Começo esta coluna olhando para o quadro de medalhas do Pan. O Brasil acaba de perder o segundo lugar para Cuba: 42 a 40 nas medalhas de ouro. Poderia, porém, recuperar a posição ontem mesmo.
Há exatos vinte anos, estava eu em Havana cobrindo o Pan de 1991. Começava ali o acompanhamento de uma série de eventos multiesportivos relevantes. Em Cuba, vivenciei um dos jogos mais eletrizantes de todos os tempos. O ginásio abarrotado de torcedores locais e alguns poucos brasileiros lá todas as competições foram com portões abertos. Viram eles, e eu também, Paula, Hortência e cia. arrasarem as meninas de Fidel.
Lembro que conversei com a técnica Maria Helena (que foi jogadora de outra geração fantástica com Marlene, Heleninha e as paranaenses Aglaé e Marta), um pouquinho antes do jogo. Perguntei: "E daí, Maria Helena? E ela, segura e devota, foi direta: "Elas têm o Fidel aqui no ginásio para motivar; nós estamos com Deus para ganhar". Não deu outra e, na entrega das medalhas de ouro, o comandante curvou-se ante Hortência e Paula, beijou-as e confidenciou: "Com vocês duas aqui, nosso basquete esporte praticado por ele há anos seria imbatível".
Pois é. Nossas mulheres driblam o preconceito para chegar ao objetivo. Superam todas as barreiras, com garra e perseverança. Certa vez, Maria Lenk, a primeira mulher sul-americana a participar de uma Olimpíada, foi ao meu programa de televisão. Depois de falar dos Jogos em que participou 1932 (Los Angeles) e 1936 (Berlim) disse-me que começou a nadar aos oito anos, no Rio Tietê. Meu ar foi de espanto, mas ela emendou: "Em 1923 não havia piscina em São Paulo. Ah, e o Tietê não era esgoto a céu aberto".
Como Maria Lenk (falecida em 2007, aos 92 anos) a vida de nossas guerreiras não foi e não é fácil. Lembro-me do filme Menina de Ouro, ganhador de Oscar. Nele, Clint Eastwood fez de Maggie (Hilary Swant) uma lutadora determinada a vencer em um esporte tipicamente masculino, o boxe. Mesmo sabendo que a vida pode nos pregar uma peça, por mais forte que a mulher seja, ela vai até o limite do corpo, e às vezes perde. Faz parte da vida.
No Pan, recordei este filme enquanto corriam lágrimas dos olhos de Maurine e Debinha. Uma pela vitória e o gol marcado contra o México; a outra pelo pênalti e o ouro perdido na final do futebol. Por tudo isso, quero deixar aqui o meu tributo a todas essas meninas de ouro que correm atrás de um sonho, por mais difícil que seja. Todas têm o caráter de ouro. Seja quem vai ao pódio (Maurren Maggi, Lucimara Silvestre, Dayane Amaral...) ou não (Fabiana Murer e outras).
E assim o Pan de Guadalajara está terminando, com outra medalha para uma companheira da casa, que sobe ao pódio depois de excelente cobertura para a Gazeta do Povo: a nossa menina de ouro Adriana Brum.