Na última quinta-feira (16), completou-se 25 anos do famoso Atletiba da Páscoa. O clássico, vencido pelo Coritiba por 5×1 e que transformou Brandão em ídolo alviverde, provocou a maior revolução da história do Athletico, liderada por Mario Celso Petraglia. Com o dirigente no poder em quase todo este período, o Furacão deu um salto que o colocou entre os protagonistas do futebol brasileiro.
História já conhecida e que, claro, será contada ainda nas próximas semanas. O Fernando Rudnick fez um trabalho brilhante ao recontar aquele clássico nas vozes dos jogadores do Athletico naquele dia – atletas que foram praticamente retirados da história do clube. E quem também ficou em segundo plano foi o grupo chamado de Retaguarda Atleticana.
Sem esses torcedores que viraram dirigentes, não existiria a “era Petraglia”. O hoje poderoso comandante do Athletico era um dos integrantes da Retaguarda, que começou como uma união para cobrar mudanças no clube e mais tarde virou uma "fábrica de presidentes". Entre 1972 e 1982, eles atuaram mais nos bastidores. Entre 1982 e 1995, estiveram no poder. Daí por diante, viraram coadjuvantes e depois desafetos de Mário Celso Petraglia.
A origem
A notícia tinha saído nas rádios e nos jornais de Curitiba – o Athletico não podia treinar porque o clube não tinha dinheiro para comprar sabão e lavar as roupas de treinos. “Eu fui ao clube para saber se era verdade. E era”, resumiu o ex-presidente Valmor Zimmermann, em entrevista à Gazeta do Povo/Tribuna do Paraná. Era o fundo do poço de uma crise financeira. Chocados com a situação, um grupo de torcedores decidiu resolver esse problema. Não queriam cargos, estariam dispostos a ajudar, mas esperavam ações afirmativas dos dirigentes. Ficariam na retaguarda. A Retaguarda Atleticana.
Esse grupo era liderado por Valmor e Valdo Zanetti, mas tinha outros nomes conhecidos – José Carlos Farinhaque, Onaireves Moura, João de Oliveira Franco, Ítalo Conti Júnior, Aírton Galina, Celso Gusso, Salmir Machado. Eles acabaram se tornando um suporte do então presidente Lauro Rêgo Barros (“Ele foi fantástico”, diz o ex-presidente rubro-negro), e em 1974 entraram oficialmente na política do Athletico, através do Conselho Deliberativo.
Um novo integrante
A Retaguarda Atleticana foi ganhando mais componentes com o passar dos anos. Um deles passou a integrar o grupo anos depois pelas mãos de Valmor – um diretor da poderosa Inepar, Mario Celso Petraglia. Nesse período, a influência já era grande, a ponto de decisões como a criação de um time de futebol de salão do Furacão ser exclusiva da Retaguarda. “Passamos a pagar a conta do telefone, contratar jogadores, pagar os bichos atrasados”, conta Zimmermann. O Athletico devia até para uma mãe-de-santo.
(Vale um parêntese sobre essa história. Véspera de Atletiba e Lauro Rêgo Barros tinha sido até ameaçado para ganhar o clássico. Sugeriram a ele que fosse a uma mãe-de-santo para ‘amarrar’ o goleiro Jairo. O presidente rubro-negro acabou indo e começou levando uma descompostura por causa dos trabalhos não pagos. Feito o acordo, o bonequinho que representava o Pantera Negra amarrado e o Furacão foi para o clássico. Que terminou 2×0 para o Coritiba, com Jairo fechando o gol. Rêgo Barros foi à mãe-de-santo e recebeu a seguinte desculpa: “Esqueci de dar o nó no bonequinho”.)
Mesmo já dentro da estrutura rubro-negra, o grupo ainda não tinha chegado ao poder. Em 1976, a maior raposa da política paranaense, Aníbal Khury, conseguiu dobrar os jovens e ser eleito presidente. Na gestão seguinte, de Antônio Guimarães Lück, a Retaguarda ganhou força – depois de nova crise financeira, o grupo entrou pra valer na diretoria, com Valmor passando a ser o braço direito de Lück.
O poder
Apenas em 1982 a Retaguarda Atleticana emplacou um presidente – Onaireves Nilo Rolim de Moura. “Era para eu ser o candidato, mas eu não tinha condição. Aí fui o primeiro a assinar a candidatura do Moura”, conta Valmor Zimmermann. As campanhas daquele ano e de 1983 foram lideradas por ele e João de Oliveira Franco, o trio que comandava o Furacão. O sucesso fez com que Valmor fosse eleito para o período 1984/85. Em quatro anos, foram três títulos paranaenses e o terceiro colocado no Brasileirão de 1983.
Foi na gestão de Zimmermann que Mario Celso Petraglia virou diretor financeiro do Athletico. “Logo saí (em 1985) porque vi que o futebol era algo muito difícil de se lidar. Vi que não era o meu momento, pois eu não tinha condições, tempo e vontade para conviver com tudo aquilo”, contou o atual presidente rubro-negro, em entrevista para a rádio Banda B em 2004.
O grupo se manteve no poder com a nova gestão de Valmor, entre 1988 e 1989, e de Farinhaque, de 1990 a 1993. Neste período, foi resolvida a questão do PAVOC, que anos mais tarde seria decisivo na reestruturação do clube. Petraglia, que voltara ao clube em 89, saiu do Furacão no ano seguinte porque tinha rompido com Farinhaque – os dois passaram a ter uma relação de rompimentos e reconciliações até hoje. Na gestão de Hussein Zraik, outra vez a falta de dinheiro estava levando o Athletico ao buraco.
A revolução de Mário Celso Petraglia
Veio aí a mudança radical no clube, liderada por Petraglia. Que na primeira e segunda fases do projeto, em que o Furacão saiu da bancarrota e passou a disputar títulos nacionais (pra contextualizar, o terceiro período, o da consolidação, foi até o final de 2018, e o atual é o quarto, da expansão internacional), teve ao lado vários colegas da Retaguarda Atleticana.
Mas aos poucos foi se afastando deles, até um rompimento generalizado em 2002, na época do “Fica, Petraglia” – quando o presidente renunciou para voltar nos braços do povo, fazendo o que Jânio Quadros tentou e não conseguiu. “Em 2002, com o nosso rompimento e renúncia, e com o movimento ‘Fica, Petraglia’, eles foram embora e falta nenhuma fizeram!”, disse o dirigente em um texto publicado em 2011. “Hoje o Mario é um bem do Athletico”, comenta Valmor Zimmermann.
Já a Retaguarda Atleticana é um retrato na parede da memória. “Há quem diga que o Athletico foi fundado em 1995, mas esquecem de tudo que foi feito antes”, afirma Valmor . No futebol dos milhões, o Rubro-Negro de hoje só existe porque abnegados gastaram alguns cruzeiros para comprar sabão.
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