Chapecó é uma cidade onde criei forte identidade. Minha mulher e meus filhos nasceram lá. Meu sogro, Fidélis Grando, gaúcho de origem italiana, foi um dos pioneiros da cidade. Na época usava-se a ortografia de origem tupi, Xapecó, com “x”.
Não por isso nossa dor familiar foi maior ou menor do que o sentimento de pessoas espalhadas pelo mundo, familiares, amigos e desconhecidos, cada um expressando a seu modo.
Por que o grau de comoção da catástrofe atingiu tão forte o Brasil e o resto do mundo? Penso que a razão esteja na pureza da essência da Chape, enquanto entidade esportiva. Quando a causa é sublime, real, verdadeira, ela carrega uma força descomunal.
A Chape é a história do mestre que surge para ensinar o discípulo. E o discípulo – dirigente, torcedor, atleta – estava pronto para ouvi-lo.
O abalo do desastre aéreo que vitimou a Chapecoense, sem a intenção de comparar, repercutiu como nenhum outro.
Em Curitiba, a maior comoção que me lembro, foi o funeral de Jofre Cabral e Silva, presidente do Atlético. No Brasil, Airton Senna e Tancredo Neves. No mundo, Luther King e John Lennon. Todos transmitiam, assim como a Chape, um lema: a esperança do bem.
A Chape quebrava o paradigma de que os meios, mesmo que escusos, “justificam” os fins. Para o clube catarinense, os meios lícitos e responsáveis é que consagram os fins. Valores raros hoje no mundo de “ricos e famosos”. No futebol ou fora dele.
Tudo foi muito incrível de terça-feira pela manhã para cá, quando soube da tragédia. Desde os comentários de rua à mensagem do Papa. Da inocência do indiozinho Carlos Miguel, de 5 anos, mascote da Chape, à incrível homenagem do povo de Medellín.
Semanas atrás acompanhei os dois jogos contra o San Lorenzo. Em Buenos Aires e em Chapecó. Contra clubes argentinos, os brasileiros costumam se encolher. A Chapecoense não. Eliminou também o Independiente com rara personalidade, técnica e garra.
Esperava vê-los aqui na próxima quarta-feira decidindo o título. Minha mulher, que não é chegada ao futebol, pediu para ir ao Couto Pereira. Queria ver sua Chape, do amigo Maninho, ao vivo. Iríamos ao jogo.
Na semana passada, portanto antes do desastre, concluí minha coluna assim: “O acalanto natalino vem de Chapecó (...). A peregrinação de torcedores do Verdão do Oeste estará ali ao lado da igreja do Perpétuo Socorro (...). 480 km de um ‘Caminho de Santiago’ para venerar as relíquias do clube sensação do Brasil. Um exemplo de competência administrativa. Tudo será verde no Alto da Glória. A cor da esperança. Sim, uma procissão de esperança e fé para alegrar o futebol”.
A beleza das homenagens, a solidariedade, não elimina a dor, mas a torna suportável. A Chape subiu como um cometa e deixa um raio de luz para iluminar um novo clube. Com certeza.
Hoje, porém, o resumo é cruel: pane seca. Lágrimas incontidas.
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