Faltando pouco menos de seis meses para o início da Copa do Mundo, o Brasil corre para deixar o país pronto para receber os milhares de turistas estrangeiros que são esperados durante os 30 dias do evento. Metade das arenas que irão receber os jogos ainda não está pronta, o que preocupa governantes e membros da Fifa. Porém, os problemas que devem envolver o torneio vão além dos campos de futebol, e alguns deles são fontes de preocupação para muitas entidades nacionais. Afinal, como será o deslocamento dessa massa de pessoas que irá ocupar o Brasil a partir do dia 12 de junho, e muitos de nossos aeroportos não terminaram de se adequar para o volume esperado de viajantes? Nossos sistemas de transporte urbano darão conta dessa demanda? E nossos hotéis, terão capacidade e gente preparada para atender os turistas? Além disso, há quem leve em conta a questão da segurança durante a Copa. Existem promessas de que as manifestações vistas em junho se repitam durante os jogos, com mais força e maior volume de pessoas. Com a volta do debate sobre a briga de torcidas, o medo de confrontos durante as partidas ganha força dentro das perspectivas do que pode ocorrer durante o torneio.
Pensando nisso, a Gazeta do Povo elencou sete riscos que o Brasil correrá durante a Copa do Mundo, o que esperar deles, e qual seriam as soluções ideais para contorná-los.
Hotelaria
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em abril deste ano, já havia publicado um estudo alertando que a quantidade de hotéis de qualidade disponíveis no país não seria suficiente para abrigar todos os visitantes. Além disso, falta mão de obra capacitada para atender esse público. Oito meses depois, pouco foi feito para melhorar esse cenário. Segundo Luiz Alberto dos Santos, presidente do Sindicato dos Trabalhadores no Comércio Hoteleiro, Meio de Hospedagem e Gastronomia de Curitiba e Região (Sindehotéis), os programas de capacitação que haviam sido prometidos pelo governo e por outros órgãos nacionais não saíram do papel. "Essa história de que iam qualificar todos do setor não deu certo. Houve iniciativas, mas não foi o suficiente", disse. Santos ressaltou que outro problema são os altos valores das diárias que serão cobradas. "É abusivo. Há hotéis que, em dias normais cobram R$ 100, e durante a Copa terão diárias de R$ 2.000", afirmou Santos. Algumas redes já foram notificadas pela Justiça por superfaturar as tarifas.
Comércio
Há uma parcela grande de empresários e comerciantes que vê com receio a capacidade do mercado. Fabrizio Quirino, gestor de comunicação e marketing da Associação Comercial Empresarial do Brasil (Aceb), afirma que a falta de conhecimento do perfil de consumo dos turistas é o principal argumento contra novos investimentos do setor comercial, o que pesará negativamente na oferta de determinados produtos. "A preparação para a Copa está sendo feita pensando em atender de maneira devida essa demanda nacional e internacional. Porém, temos dois problemas a enfrentar: a falta de infraestrutura comercial e a concorrência, que será forte, o que deixa todos com o pé atrás", destaca o gerente.
Outra dificuldade que o comércio deve enfrentar também será a falta de profissionais capacitados para isso. A Associação Comercial do Paraná (ACP), no fim de 2012, anunciava projetos de capacitação dos profissionais do varejo, para garantir um atendimento de qualidade aos estrangeiros. Porém, a entidade hoje diz que não vislumbra ainda a Copa, e que projetos para o Mundial ainda serão elaborados.
Aeroportos
Desde 2011, 13 aeroportos do Brasil estão em processo de reestruturação, com o objetivo de modernizar o sistema de transporte aéreo e evitar o "caos aéreo", tão comum em finais de ano e feriados no país, durante a Copa, quando são esperados 600 mil turistas estrangeiros, segundo a Embratur. Pelo menos 11 aeroportos não concluirão seus projetos até 12 de junho. Entre eles está o Aeroporto Afonso Pena, que de acordo com Márcia de Andrade Pereira, doutora em engenharia de trânsito e professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR), possui um bom fluxo para situações normais, mas não para grandes eventos. "Se compararmos com grandes aeroportos internacionais, estamos bem aquém. Precisamos modernizar o atendimento, diminuir o número de pessoas no processo e tornar tudo mais automático. Além disso, temos de incorporar no planejamento esse aumento de demanda, que todo Natal e ano-novo vemos causando dor de cabeça", explica ela, que diz que neste fim de ano teremos uma prévia do que será visto na Copa do Mundo.
Brigas
O conflito entre torcedores em Joinville, que marcou o final do Brasileiro no início do mês, reacendeu as discussões sobre os riscos da violência dentro dos estádios. Faltando um semestre para a abertura da Copa, o debate ganha novas proporções, já que a possibilidade de qualquer tipo de ocorrência durante os jogos do Mundial entra na lista de considerações do poder público.
