Não é de se estranhar se o Nelson Mandela Bay, hoje, em Port Elizabeth, estiver tomado pela cor laranja. Seria mais uma expressão da força holandesa na África do Sul. O país de Sneijder e Robben teve papel de destaque na colonização do povoado ao sul do continente africano.
Os europeus chegaram em 1652, com a criação de um posto avançado na Cidade do Cabo, ponto estratégico a caminho da Indonésia. Espalharam-se e também participaram da criação de Port Elizabeth. A fundação da Companhia Holandesa das Índias Orientais marcaria o início de uma relação conflituosa, avant-première da guerra racial que separou brancos e negros por mais de três séculos.
O conflito principal ocorreu entre 1899 e 1902 e ficou conhecido como Guerra Anglo-Bôer. Em Port Elizabeth, há monumentos sobre o embate. O principal é o Memorial do Cavalo, que homenageia animais "sacrificados" na batalha entre holandeses e ingleses.
Após os conflitos, os desbravadores se organizaram para explorar o campo. Viraram "bôeres" (agricultores). E passaram a usar o trabalho escravo dos nativos em suas plantações. Criaram o africâner, idioma próprio para se diferenciar dos empregados, derivado de holandês com influência do inglês, malaio e de expressões indígenas, que virou uma das 11 línguas oficiais da África do Sul. A segregação ganhava corpo.
A prosperidade despertou atenção dos britânicos. Paralelamente à intolerância, os bôeres se obrigaram a aprender a guerrear para manter o território. Perderam, sendo obrigados a migrar para o interior em 1795. Fundaram dois novos povoados, o Estado Livre de Orange e o Transvaal.
A disputa por terras ensinou também aos bôeres a defenderem seus ideais. Preconceito, segregação, ambição e intolerância: estava pronta a fórmula do apartheid, mancha que até hoje, quase 20 anos após o fim da política de segregação racial, atrapalha o país.
Eugène Terrablanche ganhou a alcunha de "martir bôer" por insistir em não dar a mão aos negros, mesmo após o fim do apartheid. Criou um partido, o Movimento de Resistência Africâner (AWB), com "soldados" caracterizados pelo uniforme caqui. Organizou comícios e barricadas. Lutou o quanto pôde. Até sucumbir ao jogo de cintura de Nelson Mandela. E a dois funcionários negros de sua fazenda, em Ventersdorp, a Oeste de Johannesbugo. Em abril, revoltados com os constantes atrasos de salários, os empregados assassinaram a pauladas o patrão.
"Não gostamos de falar do que está no passado. Demos um passo à frente. Eu tinha 12 anos quando Mandela saiu da cadeia. talvez os velhos tenham mais lembranças. Eu nem gosto de falar disso", comenta o professor de Educação Física Rheniw Botha, 32 anos, que mora em Johannesburgo e foi ver in loco Brasil e Holanda.
A tensão ainda reina no país. "Dizem que este é o pior bairro de todos. Mas agora tem este campo. Os jovens podem se reunir e com isso a integração será mais fácil. Esse é o quarto campo financiado pela seleção", discursou, no último dia 12, Johan Cruyff, principal nome do futebol holandês, na inauguração do Campo Orange Cruyff, no bairro de Hillbrow, em Johannesburgo custo de 100 mil euros bancado pela Federação Holandesa de Futebol. É o ajuste de contas com o passado.
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