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Mário Celso Petraglia e um quadro da Arena completa, em seu escritório: projetado para a Copa de 2006, estádio precisa, segundo o ex-dirigente, ser revitalizado para não chegar ultrapassado a 2014 | Marcelo Elias/Gazeta do Povo
Mário Celso Petraglia e um quadro da Arena completa, em seu escritório: projetado para a Copa de 2006, estádio precisa, segundo o ex-dirigente, ser revitalizado para não chegar ultrapassado a 2014| Foto: Marcelo Elias/Gazeta do Povo

A Arena da Baixada foi projetada para receber uma Copa do Mundo. Não a de 2014, mas a de 2006. Ca­­pa­­cidade, disposição dos vestiários, acesso, acomodações ao pú­­­bli­­­­co, todo o sonho atleticano foi balizado pelo Caderno de Encargos da Fifa de 1995. A primeira etapa seria concluída em 1997, a indicação do Brasil aconteceria em 2000 e, seis anos depois, a bola rolaria para o Mundial.

Pouco a pouco, todo o projeto foi sendo modificado. A situação econômica mundial no fim do século passado afastou a Copa do Brasil e a colocou nas mãos da sólida Alemanha.

A qualidade das instalações oferecidas pelos germânicos criou novos parâmetros para estádios. Um ano depois de a Itália sagrar-se tetracampeã mundial, a Fifa elaborou um novo Caderno de Encargos, mais completo e exigente. E a Arena, concebida dentro do mais moderno padrão de qualidade da sua época, ganhou um ar de estádio a um passo de se tornar ultrapassado.

A história acima é contada por Mário Celso Petraglia para defender uma mudança radical de ru­­mo no projeto da Baixada. Prin­­ci­­pal mentor da casa rubro-negra, o dirigente propõe compartilhá-la com o maior rival. Segundo ele, é a única ma­­neira de concluir o estádio e dar um impulso ao futebol pa­­ranaense.

"Se não tiver alguma coisa realmente moderna que crie a mais valia, alavanque receitas, nós va­­mos voltar na proporção àquilo que sempre fomos: times de segunda lutando para ser um time de pri­­meira", afirmou.

Petraglia recebeu a Gazeta do Povo na manhã do último dia 5, em seu escritório, no centro de Curitiba. Sentado à frente de um quadro com a Arena completa, segundo o projeto original, falou por 92 minutos sobre o cenário atual e o futuro do futebol paranaense, Arena Atletiba e Copa do Mundo.

O senhor prevê uma mudança na forma de ver o futebol no Brasil a partir da Copa de 2014. Será um novo espetáculo ao vivo em 12 es­­tádios apenas ou passa para os ou­­tros?

Isso já está havendo. É uma onda, é a pedra do lago. A cidade de Cu­­ri­­tiba, pluff, isso aí vai irradiar, já es­­tá irradiando. Na capital os outros clubes terão de fazer a mesma revitalização porque o assistente daqui vai comparar com a qualidade de lá e não vai se subordinar a assistir em outro nível. Ponta Grossa já está falando em fazer arena – claro, menor, com menos requinte –, Maringá, Londrina, interior de São Paulo, o Palmeiras está construindo uma nova. É uma onda que vai revitalizar o futebol brasileiro. A conta dos estádios da Copa fechou com 94% de investimento público. O senhor vê gente disposta a investir nessa onda?

Eu acho que será 100%. E é investimento público, público. Quem tomará o financiamento não vai ser a iniciativa privada, vai ser go­­verno, para facilitar seu fluxo de caixa, seus orçamentos, para diluir isso em 10, 15, 20 anos. O investidor será o poder público. Esse é um ponto que gera muitas críticas. A imediata é a de prioridades de investimento. Ao invés de investir em estádio, que se in­­vista em saúde, educação, segurança.