O delegado da Delegacia Móvel de Atendimento ao Futebol e Eventos da Polícia Civil do Paraná, Clóvis Galvão, ressalta que a preparação para conter esse tipo de situação já está sendo feita, em todas as esferas de segurança pública.
"Essa preocupação de ocorrer confrontos está dentro do planejamento do Exército, da Polícia Federal, e das polícias civil e militar. Onde tiver movimentação de Copa estarão todas essas forças. Estão sendo feitos exercícios de possíveis problemas que podem acontecer. Tudo para estar preparado para todas as situações", ressaltou o delegado.
Transporte Urbano
Tidas como maior legado da Copa do Mundo, as melhorias nos sistemas de transporte urbano, usado por 84% da população do país, receberam um alto investimento do Governo Federal, via PAC da Copa, para garantir um salto na qualidade dos sistemas das cidades-sede.
Ao todo, R$ 12 bilhões seriam injetados na reestruturação dos equipamentos de transporte, a fim de garantir fluidez no trânsito das capitais durante os jogos e facilidade de acesso aos turistas que vêm ao Brasil. Porém, não foi isso que aconteceu. Segundo Otávio Cunha, presidente da Associação Nacional das Empresas de Transporte Urbano (NTU), desde o anúncio do pacote, há cinco anos, até hoje, uma parte pouco significativa desse montante foi de fato aplicada. "Para se habilitar aos recursos, era necessário projetos que estivessem dentro das exigências que o Ministério das Cidades fez, o que dificultou muito as coisas", destacou. "Vamos ficar devendo e muito aos turistas no quesito transporte. Os municípios são a favor de transformar em feriados os dias de jogo, para ajudar no tráfego, porém isso não será o suficiente. Teremos muitos gargalos ainda". Uma solução paliativa, que teria um efeito "imediato", seria a adoção, nas cidades em que fosse possível, do uso de faixas exclusivas para ônibus, como as que têm sido implementadas em São Paulo.
Protestos
A Copa das Confederações, em junho, ocorreu em meio à onda de protestos populares. Milhões de pessoas foram às ruas questionar os imensos gastos feitos pelo governo com a Copa, pedindo mais recursos para saúde e educação. Contudo, durante os atos pacíficos, cenas de violência e depredação das cidades também foram vistas, o que fez os representantes da Fifa hesitarem na continuidade do projeto 2014.
Para o Mundial do ano que vem, há quem acredite que novos levantes serão armados. "As atenções internacionais estarão todas voltadas para cá. A grande questão que irá determinar se haverá ou não novas manifestações nas ruas será o tamanho da disposição das pessoas naquele momento", indica Marco Antônio Villa, historiador e professor da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar).
Um motivo que deve diminuir o número de protestos durante a Copa foram os atos de violência vistos em junho, que segundo Villa, tiraram o ânimo de muitos envolvidos. "Esses black blocks afastaram muita gente das ruas. E com certeza eles estarão com receio de que novamente um protesto se torne algo violento".
Além disso, o fato de 2014 ser um ano de eleição para presidente deve contribuir para um contenção maior por parte do poder público. "Não duvido que o governo mobilize suas forças para controlar essas manifestações e diminuir suas aparições na mídia, porque eles não querem propaganda negativa às vésperas da eleição", completa o professor.
Turismo sexual
Estudos do Centro de Excelência em Turismo da Universidade de Brasília (UnB) indicam que em alguns países por onde o Mundial passou o número de casos de abuso sexual, principalmente de menores, cresceu significativamente.
De acordo com Iara Brasileiro, professora coordenadora do Centro, o motivo desse aumento se deve a exposição das pessoas durante o torneio. "Na Copa do Mundo, existem pessoas do mundo inteiro no país. E os moradores desse país ficam expostos, têm contato com todo tipo de gente. Infelizmente, por causa dessa exposição, principalmente as crianças e adolescentes, acabam sendo vítimas de violência sexual. E isso é uma coisa que poucas pessoas prestam atenção", indicou a professora.
A coordenadora do CET defende que o governo, junto com órgãos particulares, desenvolvam campanhas de conscientização, principalmente nesses próximos seis meses, de forma mais intensa, para alertar para esse tipo de risco e evitar aumento no número de casos de exploração.
"Fazemos esse tipo de campanha em eventos como o carnaval, e dá certo. Vemos que o número de denúncias aumenta, e a denúncia é a melhor arma para impedir que os abusos aconteçam. Se fizermos isso na Copa, com certeza teremos bons resultados", completou.
Bolsonaro e mais 36 indiciados por suposto golpe de Estado: quais são os próximos passos do caso
Bolsonaro e aliados criticam indiciamento pela PF; esquerda pede punição por “ataques à democracia”
A gestão pública, um pouco menos engessada
Projeto petista para criminalizar “fake news” é similar à Lei de Imprensa da ditadura