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Ih! Rapaz! A coisa aqui tá preta; eu não deveria te dizer, mas essa lua, mas esse conhaque botam a gente comovido como o diabo*. Negócio seguinte: estou viciado na Baixada, dependente do Joaquim Américo, sinto terrível síndrome da abstinência relativamente à Arena ainda ferradura, ferra&dura, ferra, dura, dura, dura.

– Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?

– Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.**

– Adiós, muchachos, compañeros de mi vida...

Não quero exagerar, mas acho quase todos os jogos nos outros estádios da pátria amada, idolatrada, nos outros campos do Brasil, porcarias, chatos, tediosos, bocejantes, narcóticos. Não me concentro, fico a apontar os defeitos que mudam o rumo da bola, que o corrompem, que a desviam do seu destino.

– Por que será, cara pálida?

– Elementar, caro Watson. É praticamente impossível jogar mal no gramado da Baixada – que melhora a cada 15 minutos, que está anos luz à frente de todos os outros. O assim chamado tapete verde do Rubro-Negro&preto é páreo pros europeus, coisa de primeiro mundo, a se aproximar perigosamente dos ingleses, primeiros, únicos, indisputáveis.

– Qual o segredo, o pulo do gato?

– Atenção + encantamento!

– O binômio de Ortega y Gasset para o amor?

– Exatamente. Pois o gramado do Trétis só pode ser produto do amor. Ou não? Do amor pelo futebol, do amor pelo verde, do amor pela grama, do amor pelo aprumo, do amor pelo nivelamento sem hiatos, sem vácuos, sem ecos, sem vazios, do amor pelo jogo bem jogado, do amor pela bola, do prazer de vê-la correr para lá, para cá, praqui, pra acolá, sempre rente à grama, cerce como diria o Nava, cosida à grama de tal modo que se não fosse bola seria grama, gramado, grama amada, grã grama, grama ouro, ouro em grama, grama áurea.

– É a regra 1, rapaz! A regra 1 levada a sério, a regra 1 ao pé da letra, a regra 1 no seu generoso espírito, a regra 1 no seu esplendor, a regra 1 com toda a pompa que as circunstâncias exigem, pedem, esperam, sonham, fantasiam, imaginam, querem.

Ao saudoso João Saldanha, intrigado com a precedência dada ao campo e não a bola, o proverbial velhinho inglês da International Board teria explicado: "Quando as regras foram escritas imaginamos bons jogos, e bons jogos só são possíveis com bons campos". E mais não disse nem lhe foi perguntado; João ficou satisfeito. (Se non è vero è bene trovato, non? Em bom português, se não é verdadeiro é bem inventado, não?)

Notas

* Versos do Drummond.

** Versos do Bandeira.

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