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Kim Jong-hun, técnico norte-coreano, líder da antipatia | Stephane Mahe/ AFP
Kim Jong-hun, técnico norte-coreano, líder da antipatia| Foto: Stephane Mahe/ AFP

Treino

Equipe norte-coreana dissemina o pânico no país da Copa

A Coreia do Norte levou o estresse também para Tembisa, comunidade pobre vizinha a Johannesburgo, onde o time fez seu segundo treinamento no país da Copa. A atividade aconteceu no Estádio Makhulong, com portões fechados. A imprensa presente no local, formada exclusivamente por brasileiros, teve o trabalho dificultado ao máximo.

As ameaças de prisão se repetiram por mais de uma hora, mas não passaram disso. Um policial chegou a desconfiar que os jornalistas brasileiros fossem sul-coreanos infiltrados no local para fazem algum mal ao país vizinho, com quem sustentam uma inimizade que parece longe de cessar. Ele olhou as credenciais dos repórteres e pediu para ver os passaportes. As ameaças foram mantidas. O chefe do policiamento avisou que prenderia os repórteres se eles fizessem fotos, mesmo fora do estádio. Não queria saber de registros de imagens sequer do ônibus chegando ao local, na rua, em um espaço público.

Opinião

Fui expulso, perseguido e ameaçado

Carlos Eduardo Vicelli, repórter

É verdade que não tenho muito tempo de jornalismo, mas nunca havia passado por situação como a de ontem. Ser praticamente expulso, perseguido e ameaçado por policiais fortemente armados só por causa de um pedido de entrevista é estarrecedor. Fiquei assustado, não nego.

E triste por imaginar o constrangimento pelo qual passam os norte-coreanos diariamente. Se eu, jornalista brasileiro que queria apenas colher informações sobre o primeiro adversário do meu país na Copa do Mundo saí corrido, o que deve acontecer com quem ousa desrespeitar as ordens do ditador Kim Jong-il? O jeito é se conformar com a vida, aceitando as privações, ficando cada vez mais isolado do restante do planeta.

É de se questionar: o que uma nação que não vê e não quer ser vista vem fazer em uma competição global como a Copa? A resposta quem tem é Kim Jong-il. Mas eu, sinceramente, não me atrevo a perguntar. Pelo menos não hoje. É melhor deixar os truculentos policiais esquecerem meu rosto. Depois, quem sabe... Afinal, pauta é pauta.

  • Policial sul-africano, com arma na mão, aborda todos que tentam se aproximar do hotel escolhido pelos norte-coreanos: ninguém chega perto!

O futebol é apenas mais um item no mundo fechado em que a co­­munista Coreia do Norte escolheu para viver. A seleção do país, primeira adversária do Brasil na Copa (15/6), se isolou na pequena Mi­­drand, cidade vizinha a Johannes­­burgo, no caminho para Pretória.

Assim como nenhum cidadão norte-coreano tem a permissão do governo para deixar o país, quem ousar se aproximar do im­­ponente hotel em que o time do ditador Kim Jong-il está concentrado é "convidado" a se retirar por policiais impacientes, todos com poderosas armas em punho.

Foi o que aconteceu ontem com a reportagem da Gazeta do Po­­vo. Não deu nem tempo de pedir para um dos porteiros da rede de hotéis Pro­­tea localizar alguém que pu­­desse dar informações sobre os orientais. Já em seguida, 3 dos 20 seguranças sul-africanos responsáveis pelo isolamento total cercaram o carro do jornal. Armados com escopetas, foram curtos e grossos: "Não sabemos de nada. Agora peço que se retirem imediatamente", disse um deles, acabando com qualquer possibilidade de diálogo.

A pressão não terminou aí. O grupo "escoltou" a reportagem até a saída da cidade. Antes, porém, pro­­videnciou outra blitz, trancando a passagem com uma moderna caminhonete branca, da marca Mazda. Batida que durou cerca de 20 minutos – tempo necessário para a delegação norte-coreana se movimentar dentro do hotel. "Vo­­cês não vivem aqui, não sabem de nada. É melhor se preocupar com o time de vocês, o Brasil. Os dois países vão se enfrentar e eles (orien­­tais) não querem que saibam de nada", decretou outro po­­licial, antes de encerrar a ameaça: "Precisam pensar nas suas mulheres".

O episódio ilustra o clima de guerra em que se transformou os arredores do quartel-general dos súditos de Kim Jong-il. Na­­­cio­­­­nalistas ao extremo, os jogadores apenas obedecem às or­­dens do ditador. Mesmo que isso signifique morrer no amador futebol local – apenas 3 dos 23 convocados atuam no exterior. Ou entrar na concentração um dia antes do previsto, driblando inclusive a Fifa.

Na terça-feira, cada atleta chegou ao hotel com uma pequena bandeira do país nas mãos, saudados pelas recepcionistas com o fa­­moso " Rap das Armas", tema do fil­­me Tropa de Elite, sucesso na terra da Copa.

O único a quebrar o metódico e sisudo protocolo foi o atacante Jong Tae-Se, de 26 anos, principal nome da Coreia do Norte. Ape­­li­­dado de Rooney oriental por causa dos gols em profusão, o jogador do Kawasaki Frontale (Japão) aceitou conversar com a imprensa. "Eu quero mudar isso. Eles não gostam de falar porque a mídia transmite para muitas pessoas uma imagem má da Coreia. Fa­­lam que é fechado, que tem bomba. São informações ruins. Eles têm medo do que vão falar de nós", ressaltou ele, ao site globoes­­porte.com.

Distância que só deve voltar a se encurtar no domingo, quando os orientais enfrentam a Nigéria em partida amistosa. Será a chance de Dunga saber um pouco mais do enclausurado rival. E de os 1.000 chineses importados por Kim Jong-il para torcerem a favor do país na Copa ensaiarem as coreografias, já que, na Coreia, nem pela televisão os nativos poderão acompanhar o desempenho do time. Ordem do governo. Quem desobedecer...

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