Isso é uma visão extremamente mío­pe. Quem levanta esse tipo de coisa não sabe o que é uma Copa do Mundo. Segundo estudos de viabilidade apresentados ao governo brasileiro, cada R$ 1 investido na Copa do Mundo tem R$ 10 de retorno no período de amortização do investimento. É prioridade zero o Brasil trazer uma Copa do Mundo, assim como a Olimpíada. Você não organiza um país para receber uma Copa do Mundo. Você recebe uma Copa do Mundo para reorganizar alguns setores do país. Serve como vetor. Nós não vamos organizar o Rio de Janeiro para receber uma Olimpíada. A Olimpíada vem para ajudar o Rio a se reorganizar. Mas e a experiência do Pan, que foi um vetor do nada ao lugar algum?

Não dá para comparar Pan, a forma, a inexperiência. Falam muito do gasto do Pan, mas não foi jogado dinheiro fora. Tudo o que foi investido está lá, materialmente. Se foi gasto 4 quando poderia gastar 3, não entro nesse mérito, mas está lá. Tudo o que foi feito está sendo utilizado. Pretende participar como dessa operação Copa?

O que eu tinha de participar, já participei. Fomos superando obstáculo por obstáculo e acabamos conseguindo. Fiquei especialmente sa­­tisfeito, feliz e orgulhoso, dia 31 de maio, quando as 12 cidades foram anunciadas pelo presidente da Fifa e vi que Cu­­ritiba era uma delas. Ali, dei por encerrada a minha missão. O senhor conseguirá se manter como mero espectador pelos próximos quatro anos e meio?

Não vou ser mero espectador no resto do Brasil. Aqui, em Curitiba, serei mero espectador, não quero me envolver, porque a aldeia é complicada. O nosso objetivo era de fazer um projeto, elevar o Atlé­­tico Paranaense a um nível de destaque estadual além do que ele tinha e nacional que nunca teve. O futebol paranaense, nos 100 anos de existência, sempre foi considerado de segunda classe. Quando as cinco cidades previamente foram escolhidas (como subsedes da Copa) – Brasília, Rio, São Paulo, Be­­lo Horizonte e Porto Alegre –, eu dizia ao Ricardo Teixeira: "Pre­­si­dente, por que não Curitiba?". E ele: "Mário, qual é a representatividade que vocês têm no futebol? O que vocês representam no futebol nacional para ser naturalmente escolhido? É futebol que nós va­­mos disputar, não é qualidade de vida". Cansei de ir a reuniões de entidades dos clubes em que o Pa­­raná e nada é a mesma coisa. Mui­­tas vezes, entre aspas, me senti li­­xo. Na divisão do bolo, na força po­­lítica, quando se atribui uma pena por algum ilícito, na formação de uma tabela, nas transmissões dos jogos. Lixo. O futebol paranaense está regredindo?

Não. Nós crescemos em razão de um momento pontual, muito mais pelo enfraquecimento dos considerados grandes do que pela nossa força. Os grandes começaram a se reorganizar, se mexeram. Nós não temos estrutura nem condição de orçamento para estar en­­tre os maiores clubes brasileiros. A performance em campo, atualmente, é diretamente proporcional ao fluxo de caixa. Em 39 anos, o São Paulo tem seis títulos brasileiros. Em 35 anos, ganhou três. Nos últimos quatro anos, três. E quase foi de novo. Como nós, com um orçamento cinco, seis vezes me­­nos, vamos concorrer em uma atividade extremamente profissional, de altíssimos valores envolvidos, na mesma competição? A realidade do futebol paranaense é essa: lutar para não cair na Série A e ter algum destaque na Série B?

Se não tiver alguma coisa realmente moderna, visionária, revolucionária, que una esforços, que crie a mais valia, alavanque receitas, vamos voltar na proporção àquilo que sempre fomos: times de segunda lutando para ser time de primeira. O Paraná Clube, com esse orçamento, não será nunca um clube de primeira. Pode até por um mo­­mento, num vento favorável subir, empinar lá (risos)... a pipa. Mas depois vai cair. Há uma atenção muito grande para que o Brasil não vire uma Inglaterra, uma Espanha, uma Itália, onde começa o campeonato e a gente já sabe que A, B ou C será o campeão e os outros, coadjuvantes. Mas alguns se satisfazem como coadjuvante. O Everton acha o má­­ximo se ganhar uma vez do Liverpool e chegar na Liga Eu­­ropa.

