas de refino, para estimular a concorrência do setor. Dessas, três foram negociadas e cinco, não.

Em novembro do ano passado, a petrolífera pediu revisão ao Cade, para ficar desobrigada de vender as refinarias. Jean Paul Prates, então presidente da estatal, disse que o Cade nunca teria conseguido provar o domínio da Petrobras sobre o mercado. Em maio deste ano, o Cade atendeu ao pedido da petroleira, livrando-a das exigências do TCC.

A atual presidente da Petrobras, Magda Chambriard também já mostrou que, nisso, segue a mesma linha de Prates e é favorável a reestatização das refinarias.

“No caso da RLAM [atual Mataripe], tem uma possibilidade de que seja utilizada para biocombustíveis. Tem toda uma dinâmica que está sendo pensada para biorrefino. Biorrefino é futuro e ninguém pode dizer que, numa época que se fala tanto em transição energética e net zero, que a gente não deve considerar o biorrefino. Está definido? Ainda não”, disse em entrevista a jornalistas logo após a sua posse.

Na Refinaria Abreu e Lima, a ideia é investir de R$ 6 bilhões a R$ 8 bilhões. Apelidada de “a refinaria mais cara do mundo” e um dos grandes símbolos dos desvios revelados pela Operação Lava Jato, a unidade teve sucessivos estouros no orçamento e calote da Venezuela, que abandonou a sociedade sem pôr um centavo e deixou todo o gasto a cargo do Brasil.

Retomada da refinaria é criticada

Para Murillo Torelli, professor do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CCSA) da Universidade Presbiteriana Mackenzie, o Brasil está presenciando um “retrocesso”, marcado por políticas equivocadas e uma crescente intervenção estatal que ameaça as empresas públicas. “Vejo com preocupação os rumos que estamos tomando, repetindo os mesmos erros do passado”, diz.

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Torelli diz que a história da Petrobras nos governos do PT é marcada por uma série de investimentos malsucedidos e escândalos de corrupção que resultaram em prejuízos bilionários.

“Durante os governos Lula 1 e 2 e Dilma Rousseff, a Petrobras sofreu com o aparelhamento político, acumulando uma dívida gigantesca de cerca de R$ 350 bilhões e registrando prejuízos recordes. Investimentos em projetos como estaleiros, navios-sonda e refinarias não trouxeram os resultados esperados e se revelaram extremamente custosos”, afirma.

O especialista cita a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, e as megarrefinarias, como a própria Abreu e Lima e o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), até hoje não concluído. Também destaca que o governo ressuscitou estatais que estavam desativadas e criou novas.

“A BR Distribuidora, a Eletrobras e diversas refinarias da Petrobras são frequentemente mencionadas como ‘perdas lamentáveis’. Lula age como se fosse dono da Petrobras, interferindo na política de preços, nos investimentos e na distribuição de dividendos”, avalia o professor.

“A retomada das atividades da Araucária Nitrogenados e das obras da Refinaria Abreu e Lima são exemplos de decisões antieconômicas motivadas por interesses políticos. A possível retomada da refinaria de Mataripe ilustra bem os planos de reestatização do governo atual”, diz.

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O BTG Pacutal emitiu um relatório ao mercado, no qual avalia como negativa a compra. Segundo o banco, a Petrobras registra um histórico de baixo retorno na área de refino se comparada a sua atividade principal, de óleo e gás.

"E embora alguns possam argumentam que existam gargalos que impedem a Petrobras de aumentar o investimento em exploração e gás, ainda acreditamos que a melhor estratégia seria retornar dividendos maiores pagamentos aos acionistas", diz o banco.

Segundo a Petrobras, a refinaria de Mataripe possui capacidade de processamento de 333 mil barris/dia, e seus ativos incluem quatro terminais de armazenamento e um conjunto de oleodutos que interligam a refinaria e os terminais.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]