Treino
Equipe norte-coreana dissemina o pânico no país da Copa
A Coreia do Norte levou o estresse também para Tembisa, comunidade pobre vizinha a Johannesburgo, onde o time fez seu segundo treinamento no país da Copa. A atividade aconteceu no Estádio Makhulong, com portões fechados. A imprensa presente no local, formada exclusivamente por brasileiros, teve o trabalho dificultado ao máximo.
As ameaças de prisão se repetiram por mais de uma hora, mas não passaram disso. Um policial chegou a desconfiar que os jornalistas brasileiros fossem sul-coreanos infiltrados no local para fazem algum mal ao país vizinho, com quem sustentam uma inimizade que parece longe de cessar. Ele olhou as credenciais dos repórteres e pediu para ver os passaportes. As ameaças foram mantidas. O chefe do policiamento avisou que prenderia os repórteres se eles fizessem fotos, mesmo fora do estádio. Não queria saber de registros de imagens sequer do ônibus chegando ao local, na rua, em um espaço público.
Opinião
Fui expulso, perseguido e ameaçado
Carlos Eduardo Vicelli, repórter
É verdade que não tenho muito tempo de jornalismo, mas nunca havia passado por situação como a de ontem. Ser praticamente expulso, perseguido e ameaçado por policiais fortemente armados só por causa de um pedido de entrevista é estarrecedor. Fiquei assustado, não nego.
E triste por imaginar o constrangimento pelo qual passam os norte-coreanos diariamente. Se eu, jornalista brasileiro que queria apenas colher informações sobre o primeiro adversário do meu país na Copa do Mundo saí corrido, o que deve acontecer com quem ousa desrespeitar as ordens do ditador Kim Jong-il? O jeito é se conformar com a vida, aceitando as privações, ficando cada vez mais isolado do restante do planeta.
É de se questionar: o que uma nação que não vê e não quer ser vista vem fazer em uma competição global como a Copa? A resposta quem tem é Kim Jong-il. Mas eu, sinceramente, não me atrevo a perguntar. Pelo menos não hoje. É melhor deixar os truculentos policiais esquecerem meu rosto. Depois, quem sabe... Afinal, pauta é pauta.
O futebol é apenas mais um item no mundo fechado em que a comunista Coreia do Norte escolheu para viver. A seleção do país, primeira adversária do Brasil na Copa (15/6), se isolou na pequena Midrand, cidade vizinha a Johannesburgo, no caminho para Pretória.
Assim como nenhum cidadão norte-coreano tem a permissão do governo para deixar o país, quem ousar se aproximar do imponente hotel em que o time do ditador Kim Jong-il está concentrado é "convidado" a se retirar por policiais impacientes, todos com poderosas armas em punho.
Foi o que aconteceu ontem com a reportagem da Gazeta do Povo. Não deu nem tempo de pedir para um dos porteiros da rede de hotéis Protea localizar alguém que pudesse dar informações sobre os orientais. Já em seguida, 3 dos 20 seguranças sul-africanos responsáveis pelo isolamento total cercaram o carro do jornal. Armados com escopetas, foram curtos e grossos: "Não sabemos de nada. Agora peço que se retirem imediatamente", disse um deles, acabando com qualquer possibilidade de diálogo.
A pressão não terminou aí. O grupo "escoltou" a reportagem até a saída da cidade. Antes, porém, providenciou outra blitz, trancando a passagem com uma moderna caminhonete branca, da marca Mazda. Batida que durou cerca de 20 minutos tempo necessário para a delegação norte-coreana se movimentar dentro do hotel. "Vocês não vivem aqui, não sabem de nada. É melhor se preocupar com o time de vocês, o Brasil. Os dois países vão se enfrentar e eles (orientais) não querem que saibam de nada", decretou outro policial, antes de encerrar a ameaça: "Precisam pensar nas suas mulheres".
O episódio ilustra o clima de guerra em que se transformou os arredores do quartel-general dos súditos de Kim Jong-il. Nacionalistas ao extremo, os jogadores apenas obedecem às ordens do ditador. Mesmo que isso signifique morrer no amador futebol local apenas 3 dos 23 convocados atuam no exterior. Ou entrar na concentração um dia antes do previsto, driblando inclusive a Fifa.
Na terça-feira, cada atleta chegou ao hotel com uma pequena bandeira do país nas mãos, saudados pelas recepcionistas com o famoso " Rap das Armas", tema do filme Tropa de Elite, sucesso na terra da Copa.
O único a quebrar o metódico e sisudo protocolo foi o atacante Jong Tae-Se, de 26 anos, principal nome da Coreia do Norte. Apelidado de Rooney oriental por causa dos gols em profusão, o jogador do Kawasaki Frontale (Japão) aceitou conversar com a imprensa. "Eu quero mudar isso. Eles não gostam de falar porque a mídia transmite para muitas pessoas uma imagem má da Coreia. Falam que é fechado, que tem bomba. São informações ruins. Eles têm medo do que vão falar de nós", ressaltou ele, ao site globoesporte.com.
Distância que só deve voltar a se encurtar no domingo, quando os orientais enfrentam a Nigéria em partida amistosa. Será a chance de Dunga saber um pouco mais do enclausurado rival. E de os 1.000 chineses importados por Kim Jong-il para torcerem a favor do país na Copa ensaiarem as coreografias, já que, na Coreia, nem pela televisão os nativos poderão acompanhar o desempenho do time. Ordem do governo. Quem desobedecer...
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