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João Maria Barbosa, 90 anos, ex-funcionário da Rede Ferroviária: nada supera a dor do Maracanazo de 1950 | André Rodrigues/ Gazeta do Povo
João Maria Barbosa, 90 anos, ex-funcionário da Rede Ferroviária: nada supera a dor do Maracanazo de 1950| Foto: André Rodrigues/ Gazeta do Povo

Psicologia

Frustração e trauma da eliminação têm tempo de validade

Apesar do impacto de cinco gols sofridos antes dos 30 minutos de partida e da eliminação da Copa do Mundo com um vexatório 7 a 1, a derrota para a Alemanha no último dia 8 dificilmente vai se tornar um momento traumático para a geração de crianças de 2014. Esse é o sentimento de pais e especialistas.

"Acho que foi uma tristeza momentânea. O Gabriel adora o Messi, adora o Neymar, Ele dizia que queria que o Brasil jogasse contra o Messi. Acho que só ficou desapontado. Nós, da família, montamos uma operação-tarefa para explicar que em um jogo, se ganha e se perde. Ele não entendeu muito bem. Depois assistiu ao jogo do Brasil com a Holanda [outra derrota, desta vez por 3 a 0] e tudo mais", conta a mãe do garoto de 5 anos, Carolina Balaroti.

A psicóloga Angela Zanardini destaca que a comoção que houve em torno da derrota na semifinal é resultado de uma frustração coletiva. "Houve muita projeção, muito desejo dos brasileiros em cima da Copa, como se a vitória no Mundial fosse sanar todos os outros problemas e dificuldades que o país está passando. E isso reverbera nas crianças, bombardeadas por uma série de estímulos, desde ganhar a camisa da seleção", fala.

A maior preocupação, aponta a psicóloga, é atentar para o comportamento das crianças e adolescentes em relação ao valor dado à pátria. "Isso não é mensurável de imediato, mas, quando se vincula tão fortemente a ideia de patriotismo à seleção e, de uma hora para outra, o jovem passa a ouvir somente comentários negativos sobre essa seleção, ele pode desvalorizar sua ideia de país", diz.

  • Gabriel Balaroti, de 5 anos, com a mãe Carolina: menino chorou muito após a histórica goleada da Alemanha sobre o Brasil

Gabriel agora espera ansioso pela chegada, via correio, das últimas duas figurinhas que vão completar seu primeiro álbum de uma Copa do Mundo. Também já pediu para a mãe colocá-lo na escolinha de futebol. Mas há 12 dias, quando o Brasil sofreu a goleada histórica por 7 a 1 da Alemanha e foi eliminado do Mundial, o garoto de 5 anos sofreu com o esporte pelo qual começava a se interessar.

"Quando saiu o terceiro gol [aos 23 minutos], ele desatou no choro. Falei para ele ir ver filme, mas ele quis ficar até o final, disse que o Brasil ia virar o jogo. O Gabriel ficou muito desapontado e eu, de coração partido", conta a mãe do menino, a publicitária Carolina Pires Fossati Balaroti, 32 anos.

"Fale para as crianças terem paciência. Uma tristeza dessas é coisa que acontece. Elas vão ainda ter muitas alegrias e a vida não é só futebol, não. É a primeira Copa do Mundo no Brasil delas, claro que vão chorar. Mas vai passar", consola o aposentado Antônio Dantas, 83 anos. Ele também já derramou lágrimas numa derrota crucial da seleção em um Mundial no Brasil. Ele estava no Maracanã na final de 1950, quando o Uruguai acabou com o sonho do primeiro título brasileiro ao virar a partida para 2 a 1 – um empate já bastava para os anfitriões erguerem a taça.

"Eu tinha 18 anos. Todo mundo saiu de cabeça baixa, chorando. Eu era garoto, chorei, claro. Desta vez, contra a Alemanha, foi merecido. Não temos mais craques... Talvez o Neymar seja um pouquinho...", emendou.

O silêncio e fim de festa causados pelo Maracanazo foram vividos também por Paulo Osni Wendt em Curitiba. Um fim de festa foi literal: naquele 16 de julho, Paulo comemorava seus 10 anos. "Meus pais tinham preparado tudo para o aniversário, convidado os amigos e era também para ser a festa do país. Estávamos ouvindo a partida em dois rádios, eu, brincando nos fundos da casa e, quando vi, a casa esvaziada e que o Brasil, tinha perdido, fiquei muito triste", lembra, hoje, aos 74 anos. "Mas depois, aos 18, tive a felicidade de comemorar o primeiro título do Brasil. Então essa gurizada tem de se conscientizar que não se pode ganhar tudo e nenhuma derrota dura para sempre."

Ex-funcionário da Rede Ferroviária e ex-atacante do extinto Ferroviário, um dos embriões do Paraná Clube, João Maria Barbosa, 90 anos, assistiu aos jogos da Copa de 50 em Curitiba. A final, ouviu pelo rádio, no alto dos seus 26 anos. Agora, acompanhou a goleada de 2014 pela tevê. E acha que a primeira foi muito mais dolorida.

"Era uma final, valia o título. Semanas depois do jogo, é verdade, ninguém mais se lembrou de sentir tristeza, virou coisa de a imprensa manter o cadáver de 1950 insepulto. Desta vez, espero que se possamos aprender com os erros", avalia. Barbosa diz que entende as crianças terem se impressionado com os sete gols sofridos pelo time de Felipão, mas que não será um jogo que vai desmotivá-las.

"O meu neto João, de 4 anos, me deu a cena desta Copa. Quando estava 5 a 0, ele fez as contas nos dedinhos e perguntou se caso o Brasil fizesse seis, ainda ganhava. Ficou chateado com a derrota, mas não vai ser um trauma para ele. Ele curtiu a Copa, decorou nome de jogadores, das seleções, fez o álbum de figurinhas. Estou impressionado com o envolvimento da criançada nesta Copa", conta o jornalista Geneton Moraes Neto, autor do livro Dossiê 50, em que entrevistou os 11 jogadores do time de 1950.

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