Houve um tempo em que se acreditava que uma charge derrubaria um governo. Pelo menos a trupe do extinto Pasquim acreditava, e estendeu a crença até há pouco tempo, com a revista "Bundas" e depois com o "Pasquim 21", ambos também fora de circulação.
Tudo sob o comando do menino maluquinho Ziraldo, o cartunista mais politizado e engajado do país: se uma charge publicada em seus periódicos derrubasse o poder, ele seria, muito provavelmente, empossado como o novo chefe de estado, e fundaria, enfim, um país sério.
Mas isso, infelizmente, não aconteceu. Ziraldo continua atrás da prancheta, governando um Brasil imaginário, bem melhor do que este que temos.
José Saramago, em entrevista a uma das edições de "Bundas", foi perguntado por Ziraldo se uma charge teria força para botar um governo na lona. Saramago, que talvez tenha levado muito a sério a questão, respondeu mais ou menos isso (vamos lá, Tico e Teco): "Não, de jeito nenhum. O poder absorve o humor, se faz valer dele para se legitimar ainda mais, torná-lo até simpático. O humor é aliado do poder". Ziraldo desconversou, claro.
Já o Millôr acha que o humorista, como ele, é apenas o bobo da corte, dissimulando com seus gracejos e piadas de salão (nesse caso de Palácio) para que o rei acredite que não está nu, ou, quando muito, vestindo uma bela sunga. Se o soberano se sentir pelado com as piadas, guilhotina para o palhaço!
Mas onde é mesmo que quero chegar? Ah, sim. Na colossal pândega que as charges satirizando Maomé provocaram no Islã, escancarando o abismo cultural entre o ocidente e o mundo islâmico, criando um Salão Internacional de quem é menos ou mais engraçado.
Deus e o diabo sempre foram alvos desses chatos da tinta nanquim. Por que Maomé não seria? O desenho do profeta islâmico com turbante imitando uma bomba não foi tão engraçado quanto aquele em que homens-bomba, chegando no céu, são recepcionados por Maomé, que diz: "Parem, parem, não temos mais virgens", em alusão à promessa de imaculadas aos que se explodirem pelo causa.
Bem, o fato é que os cartunistas que participaram daquela dúzia de charges estão com as cabeças a prêmio, trocadas por uma dúzia de esfirras. Os discípulos de Maomé não gostaram das piadas, ou não entenderam, com ameaças de explodir o mundo ocidental. Que o mau humor deles não chegue até aqui entre nós, risonhos e bem sucedidos sul-americanos pobres, mas ocidentais.
E eu aqui, lamentando quando sou incompreendido em algumas charges de Los 3 Inimigos, provocando uma ou outra ira, que não saem dos limites da paróquia.
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