Brasil e Uruguai jogaram sexta-feira pelas Eliminatórias da Copa da Rússia, mas como o horário para a entrega da coluna não permite, enquanto escrevo, é claro, não tenho como prever o que houve.
Mesmo que soubesse, não usaria este espaço para fazer paralelos de resultados com aquilo que ouvi a vida inteira: a “tragédia de 1950”, o “Maracanaço”.
A perda daquela Copa em casa, além de fatigante, já foi absorvida pela vergonha maior do futebol brasileiro de todos os tempos, o 7 a 1 de 2014.
Por outro lado, dias santificados como estes são propícios para refletir sobre as marcas deixadas pela injustiça e a impiedade cometida muitas vezes contra jogadores de futebol.
Os vice-campeões mundiais de 1950 foram execrados pela opinião pública, sem nenhum ato de solidariedade ou defesa de quem quer que fosse. Cartolas e políticos que os badalavam, lavaram as mãos como Pôncio Pilatos.
Ficaram, porém, os fatos. E o melhor registro foi o documentário Dossiê 50 – Comício em favor dos Náufragos, um trabalho fantástico do jornalista Geneton Moraes.
Alguns dos jogadores, pasmem, morreram (não há nenhum jogador vivo) levando para o túmulo a pecha de “traidores da pátria”. Como se tivessem entregado o jogo para o Uruguai em troca de 30 moedas. E ficou cristalizado como uma “verdade”.
Traço este paralelo num momento de fanatismo sem freios por todo o país. De intolerância sem fim. E que abre espaço para justiceiros, como aqueles que esta semana atacaram os jogadores do Atlético, numa emboscada depois da derrota para o Coritiba. E que foram julgados como traidores.
Judas Iscariotes traiu Jesus? Nem isso se sabe. Embora quase todos aqueles que se intitulam cristãos (ou não) “tenham certeza” disso. Mas um documento escrito em papiro, e encontrado em 1978 no Egito, contesta essa teoria.
O que observo hoje é a exposição dos jogadores nos momentos ruins. Não há blindagem. Nem do departamento de futebol, muito menos por parte dos cartolas.
Há exceções como a de Cuca, que chamou para si a responsabilidade por derrotas, livrando seus comandados da fúria das organizadas.
Malhar Judas é símbolo inconsciente de linchamento humano. É uma idiotice. Aliás, que eu já cometi na infância. E que me arrependo. Perdoar é preciso. Não só em datas religiosas.
O cidadão Cruyff
A vida e a morte de Cruyff, o líder do Ajax, Barcelona e Holanda, foi comentada com riqueza de detalhes durante esta semana. Não teria nada mais a acrescentar sobre um dos maiores talentos do futebol.
Resta-me, porém, fazer um registro de Johan Cruyff, pessoa física, gente, ser humano. Em 1978, no auge da carreira, e com a Laranja Mecânica encantando o mundo, Cruyff se negou a disputar a Copa da Argentina por uma simples razão: não concordava com o golpe militar, que impôs ao país sede uma das mais sangrentas ditaduras.
Obrigado, Cruyff!