Lembro do dia em que tive a plena consciência de que o Paraná já não era mais o mesmo. Não faz muito tempo. Nem bem havia entrado no prédio escuro de três andares, e da garagem deu para ouvir uma voz estridente bradando termos impublicáveis. Gritos que se intensificaram conforme eu ia vencendo os lances de escada. Lá em cima, a surpresa. Um velho conhecido, já com seus 50 e poucos anos, brigava incansavelmente com uma de suas paixões, o Tricolor da Vila. Era dia de transmissão ao vivo pela televisão e o restante da casa resolveu sair para não ver o pobre sofrer.
Intrigado com as reações, fiquei por ali mais um pouco. Nem lembro qual era o adversário, só recordo que o Paraná perdeu, acabando com qualquer possibilidade de retornar à Primeira Divisão. "Só faz isso e ainda faz errado", foi uma das últimas frases que ouvi, depois de uma tentativa frustrada de Rodrigo Pimpão empatar a partida.
Após mais uma decepção, o velho paranista calçou o chinelo de pano azul-marinho com o símbolo do time e se trancou no quarto. Não queria conversa. Eu fui embora de mansinho.
Reencontrei-o recentemente, meio que por acaso. Tomei coragem e puxei conversa. O assunto, é claro, futebol. O Tricolor mais precisamente. O senhor estava, outra vez, pra lá de decepcionado. Não acreditava no que estava acontecendo com o time, lanterna do Campeonato Paranaense. "Todo ano é a mesma coisa. Contratam um punhado de jogadores que vão embora em maio, aí temos de remontar a equipe para o Brasileiro. Como vamos subir assim, sem um mínimo de planejamento?", abriu ele, que ainda recorda com detalhes de todas as vezes que viu o Paraná ser campeão na gloriosa década de 90. A mais emocionante, diz, em 1991, ano do primeiro troféu assistiu ao Paratiba decisivo ao lado dos dois filhos mais velhos, ainda pequenos, no segundo anel do Couto Pereira.
"Por que não renovaram o contrato do Kelvin antes de colocá-lo em campo? Por que não fazem com que as sedes sociais nos deem um mínimo de lucro ao invés de prejuízo? Cadê o profissional do mercado que o presidente Aquilino disse que contrataria? E o presente de Natal, qual é?", cravou, emendando uma pergunta atrás da outra e se mostrando atualizado com o noticiário do dia a dia.
Como não tinha nenhuma mísera resposta na ponta da língua, só balancei a cabeça, concordando com todas as interrogações. Antes de partir, ele ainda me puxou de lado. "Não vou mais à Vila e parei até de assistir pela tevê. Não quero mais sofrer. Só espero, sinceramente, que alguém salve o Paraná", pediu, como quem faz uma prece, encerrando o discurso. Quem seria o salvador? Ele não sabe. Torce para que seja Aquilino Romani.
Em dia de jogo do Tricolor, para não se entregar à tentação, o senhor, com o coração partido, se refugia em uma chácara na região de Mandirituba, próximo a Curitiba, esperando o salvador aparecer.
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