Qualquer avaliação que se faça sobre o êxito ou não dos Jogos do Rio, com uma semana de competição, pode ser precipitada. O correto é avaliar depois do encerramento. Isso vale para organização, desempenho de atletas, legado, e outros temas debatidos à exaustão por todos.
Melhor neste caso é selecionar fatos que em uma semana merecem reflexão um pouco mais profunda. Por exemplo, o que levou atletas de ferro como o gigante Michael Phelps, a judoca Rafaela Silva – ou então a nadadora Rie Kaneto (as japonesas sempre se mantêm contidas ao extremo) – a chorar de alegria depois da vitória?
Debulhar lágrimas de emoção ou de tristeza é normal para a maioria dos atletas após o êxito ou o fracasso. O que não é normal, porém, para atletas autocontrolados com rigor, ou traumatizados por alguma razão. É o que nos remete aos porquês.
Como entender o que cada lágrima é capaz de expressar de um sentimento? Durão na queda, não vi Phelps chorar em Pequim, quando assombrou o mundo, e nem mesmo quando subiu ao primeiro pódio pela primeira vez em Atenas. Por que então chorou de emoção no Rio? Pelo reencontro que teve com o pai até então ausente? Ou por ele mesmo se tornar um pai presente (quem não lembra do beijo de Phelps na bochecha do pequeno Boomer, seu filho, depois da prova dos 200 m)? E o chororô de Rafaela Silva, nossa guerreira do tatame, durante os últimos acordes do hino?
Como explicar que aquela menina sofrida, forte, capaz de aguentar todas as torturas que a vida lhe impôs, vítima ainda de racismo cruel, não havia até então derramado uma gota de lágrima sequer? Na dor do castigo ou na alegria das vitórias? E que expressou depois de receber a medalha de ouro, o lado mais íntimo do sentimento humano?
Talvez tenha sido o instante mágico do desabafo da injustiça, no sentido mais puro e positivo do merecimento armazenado de Rafaela. Como saber? Muitos choram em silêncio, sem que as lágrimas caiam, como Thiago Pereira, sexta-feira, na piscina. Outros por medo antecipado, como Thiago Silva, antes da decisão nos pênaltis contra o Chile, na Copa de 2014. Alguns na dor física, como a ginasta Jade Barbosa, quando torceu o tornozelo na quinta-feira. Muitos de tristeza, como as meninas do futebol feminino na frustação da perda do ouro em Atenas e Pequim.
Enfim, esses demônios internos, diante da maior mídia televisiva do planeta, apenas extraem e expõem por meio dos atletas aquilo que todos nós ocultamos, que é o sentimento contido. Aí fica também uma pergunta: jornalista tem o direito de expressar emoção?
Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. O que confesso não tem importância. Faço paisagem com o que sinto (Fernando Pessoa).
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