Como pode um jogador com a qualidade técnica e física de Carlos Alberto Torres, em 20 anos de carreira, ter jogado apenas uma Copa do Mundo, querendo e podendo participar de outras?
Para qualquer outro jogador, seria o caso de enfiar os cotovelos numa mesa de bar. Pedir uma dose dupla. Chorar a dor de cada não convocação. Ouvir, de quebra, um clássico de Lupicínio Rodrigues.
A “vingança” do Capita, porém, foi diferente. Cada vez jogava mais e abria o bico. Denunciava. Dava nome aos bois. Disse que na Copa de 1966 o supervisor da seleção, Carlos Nascimento, interferiu para que ele não fosse convocado. O “cartola”, segundo seu depoimento, era ligado ao Fluminense e não gostou da saída dele para o Santos. Foi o castigo. Convocaram o fantástico Djalma Santos, já em fim de carreira, e o medíocre Fidélis.
Depois do tricampeonato de 1970, Carlos Alberto continuou sendo o mais eficiente na posição. Em 1974, outro golpe. Zagallo ficou incomodado com uma entrevista do lateral sobre a mexida tática durante o jogo Brasil e Uruguai, na Copa do México.
Naquela partida, é bom lembrar, Gérson estava sendo bem marcado. Depois do gol uruguaio, Carlos Alberto orientou dentro de campo a troca de posição do meia com o volante Clodoaldo. Sem consultar o técnico.
Com a alteração, Gérson ficou mais atrás, sem o marcador implacável, e Clodoaldo se soltou fazendo o gol de empate para o Brasil, que depois virou o jogo. Zagallo engoliu, mas não digeriu. Veio o troco. Zé Maria foi o titular na Alemanha.
Antes da Copa da Argentina (1978), ainda em grande forma, disputou as eliminatórias. Cláudio Coutinho costumava ouví-lo a cada convocação. A dele parecia inquestionável. Qual o quê! Foi preterido outra vez. A ordem viera de cima. Esse foi Carlos Alberto Torres. Um líder natural. Sem papas na língua. Daí o medo do patrão. Que tremia. Que o temia.
A insegurança (ou orgulho) gera o medo. Aquele que comanda, muitas vezes pune o comandado sob o manto da hierarquia. Ao contrário, o chefe seguro, conhecedor, sábio, solta as rédeas e até prefere subordinados com perfis de liderança. Carlos Alberto foi vítima dos fracos.
Do lado oposto a esses, lembro de Paulo Machado de Carvalho, Jofre Cabral e Silva, Arzúa, Neves, João Saldanha, Tim, Almir de Almeida, e um ou outro que preferiam lidar com atletas de personalidade como a de Carlos Alberto. Ou de Hidalgo, o nosso capitão. Por isso foram dirigentes e técnicos diferenciados. Fortes. Altivos.
Hoje também não há mais esse tipo de jogador. O mercado não recomenda. Os últimos que eu me lembro foram Paulo Baier, Alex e Ricardinho. Uma espécie de ameaça para a chefia alienada. Ressalvando uma ou outra pisada de bola – como a crítica infeliz a Tostão por não ter compactuado com o “bicho do Planalto” para os tricampeões mundiais –, Carlos Alberto Torres deixa saudades e bons exemplos.
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