Felipe Kees e Michael Davis levaram quatro horas para fazer o grafite sobre o clássico: desenho misturou videogame, rivalidade e os campinhos de terra da periferia.| Foto: Aniele Nascimento/Gazeta do Povo

Clássico inspira camisas 10

Carlinhos Paraíba e Ferreira já sentiram o gosto de decidir um Atletiba. Foi a partir de um petardo do seu camisa 10 que o Coritiba abriu o caminho para o título estadual do ano passado. E foi com uma matada precisa e um chute no canto do seu camisa 10 que o Atlético venceu o primeiro clássico de 2008. Inspiração suficiente para dois jogadores que precisam render mais nesta temporada.

Ferreira é veterano de Atletiba. Disputou seis, venceu três, empatou outros três. No dia 20 de janeiro de 2008, abriu o placar na vitória por 2 a 0, no Couto. "Fiz um gol muito bonito. Seria muito bom fazer um gol e conquistar a vitória. Mas o importante é o Atlético ganhar", comenta o colombiano, que poucas semanas depois daquele gol foi para o Oriente Médio.

Na volta, Ferreira teve poucos momentos de brilho. Um deles, justamente contra o rival, na Arena, dando início à jogada do pênalti convertido por Alan Bahia no empate por 1 a 1. Lampejos suficientes para manter elevada a confiança de Geninho em seu futebol.

Paraíba ainda tenta adquirir esse crédito com Ivo Wortmann. As suas atuações neste início do ano tornaram incerta sua escalação para o clássico. Se for mantido como titular, já sabe onde buscar referência para recuperar o ótimo futebol do primeiro semestre de 2008. "Foi o melhor Atletiba que eu fiz (2 a 0 no Couto, dia 27/4). Apesar de ser campeão na Baixada que foi muito bom, o melhor foi no Couto, não só pelo gol marcado, mas pela jogada, que não esqueço pela beleza."

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Um novo retrato do Atletiba. As cores, os traços marcantes como os lances do clássico traduzidos pela arte das ruas. A convite da Gazeta do Povo, dois grafiteiros, ou oficialmente escritores de grafite, deram forma ao tradicional duelo paranaense.

Tema praticamente desprezado pelos sprays, a possibilidade inédita de mostrar o futebol instigou os artistas Michael Davis e Felipe Kees. O primeiro, por ser torcedor do Coritiba, o outro, pela possibilidade de imprimir no muro a emoção e o movimento do esporte.

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"Nunca teríamos escolhido fazer um desenho como esse", confessa Kees, tatuador e com 8 anos de experiência no grafite, do italiano graffiti, marca ou inscrição feita em um muro ainda no Império Romano.

Já classificado como pichação, o grafite duela com rótulos. "Comum passarem xingando a gente, chamando de vagabundo, sermos abordados pela polícia", conta Devis, que compara o preconceito ao sofrido por torcidas organizadas: "Nem todos são ruins, baderneiros".

Há 11 anos com as latas de tinta na mão e recém-chegado do Japão, ele grafitou em vários países, atendeu empresas como Nike, Toyota e Panasonic e chegou a ser contratado pela Organização das Nações Unidas (ONU) para pintar um viaduto sobre biodiversidade no Largo da Ordem. Em janeiro, a dupla, ao lado de Wagner Now, fez um painel na Travessa da Lapa.

Entre os moradores da periferia, onde o grafite surge em várias esquinas, a técnica é bem vista. Enquanto imprimiam no cimento detalhes de Atlético e Coritiba, Devis e Kees foram convidados para três trabalhos e ainda tiveram um espaço oferecido para um novo desenho por uma moradora vizinha.

"Acho muito bonito. Já pintaram uma vez e agora fizeram um belo desenho, é uma arte", definiu o motorista de ônibus Aparecido Carlos Nogueira Filho, de 58 anos, que emprestou o muro da sua casa na Avenida dos Pioneiros, Alto Boqueirão, para os escritores.

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"Essa é a minha área, aqui somos reconhecidos e temos respeito. Muitos começam a pintar por causa disso, para não serem mais um nas estatísticas, para mostrar que são alguém", explica Kees.

Fazer um rolê, como eles denominam a confecção de um desenho, os aproxima da realidade de regiões carentes da cidade. "Trabalhar na rua tem o lado bom e ruim. Temos a inspiração, mas também vemos coisas tristes, como crianças nas ruas, drogas, problemas sociais", comenta Devis. "Mas é a melhor faculdade de todas, a faculdade da rua", completa Kees.

Na representação do Atletiba, eles misturaram um pouco da imagem de videogame para retratar a arquibancada, mostraram detalhes de um estádio e ainda um pouco dos campinhos de terra da periferia onde os torcedores boleiros sempre revivem a rivalidade de seus times.

Ao som de muito rap no mp3 player, mas com direito até a Édith Piaf, eles levaram quatro horas para finalizar o grafite. Vinte cores, vinte dois tubos de tinta (contando o total do material) e sete técnicas diferentes (pincel, cuspida, recorte, plastiquinho, fat cap, sombreamento e rabisco) depois, o Atletiba ganhou novo cenário e expressão.