Nós queremos isso? Eu não nasci para isso. Por que não podemos fazer um clube ou dois de representação nacional? Não entra na minha cabeça. Nós podemos (enfático). Foi provado que nós podemos, alcançamos um status. Então vamos daqui pra frente. Nós temos de nos profissionalizar. Como o senhor visualiza isso passando diretamente pela Arena Atletiba?

Ficou muito claro, escrito e assinado que o Atlético não pagaria para uma Arena em nível de Copa do Mundo, não precisa disso. Para o nível do futebol nacional, não precisa do requinte e da qualidade que a Fifa exige. Foi definido que essa diferença entre o que o Atlético pro­­jeta para si e a Fifa exige será pago por quem for ter o benefício (estado e município). Por ser necessariamente dinheiro público, não é justo que esse benefício seja de um clube só. É muito difícil colocar isso, porque parece que estou de­­fendendo o interesse do Coritiba. Não estou. Eu só tenho um interesse futebolístico na minha vida, por paixão, o Atlético Paranaense. Temos de trazer energia para realizar isso.

Estou falando do complexo, vai custar 250, 300 milhões de reais, porque tem de desapropriar área no entorno, envolver a viabilidade, mobilidade, revitalização do bairro, remodelar a praça. A Areni­­nha tem o dinheiro disponível no Ministério do Esporte para Curitiba fazer um ginásio. Curitiba não tem projeto e terreno, vamos acabar perdendo esse dinheiro. Por que não fazer o complexo todo, se o di­­nheiro está disponível? Por que quando é público um clube pode compartilhar com o outro? Está aí o Maracanã: 50 anos quatro clubes compartilhando. Privado não pode? Não consigo en­­tender a irracionalidade que leva o pensamento das pessoas ao bloqueio. Se o Atlético chegou até aqui sozinho, por que para terminar vai precisar do Coritiba?

Até aqui não serve mais. Essa é a visão que o atleticano não está tendo. Esse projeto é do caderno de 95. Nós vamos ficar para trás. Se o Atlé­­tico não revitalizar a Arena, começa já a curva da decadência. Daqui a dez anos ou a cinco, a história do futebol brasileiro será outra. E nós vamos ficar parados à sombra das conquistas de até aqui? Não serve mais para nada. Por que essa soberba, se o Atlético viveu a sua história em estádios de terceiros? Tem 85 anos, tem o seu estádio há dez e agora subiu à cabeça? Agora, se me disserem: "Mário, por que não fa­­zer sozinho?". Claro. Temos força para fazer sozinho? Vamos fazer. Faça o complexo sozinho, convença a prefeitura, traga os 150 mi­­lhões da Areninha, traga os 150 milhões para terminar a Arena a fundo perdido, não se endivide... (bate palmas) vou aplaudir. Consegue visualizar a Arena alviverde?

Claro. Não diria alviverde, mas uma cor neutra. Recebi de um torcedor e achei muito legal: "Presi­dente, ponha preto, vermelho, verde e branco numa lata, misture e a cor que sair pinte". Pronto. O que eu quero que seja rubro-negro é o time. Estádio, CT, maca, torcida, é meio. A alma do nosso Atlé­­tico Paranaense é o time em campo, a vitória, ser campeão. Como se faz isso? Com grana. Os torcedores do Coritiba perguntam: por que o Coritiba precisa entrar nessa?

Sozinho nenhum dos dois tem condição de fazê-lo. O Couto Pe­­reira não tem tamanho, condições de viabilidade de fazer um estádio. Não há retorno, investidor, forma de botar um projeto em pé de arena. Eu estudei mais de 30 projetos. Não tem como. E por que não o Pa­­raná? Minha proposta não foi dos três porque não cabem os três. Dois, até aí vai. Quando um jogar fora, outro joga dentro. vende duas vezes o mesmo camarote, duas vezes a mesma cadeira. Vai ter duas torcidas circulando nos bares, no centro comercial. Não vai ter re­­sistência nem conflito de torcida para criar temor de violência, quebra-quebra. Resolve um monte de problemas indiretos. O senhor tem alguma projeção de receita a ser gerada por um estádio único?

