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Estou a reler Nelson Rodrigues. Ou melhor, a reler suas crônicas esportivas publicadas em revistas, jornais. É um verdadeiro barato, é o barato. Trata-se de mais uma coletânea de textos escolhidos pelo Ruy Castro, autor da biografia do Nelson, "O Anjo Pornográfico". E como sempre editado pela Companhia das Letras. Título? "A pátria em chuteiras".

Alguns dos textos foram publicados originalmente na Manchete Esportiva, publicação semanal da Bloch. Que foi ao ar lá pela metade dos anos 50. Início do meu contato com o grande escritor, dramaturgo, jornalista.

Adolescente, morava em Irati. Pra ser sincero, demorei a entrar no espírito da coisa. Ou para admirá-lo; preferia o irmão mais velho, Mário Filho. Também grande cronista esportivo, autor do clássico "O negro no futebol brasileiro".

O caro amigo Zé Maria Orreda não se deixava enganar: admirava o Nelson incondicionalmente. E nos seus comentários não deixava de fazer a talvez maior homenagem possível a um escritor: isto é, dava discretas imitadinhas no personalíssimo estilo do Nelson.

Com exagero é possível afirmar que inexiste ou inexistiu no mundo cronista esportivo comparável ao Nelson Rodrigues. As coisas que via no joguinho! Uma sucessão de espantos! Tudo transmitido naquele seu jeito cheio de verve, de humor, de paradoxos, de exageros, de piadas, de polêmicas diretas e indiretas. E as frases imortais, claro. Sua marca registrada.

Tantos anos depois de publicadas aqui e ali, as crônicas continuam atuais, legíveis, palatáveis. Tendo o futebol como tema, Nelson captava boa parte da alma do brasileiro, do nosso estilo de viver, de estar. Como dizia o Gláuber Rocha – Nelson é o dramaturgo do inconsciente coletivo brasileiro.

Um exemplo entre tantos: o subdesenvolvimento mental. Expresso na admiração bocó pelo futebol europeu, acompanhado de furibundas críticas ao nosso. Nelson não perdoava.

Que admiremos os gramados europeus, alguns árbitros europeus, que admiremos os estádios europeus, que admiremos – como ele não se cansava de repetir - a saúde de vaca premiada do jogador europeu, tudo bem. Mas admirar a maneira européia de jogar o velho, o rude esporte bretão? Tenham paciência, isso não, tudo menos isso.

Pra encerrar. Foi ele quem cunhou a célebre frase: "O escrete é a pátria em chuteiras". Com a qual impliquei anos, sob o pretexto que não devemos misturar esporte com patriotismo.

Besteira do locutor que vos fala. É a pátria de chuteiras porque nos identificamos como se ele a encarnasse. E a encarna, não?

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