O baiano Figueroa Conceição cravou o nome na canoagem brasileira como o descobridor de Isaquias Queiroz, atual campeão mundial e uma das maiores esperanças de pódio do Brasil na Olimpíada Rio-2016. Agora, o treinador das seleções brasileiras júnior, sub-23 e feminina de canoa tenta fazer com que quatro atletas da África também entrem para a história esportiva de seus países.
Há um ano e quatro meses, dois canoístas de São Tomé e Príncipe (Altamiro Ceita, 26 anos, e Buly Triste Afonso, 24) e dois de Moçambique (Mussá Chamaune, 24, e Joaquim Lobo, 21) treinam com Conceição e seu auxiliar, Alex Moscoso, em Curitiba, no Parque Náutico do Iguaçu. O intercâmbio faz parte do acordo entre a Confederação Brasileira de Canoagem (CBCa) e os comitês olímpicos dos dois países. No fim de março, no pré-olímpico africano em Durban, na África do Sul, os quatro vão em busca da classificação de seus países para os Jogos.
No Mundial de Canoagem em Milão, em 2015, as duas duplas fizeram com que seus países terminassem pela primeira vez entre os 16 melhores na prova dos 1.000 metros de canoa em dupla, a C2 (1.000m). Os são-tomenses foram os africanos mais bem colocados, com o tempo de 4min14s. Já os moçambicanos foram a segunda melhor dupla africana, com o tempo de 4min34s.
Além dos tempos, Conceição acredita na conquista do índice olímpico pela dedicação dos quatro. “Eles são disciplinados. Não questionam as orientações, vão lá e executam. São um exemplo até para os canoístas brasileiros”, enfatiza o treinador, que cita a parte técnica como a principal evolução dos africanos. “Quem viu eles quando chegaram e agora não acredita na evolução. Eles não tinham muita estabilidade, viravam muito o barco na água. O que faltava para eles era estrutura de treino”, aponta o técnico.
Ceita, Afonso, Chamaune e Lobo concordam com Conceição. Tanto em São Tomé e Príncipe quanto em Moçambique os treinos eram no mar, pela distância muito grande da lagoa mais próxima. “Quando o mar ficava agitado, não dava para treinar”, explica Ceita. “Numa lagoa, você tem estabilidade no barco e mais condição de alcançar velocidade”, explica Afonso.
Os africanos também não tinham treinador e nem academia de musculação em seus países. “Treino físico em São Tomé era corrida na praia, barra, flexão, abdominal, tudo por conta própria”, lembra Afonso. “Treinando em Curitiba consegui baixar meu tempo individual de 3 a 4 segundos, o que seria muito difícil em Moçambique”, compara Lobo.
Saudade
Conceição afirma que os quatros chegaram a pensar em desistir algumas vezes dos treinos em Curitiba pela saudade da família na África. Mesmo assim, nenhum diminuiu o ritmo nos treinos. “Eles podem estar sentindo a dor do mundo, mas treinam sempre com afinco”, enfatiza.
Quando a tristeza chega, Lobo se apega à possibilidade de realizar o sonho de ir para a Olimpíada. “Penso no meu objetivo, que é muito maior do que todas as dificuldades”, reforça o moçambicano, o caçula da turma. Mesma tática de Afonso. “Tiro muita força quando falo com minha mãe e meus irmãos. Eles sempre dizem para eu ir até o fim”, afirma o são-tomense.
Chamaune chegou a sonhar que havia conquistado uma medalha. “Mas só o fato de ir para a Olimpíada já vai ser uma realização para mim e para o meu país”, contenta-se. Enquanto que Ceita já tem para quem dedicar o índice olímpico se ele vier. “Vai para o meu filho, Tiago, de 5 anos, que está com a minha mãe enquanto treino aqui”, afirma Ceita, que chegou a jogar pela seleção de futebol de base de São Tomé e Príncipe e teve de vencer um obstáculo bem particular para quem nasceu e cresceu em uma ilha antes de iniciar na canoagem há cinco anos: o medo de água.
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