Não fizemos essas contas, mas pela nossa experiência de 14 anos com a pasta debaixo do braço tenho certeza absoluta de que essa união é geométrica. Um mais um é mais do que dois. O senhor vê Curitiba comportando três clubes?

Zero, zero. (desenha dois retângulos paralelos em um flip chart, representando as Séries A e B do Brasileiro). Anti­ga­mente, eram 24, primeira e segunda. Agora são 20 com tendência de ser 18, deixa passar Copa, isso vai diminuir mais ainda. A distância dos primeiros para esses aqui (parte baixa do gráfico) fica impraticável. Quando nós pegamos o Atlético, estava aqui (aponta a Série B no gráfico). Éramos menores que o Ju­­ven­tude, Portuguesa, os principais do Nordeste, todo o interior de São Pau­lo.

Começo desse século, pelo buraco havido aqui, ocupamos um es­­paço que não era nosso. São 12 grandes clubes brasileiros de faturamento hoje, o Atlético está aqui (rabisca o número 13). Não tem ne­­nhum clube que fature mais do que nós fora esses 12. Esses 12 es­­tão se reorganizando, vão ocupar isso aqui de novo, então nós vamos ficar aqui, no nosso lugar. Qual é a tendência se não fizer nada? (Bate na Série B três vezes). Isso é aritmético. É surpresa o Paraná estar aqui? Não é. A tendência do Paraná, com a reorganização de alguns estados e clubes... Terceira Divisão (desenha um terceiro retângulo). Daqui pra cá e daqui pra lá (aponta a flutuação entre as Séries B e C). Não aqui (Série A). Acabou. Nós temos 12. Atlético, Coritiba, Goiás, a volta do Guarani, Ponte Preta. O que vai sobrar para o Paraná? Nordeste, Bahia, Forta­­leza, tudo com estádio novo, se re­­or­ganizando. Esqueça. Quem não tiver essa visão do que está acontecendo, estará morto.

Qual é a minha proposta? Fazer algo aqui. O Coritiba foi um acidente, era para estar aqui (Série A), o Fluminense deveria ter caído. Foi o Sobrenatural de Almeida que fez o Fluminense não cair, a magia do futebol. Eu tenho certeza, esse ano, que o Coritiba volta pela força do seu clube. Mas vai ficar aqui (parte de baixo). Aí vem a visão míope de deixar o Coritiba morrer. Eu não quero. A nossa briga é aqui (metade de cima da Série A), não é aqui (metade de baixo da Série A). Temos de passar dos 12. É com essa gente que nós temos de brigar. Vamos nos unir aqui para su­­bir lá, e aí é uma questão de competência. E a Federação?

Não existe. É um modelo falido, que vem do Estado Novo, da Era Vargas. Não significa mais nada. Os clubes profissionais dos estados não existem mais, estão falidos, os Estaduais acabaram. Já deviam ter sido excluídos do nosso calendário há muitos anos. Só serve para a satisfação das federações e seus feudos. Federação não contribui com nada, só ex­­plora os clubes. Para que nós precisamos da Federação Parana­ense de Futebol? Me dê uma ra­­zão. Registro é na CBF. Para quê? Para organizar o Estadual? Como o senhor pretende participar da operação Copa pelo país?

Tenho minha origem empresarial. Nosso grupo pode fornecer grandes equipamentos para estádio. Por exemplo, nós temos uma das maiores fábricas de estrutura metálica do país, que fez até para o Atlético. Vou assessorar o PAC da Copa, um PAC da mobilidade muito forte. Temos fornecimento de sistemas de transporte ferroviário amplificado de pessoas. Partici­­pamos de metrô, então as cidades que terão de expandir esses sistemas, temos interesse de participar disso. Não estou assessorando clube nenhum, mas estamos sintonizados em função dos investimentos que a Copa trará para o Brasil nessas 12 cidades e seus reflexos. É nisso que estou voltado, para ver se sobram alternativas de negócios para o nosso grupo.

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