A maioria dos clubes da Série A do Brasileirão defende o projeto de lei que está em tramitação na Câmara dos Deputados para facilitar a transformação das agremiações em sociedades anônimas.
Dirigentes enxergam a possibilidade de novos investimentos a partir da entrada de empresas nacionais e estrangeiras. Por outro lado, especialistas alertam que a mudança jurídica não resolve problemas de gestão e que é preciso controlar gastos e aumentar receitas.
Dos 20 clubes da Série A consultados pela reportagem, 14 aprovam o projeto; seis não responderam. Para alguns, a entrada de novos investidores é questão de sobrevivência; para outros, aumenta a competitividade. Todos afirmam que a mudança pretende alinhar o mercado brasileiro ao que já que acontece na Europa, Ásia e América do Norte.
"Assim que aprovada a lei, apresentaremos para a assembleia de sócios a proposta para a criação de uma S/A", planejou Mario Celso Petraglia, presidente do Conselho Deliberativo do Athletico-PR. "Esse é o caminho. É o futuro. É o que já acontece nos grandes centros do futebol mundial", opinou Sérgio Sette Câmara, presidente do Atlético-MG
De autoria do ex-deputado Otávio Leite (RJ), o projeto de lei 5082/16 ganhou o apoio do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que esteve na sede da CBF e está visitando os clubes para defendê-lo. A proposta estabelece as condições para que os clubes de futebol se transformem em uma Sociedade Anônima do Futebol (SAF).
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O projeto será analisado por uma comissão especial e discutido no plenário na Câmara nos próximos meses. "O futebol brasileiro precisa de mais capital. Um clube associativo não vai atrair capital privado nenhum, muito menos estrangeiro. A forma de administração é primária, primitiva, atrasada, que não gera eficiência", afirmou o parlamentar.
O projeto prevê que os clubes deixem de ser associações sem fins lucrativos e passem a ser sociedades anônimas. É uma mudança na forma de administração que vai transformá-los em clubes-empresa. Com isso, eles terão acionistas ou proprietários, que podem ser outras empresas nacionais ou até estrangeiras. A transformação é opcional.
"A transição do futebol amador e semiprofissional para um patamar profissionalizado pode ser acelerado com a possibilidade da aprovação do projeto", disse Marcelo Almeida, presidente do Goiás.
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O advogado Eduardo Carlezzo, especialista em Direito Desportivo e autor do livro Direito Esportivo Empresarial, explica que a mudança na forma jurídica não significa a resolução dos problemas dos clubes.
"Desde 1998, nós tivemos vários exemplos de clubes que adotaram a formatação de sociedade empresária. Contudo, esta transformação não veio acompanhada de uma mudança de mentalidade, gestão e capitalização. O futebol brasileiro necessita urgentemente de um exemplo bem-sucedido nesta área", comentou.
Gustavo Vieira de Oliveira, CEO do Botafogo SA, clube paulista de Ribeirão Preto que adota o formato clube-empresa e disputa a Série B do Campeonato Brasileiro, afirma que um dos avanços é a gestão, mais técnica e mais profissional.
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"Os gestores são cobrados por resultados e adequação das estratégias definidas pelos sócios (clube e investidores) no âmbito do Conselho de Administração da empresa", explicou o dirigente. "Sem gestão e ambiente técnico-profissional, a empresa não dará um salto de qualidade, voltando a se portar como um clube associativo com nova roupagem", conceituou.
O exemplo mais recente de problemas de administração foi o Figueirense, que adota o modelo de clube-empresa, mas vive uma crise financeira que levou os atletas a se recusarem a entrar em campo no último dia 20 diante do Cuiabá, pela Série B. Motivo: falta de pagamento de salários.
Darcio Genicolo Martins, professor do departamento de Economia da PUC-SP e pesquisador em Economia do Futebol, explica que o formato atual de administração dos clubes dificulta a presença de investidores.
"O principal problema é a governança. Um investidor não tem segurança sobre continuidade do projeto, estabilidade financeira e que terá algum poder de decisão no clube", disse o professor da PUC. "No caso dos clubes menores, existem fatores externos, como a falta de calendário adequado. Não é possível fazer investimento de médio longo e prazo se o torneio dura apenas seis meses", exemplificou.
O futebol mundial possui inúmeros exemplos de clubes que se transformaram em empresas em todos os continentes. Grandes investidores controlam os clubes da Ásia (Japão, Coreia do Sul e China), América do Norte (Estados Unidos e México) e Europa (Alemanha, Itália e Inglaterra).
Na Premier League, por exemplo, tornaram-se notórios os casos dos empresários e grupos que se tornaram proprietários dos clubes como Chelsea (Roman Abramovich) e do Manchester City (Abu Dhabi United Group). Por outro lado, existem exceções. Real Madrid e Barcelona optaram por se manter como associações civil de acordo com a Ley de Sociedade Anónima Deportiva (SAD).
O exemplo mais próximo do Brasil é o futebol chileno. Os três grandes clubes do País (Colo Colo, Universidade de Chile e Universidad Católica) conseguiram mais investimentos, principalmente em infraestrutura, depois que tornaram sociedade anônima ao longo dos anos 2000.
Questão tributária
Um dos pontos importantes do projeto de lei é a questão tributária. Os clubes que optarem pelo novo regime serão tributados pelas mesmas regras das empresas comuns. Para estimular os clubes a se profissionalizar, o projeto oferece um regime transitório de apuração de tributos federais, o Re-Fut, pelo prazo de cinco anos.
Segundo esse regime especial, as SAFs poderão fazer um recolhimento único com alíquota de 5% sobre a receita bruta mensal. Esse pagamento corresponderá aos seguintes tributos: IRPJ, CSL, PIS, COFINS e Contribuição Previdenciária. Estão de fora os tributos municipais, como ISS e IPTU.
"O Re-Fut certamente representa uma vantagem tributária para os clubes que aderirem a ele, quando comparado ao montante hoje recolhido por um clube-empresa, cuja carga tributária é maior", explicou o advogado Rafael Marchetti Marcondes, do escritório Pinheiro Neto.
"Porém, a vantagem financeira da adoção dessa sistemática, quando comparada aos clubes que se revestem da forma de associações civis sem fins lucrativos, não é tão clara, em vista das isenções e imunidades concedidas a essas entidades, sendo necessário analisar o caso concreto", afirmou Marcondes, que também é professor em Direito Tributário e especialista em Direito Desportivo.
Clubes favoráveis à adoção do modelo de clube-empresa ouvidos pelo Estado:
Grêmio, São Paulo, Corinthians, Fluminense, Vasco, Bahia, CSA, Goiás, Avaí, Santos, Ceará, Fortaleza, Athletico-PR, Atlético-MG e Botafogo.
Clubes que não responderam:
Fluminense, Chapecoense, Palmeiras, Internacional, Flamengo, Cruzeiro
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