Certa vez, quando ainda jogava no sub-23 do Athletico, o goleiro Santos foi cobrado pela comissão técnica para interagir mais com os companheiros antes dos jogos, no vestiário. Naturalmente calado, o paraibano entendeu o recado, mas respeitosamente manteve sua posição. “Tem muita gente que fala e não faz. Eu prefiro fazer e não falar”, argumentou.
Aderbar Melo dos Santos Neto é daqueles que gosta de se provar com atitudes. E assim conquistou seu espaço no Furacão. Dos vários anos na reserva, soube esperar, ganhar a titularidade e entrar para a história do clube com defesas importantes e títulos.
Diante do Internacional, Santos tem a chance de conquistar a Copa do Brasil como titular. Em 2013, na outra oportunidade em que o Furacão alcançou a final, o arqueiro era reserva de Weverton.
Início
Aderbar desembarcou no CT do Caju em abril de 2008, aos 18 anos de idade. Já estava na mira dos olheiros do clube há algum tempo, antes mesmo de o Atlético formalizar parceria com o Porto-PE, em dezembro do ano anterior.
Mas foi a Copa São Paulo de Futebol Júnior de 2008 que confirmou seu ‘potencial’. A pedido do então preparador de goleiros atleticano Almir Domingues, o observador Flávio Mendes procurava por goleiros rápidos e leves. Encontrou.
“Fui ver um jogo do Porto contra o Paraná na Copinha. O Santos fechou o gol, pegou pênalti e tinha todas essas características”, conta o ex-zagueiro do Atlético, que na sequência foi morar em Caruaru para coordenar a parceria com o clube pernambucano.
“Acompanhei o Santos direto. Ele levava o time nas costas, já no profissional. Era pra ter vindo antes, mas ficou porque jogava o Estadual”, completa o olheiro.
Junto com Santos, outros dois jogadores do Porto vieram a Curitiba. O volante Rômulo, atualmente no Grêmio, e o atacante Rogério, que jogou o último Brasileirão no Sport. Somente o paraibano franzino ficou.
“O Athletico pagava R$ 25 mil por mês ao Porto e tinha prioridade para trazer alguns jogadores para a base. No caso de uma futura venda, o parceiro ficava com uma porcentagem do negócio”, lembra o olheiro Magno Morais, que trabalha na captação de talentos para o Atlético desde 2001.
“Vimos a qualidade dele e que teria grande projeção. Além do perfil magrinho, tinha tudo para evoluir na estrutura do Furacão”, acrescenta Morais, que acredita que o arqueiro representa um tipo de jogador que entrou extinção em boa parte do Brasil, mas que ainda tem habitat no Nordeste.
Nascido em Campina Grande e criado a cerca de 70 km dali, na zona rural de Cabaceiras, na região do Planalto da Borborema, Aderbar aprendeu a jogar futebol nas areias de um rio. Bem longe das escolinhas que dominam o cenário nas grandes cidades.
“Aqui [Nordeste] não acabou a várzea, o terrão. Então há inúmeras pedras brutas para serem lapidadas pelos treinadores”, diz Morais.
Liderança técnica
É claro que Santos aprendeu a se comunicar mais, principalmente em campo, à medida em que amadureceu. Hoje, é conhecido por sua agilidade, regularidade e frieza. E também por possuir um alto QI de futebol.
“Ele sempre foi muito atento às preleções, muito concentrado. E também se destacava muito nas dinâmicas de grupo que fazíamos para testar o coeficiente de inteligência... De fato, ficava bastante calado, mas até por isso seu senso de observação é muito maior”, diz o técnico Arthur Bernardes, que comandou a primeira leva do sub-23 do Atlético, em 2013.
Nesse contexto, Santos é o que chamamos no futebol de ‘líder técnico’. Suas habilidades falam por si só. Você nunca ouvirá que ele foi capaz de incendiar o vestiário no intervalo de um jogo, mas suas raras palavras são respeitadas no elenco.
“O Santos sempre foi muito dedicado, calado, observador, mas um goleiro técnico nos fundamentos da função. Uma pessoa com postura diferenciada, respeito e caráter”, atesta o técnico Marquinhos Santos, com quem trabalhou em vários estágios da formação, quando já tinha fama de pegador de pênaltis.
“Ele sempre treinou muito esse fundamento específico. Lembro que em 2009, quando fomos vice-campeões da Copinha, ele foi essencial nas cobranças de pênaltis contra o Cruzeiro, nas quartas de final, e contra o São Paulo, na semifinal”.
Para o goleiro Neto, do Valencia e da seleção brasileira, a humildade é a grande qualidade de Aderbar. Ambos conviveram durante anos na base atleticana.
“Ele gosta de estar com o pessoal da resenha, digamos assim. Gosta de uma boa risada como todo mundo, mas é muito tranquilão, quieto, ponderado. E muito humilde, daqueles que não muda com o tempo”, cita o amigo, que revela o apelido arqueiro de 1,88 m.
“Chamávamos ele de gato porque ele é muito rápido. Tem a velocidade de reação muito forte, os braços muito compridos, então consegue chegar muito fácil na bola”, elogia.
Paciência
Santos sempre teve a humildade de trabalhar e nunca abaixar cabeça. Teve paciência para esperar sua chance como titular no Athletico. E ela veio, de fato, somente após oito temporadas no plantel principal, quando o ídolo Weverton se transferiu para o Palmeiras no início do ano.
A chance provavelmente seria de outro prata da casa, Rodolfo, mas o jogador também deixou o clube no fim da temporada de 2017, quando seu contrato terminou. O destino foi a reserva do Fluminense.
Em 2018, foi eleito, por exemplo, o melhor goleiro do Brasileirão pelo site de estatísticas Footstats. Superou a desconfiança da torcida e agora, uma década depois de chegar ao clube, já realizou os primeiro sonhos no Furacão: ser titular e jogar regularmente.
Outros ainda seriam realizados. Decisivo na campanha que levou o Furacão ao título da Copa Sul-Americana 2018 e, da mesma forma, fundamental para a chegada na final da Copa do Brasil deste ano. Defendeu dos pênaltis no triunfo sobre o Flamengo, nas quartas, e mais um diante do Grêmio, na semifinal.
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