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Você já viu um ninho de beija-flor? Pois eu tive o privilégio de acompanhar esta obra divina, concebido no terreno de minha casa, no Bom Retiro.

O planejamento e a arquitetura desses artistas são de causar inveja a Lúcio Costa e a Niemayer. Os traços delicados e a execução sem andaimes só são possíveis porque o beija-flor flutua no ar.

O "leito" da futura mamãe é artesanalmente trançado por galhos ultraleves. O ninho suspenso é preso em finas ramificações de plantas, e, quando concluído, tem o formato de uma pequena cuia. Ele é tão frágil que qualquer sopro de vento parece um "El Niño" disposto a desabá-lo.

O macho até que ajuda na mão de obra, mas a tecelã é a fêmea. Ela faz o acabamento e dá o toque de classe. Depois de botar os ovos – normalmente são dois – ela choca até o nascimento, quando começa a trazer bichinhos pelo bico para nutrir os famintos bebês.

Aí então a natureza se encarrega do resto, os filhotes criam penugem, crescem e saem para a vida, colorindo nossos olhos por este mundo a fora. Coisas de supermãe!

Bem, ontem à noite, depois de acompanhar as provas de atletismo, vi aquela multidão do lado de fora fotografando e filmando o show de luzes entre o "Cubo d Água" e o Estádio Olímpico, batizado como "Ninho do Pássaro".

Não sei dizer qual dos "ninhos" mais me impressiona, mas, seguramente, afirmo que ambos foram feitos para as fêmeas desfrutarem. É um pequeno reparo pelo grande estrago até então causado a elas.

E aqui em Pequim tudo parece apropriado. A "Cidade Proibida" não é mais proibida e a Imperatriz não abre mais seu espaço para as concubinas do Imperador. O Comitê Olímpico, também há muito tempo, não atende aos preconceitos caducos que impediam o acesso das mulheres ao esporte.

A participação do atletismo nos Jogos é mista, e as múltiplas provas são executadas por homens e mulheres. Mas, os momentos mais emocionantes vividos pelo grande público, naquela noite, ficaram por conta das três jamaicanas que arrasaram na corrida de 100 m, ganhando ouro, prata e bronze.

Também a russa Gulnara Sami, que quebrou o recorde nos 3.000 m com obstáculos, levou o público ao delírio com uma diferença enorme para a segunda colocada.

Na verdade, o palco é de todos – atletas, público, dirigentes, jornalistas, voluntários –, homens e mulheres de todas as nações. Mas o "Ninho", este carinhoso e bem achado "Ninho", deve acolher simbolicamente todas as mulheres que, de alguma forma, participam das Olimpíadas.

Várias mulheres foram fundamentais para este avanço, como Charlotte Cooper, a primeira a competir e a quebrar o tabu. Mas a holandesa Fanny, mãe de dois filhos, competiu e ouviu da burguesia: "é uma vergonha! Mãe de dois filhos e correndo de calção. O troco veio na conquista de quatro medalhas de ouro. É, até hoje, a única mulher a ganhar quatro ouros no atletismo numa mesma Olimpíada.

Charlotte, Fanny, a romena Nadia Comaneci – a maior ginasta de todos os tempos – abusada pelo filho do tirano Nicolae Ceausescu, e todas as outras que ajudaram a quebrar a barreira deste preconceito milenar, são beija-flores que devem ser acolhidas simbolicamente no seu "Ninho" de Pequim.

Praia, futebol e mulher

Não necessariamente nesta ordem, mas são três produtos made in Brasil. E, se a coluna hoje reverencia as mulheres, louvemos então Isabel Swan e Fernanda Moreira, as primeiras a ganhar medalhas Olímpicas na vela.

E, no futebol, depois da goleada sobre a Alemanha, vai se repetir a decisão de Atenas. A final será no templo de Mao, o Estádio dos Trabalhadores. Para elas entrarem no "Ninho", somente os filhotes de Dunga poderiam levá-las para torcer pelo ouro masculino. Uma questão de cavalheirismo. No mínimo.

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